Empresas fecham cerco a Rússia; analistas já veem impactos em oferta de commodities e na logística

Oferta de alumínio é acompanhada com atenção dada a grande dependência da Rússia, assim como pelotas; gargalos logísticos também são monitorados

Lara Rizério

Moeda de 1 rublo russo em frente a símbolos da Rússia (foto: Getty Images)

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Em meio à escalada da invasão da Ucrânia pela Rússia, dois grandes produtores de commodities e que abastecem o mercado mundial, os preços já estão sendo bastante impactados, enquanto aparecem os primeiros efeitos sobre a oferta global de alguns desses materiais.

Matt Hope, analista global de commodities do Credit Suisse, destacou que, embora sanções às commodities russas tenham sido evitadas – uma vez que isso seria destrutivo para a economia ocidental -, houve uma surpresa com os movimentos agressivos das empresas para evitar qualquer ligação com a Rússia.

O Bradesco BBI também destacou que, mesmo em casos que não houve uma sanção direta aos produtos, algumas companhias deixaram de negociar com empresas russas. Já o JPMorgan ressaltou a dificuldade dos petroleiros do país em negociarem no mercado internacional, levando a commodity vinda da Rússia ao “ostracismo” e podendo levar a um cenário extremo de brent a US$ 185 o barril ao final do ano.

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No geral, o Credit atualizou as suas estimativas para os metais básicos em um cenário de menor demanda. Para o banco, os preços da energia devem permanecer altos, com os países buscando redução da dependência russa. Este fator, combinado com o aumento da taxa de juros e a desaceleração da demanda de bens de consumo com o fim dos lockdowns em meio à desaceleração da pandemia do coronavírus, faz com que os analistas esperem que a demanda e a produção industrial global diminuam. Os impactos para as diferentes commodities são também diversos.

A oferta de alumínio continuará mais apertada, uma vez que o fornecimento da produtora líder Rusal é critico. Enquanto isso, os analistas do banco continuam esperando que o níquel se mantenha com boa oferta e o cobre continuará no caminho de ter excedentes. Já o minério de ferro deve ter um mercado “mais apertado”, mesmo com demanda mais fraca, devido à perda de produção de pelotas (pequenas bolinhas de minério usadas na fabricação do aço) produzidas na Ucrânia.

Os problemas de oferta podem se estender por mais tempo, conforme apontou em evento na última sexta-feira (4) Anatole Kaletsky, sócio-fundador e economista-chefe da Gavekal Research. Ele vê como cenário mais provável para a guerra da Ucrânia que a situação atual perdure por mais três ou seis meses.

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A probabilidade de mais sanções à Rússia estão altas, incluindo em petróleo e energia, avalia Kaletsky. No curto prazo, ele avalia que esse tipo de sanção afetaria mais o Ocidente do que Moscou, por conta da elevação dos preços que se seguiria, o que pressionaria ainda mais a inflação mundial. “A Europa certamente precisa do gás natural da Rússia.”

Confira abaixo quais são os impactos que estão sendo sentidos:

Alumínio: Preços e prêmios em alta. Os preços do alumínio continuaram registrando altas recordes em meio ao início do
guerra Rússia-Ucrânia, abrindo caminho para US$ 4 mil a tonelada, ressalta o Bradesco BBI. As sanções anunciadas até agora não afetam o alumínio russo exportado diretamente – na verdade, os EUA sinalizaram que estão adiando as restrições específicas sobre o tema.

No entanto, não são necessárias sanções para que os suprimentos sejam impactados no curto prazo. Muitas empresas já começaram a anunciar suspensões das relações comerciais com a Rússia, incluindo grandes companhias de navegação como Maersk, que lida com alguns embarques para a Rusal, segundo aponta a Bloomberg. A norueguesa Norsk Hydro também decidiu não entrar em novos contratos ligados a entidades russas. A americana Alcoa anunciou que não adquiriria matérias-primas da Rússia.

“Nós notamos que a Rusal já interrompeu uma refinaria de alumina de 1,7 milhão de toneladas por ano na Ucrânia (até agora não há relatos de interrupção na produção de alumínio da Rusal nas fundições, mas é muito provável que ocorram rupturas, em nossa opinião). Além disso, os preços elevados da energia em toda a Europa podem adiar ainda mais o reinício da capacidade”, ressalta o BBI.

Cobre: ​​Nenhum desenvolvimento relevante no lado da produção por enquanto (a Rússia responde por cerca de 4% do fornecimento de cobre global).

O banco observa, no entanto, que devido aos baixos estoques no momento, possíveis interrupções podem apertar o mercado e impulsionar os preços no curto prazo. A produção de cobre na Rússia está concentrada em três empresas: UMMC, Russian Copper e Norilsk Nickel, que por sua vez estão ligados aos oligarcas russos (UMMC: Iskander Makhudov; Russian Copper Corporation: Igor Altushkin e Nornickel: Vladimir Potanin), de acordo com a CRU.

Pelotas de minério de ferro: mercado ainda mais apertado à frente, destaca o BBI, pois a logística e a produção já foram impactadas. A Rússia responde por cerca de 10 milhões de toneladas e a Ucrânia por cerca de 15 milhões de toneladas do mercado marítimo (ambos os países representam 20% do mercado total e 30% do mercado de pelotas).

Leia mais: Vale (VALE3) aponta que haverá impacto no mercado de pelotas com a crise na Ucrânia

Os consequentes impactos na produção e sanções devem levar a uma menor oferta de pelotas de minério de ferro, especialmente para o Leste Europeu. Os prêmios poderia,  portanto, aumentar no curto prazo, à medida que os clientes correm para tentar garantir os volumes.

A Ucrânia não conseguiu embarcar qualquer minério de ferro desde que a invasão começou, com o principal porto de minério de ferro (chamado Yuzhny) bem como a infraestrutura ferroviária sendo interrompidas. O principal produtor regional (Ferrexpo) anunciou força maior, a ArcelorMittal interrompeu as operações de mineração subterrânea, enquanto a Metinvest (maior produtor nacional de minério de ferro) ainda está com a produção em andamento, mas a logística provavelmente será afetada, apontam os analistas do BBI.

Já o Credit Suisse ressalta que a sua previsão original para o preço do minério de ferro para 2022, elaborada em outubro de 2021, era de US$ 120 a tonelada no primeiro semestre e de US$ 100 a tonelada no segundo semestre. Mais recentemente, passaram a ver os números como baixos, especialmente para a segunda metade do ano, vendo a partir daí US$ 135 de média no segundo trimestre e a US$ 130 na segunda metade do ano, com o cenário de escassez de mão-de-obra impactando a oferta, enquanto continuam esperando que a produção de aço da China aumente.

“Não sabemos por quanto tempo as exportações de minério de ferro da Ucrânia serão cortadas – provavelmente depende de quanto tempo o conflito continuará. Mas, se durar ao longo do ano como modelamos, certamente suporta uma visão de um preço forte de ao menos US$ 130 a tonelada no segundo semestre, em nossa opinião”, avaliam os analistas.

Aço: O BBI destaca que já houve aumentos de preços de aços planos anunciados na Europa com o aumento das preocupações com a oferta. A siderúrgica russa Severstal anunciou que cessou os embarques para a União Europeia devido a sanções (ela exportou 5,3 milhões de toneladas de aço em 2021, dos quais cerca de 3 milhões de toneladas para a União Europeia).

Além disso, a siderúrgica ucraniana Metinvest (cerca de 40% da produção de siderurgia do país), declarou força maior devido à invasão russa, ao bloqueio de embarques marítimos e à proibição de pagamentos transfronteiriços, segundo a fornecedora de informações sobre energia e commodities Platts.

A ArcelorMittal também anunciou aumentos de preços esta semana para produtos de aços planos, com a Platts mencionando a expectativa de oferta mais apertada, especialmente no sul da Europa, onde há algum pânico no mercado com relação à oferta de aço.

Carvão: A Rússia responde por cerca de 16% das exportações globais de carvão metalúrgico e cerca de 17% do carvão térmico, de acordo com a CRU. Do total, cerca de 55% a 60% é exportado para a China e Nordeste da Ásia e 12% para a União Europeia.

“Não esperamos interrupções relevantes em exportações de carvão, dada a dependência que o mundo (e especialmente a União Europeia) tem das fontes de energia russas, embora a volatilidade no curto prazo possa dar suporte aos preços. Observamos que o fornecimento global de carvão também está sendo impactado por questões climáticas na Austrália”, avalia o BBI.

Papel e Celulose: O impacto é relativamente mais limitado, apontam os analistas do Bradesco BBI, mas não totalmente desprezível, com os preços de petróleo e gás natural devendo pressionar fabricantes de papel, enquanto a Rússia é um importante exportador de kraftliner para a Europa (cerca de 200 mil toneladas por ano).

Entre as notícias recentes que podem impactar o setor, destacam (i) a International Paper podendo encerrar a produção de celulose e papel na fábrica de Svetogorsk na Rússia (capacidade de 720 mil toneladas por ano), pois está enfrentando um fornecimento inadequado de matérias-primas cruciais para a produção; (ii) enquanto a sueco-finlandesa Enso interrompeu toda a produção e vendas na Rússia até novo aviso (cerca de 3% da receita total do grupo); (iii) a finlandesa UPM cessou entregas para a Rússia (cerca de 2% das vendas de 2021).

Além disso, outra fonte de possíveis interrupções está relacionada ao fornecimento de madeira, já que a Rússia responde por cerca de 20% do mercado global de celulose de fibra longa e madeira serrada, de acordo com a agência especializada RISI.

Gargalos logísticos se aprofundam na região. Os analistas do BBI também destacam que seria negligente não apontar os gargalos logísticos se aprofundando  na região à medida que a guerra avança. As principais companhias de navegação (por exemplo, One Network, MSC, Hapag-Lloyd e Maersk), que respondem por cerca de metade da capacidade global de transporte de contêineres, estão se afastando dos portos ucranianos e evitando a Rússia, de acordo com RISI.

Os analistas do Bradesco BBI avaliam que as cadeias de suprimentos provavelmente ficarão ainda mais pressionadas pela situação, especialmente porque a Rússia e a Ucrânia estão localizadas próximas às principais rotas de transporte, como o Mar Negro.

Os períodos de guerra têm sido historicamente inflacionários e as curvas de custo global das commodities podem se deslocar para cima, traduzindo-se em maior suporte aos preços das commodities, avaliam. Para eles, os produtores integrados de commodities de baixo custo estão melhor posicionados.

Nesse cenário macroeconômico e geopolítico, as ações que podem continuar a ter desempenho taticamente superior, na visão do BBI, são  empresas como CBA (CBAV3), de alumínio e Vale (VALE3), enquanto também enxergam assimetria de valor significativa na Usiminas (VALE3), sendo que todas elas possuem recomendação outperform (desempenho acima da média do mercado) pela casa.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.