Haverá acordo entre Eletrobras (ELET3) e governo? Os cenários traçados por analistas sobre a “novela” do direito de voto

Analistas do BBA e do BBI seguem convictos de que as regras da privatização da companhia serão mantidas, mas destacam cenários se isso não ocorrer

Felipe Moreira Lara Rizério

Eletrobras (Foto: Getty Images)

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Em 5 de maio, o governo federal entrou com uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal, pedindo a revogação do limite do direito de voto na Eletrobras (ELET3;ELET6), de forma a fazer com que a União tenha voto proporcional à sua fatia na empresa.

O governo conta com 42,61% das ações ordinárias da companhia de energia, privatizada em junho do ano passado. Contudo, devido à lei da desestatização da Eletrobras, a proporção de votos é limitada a 10%, uma vez que a privatização transformou a Eletrobras numa “corporation”, uma empresa de capital privado sem acionista controlador.

Desde então, as novidades sobre o caso têm sido um importante direcionador para as ações da companhia e com analistas traçando cenários sobre os possíveis desfechos do caso.

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Nesta semana, o JOTA PRO, serviço de notícias com foco em informações jurídicas, noticiou que o ministro do Supremo Tribunal Federal, Kassio Nunes Marques, estuda um processo de mediação entre o governo federal e a Eletrobras para tentar chegar a um acordo sobre o caso.

Na semana passada, o ministro Nunes Marques acionou o rito abreviado para a ADI na Corte. De acordo com o artigo 12 da Lei 9.868/1999, o governo federal e a Eletrobras têm 15 dias para apresentar suas contribuições. No entanto, não há prazo para a decisão de mérito pelo Conselho do Supremo Tribunal Federal uma vez encerrado o prazo de contribuição.

Nesse contexto, o Itaú BBA comentou que um eventual acordo entre a Eletrobras e o governo federal é improvável. O preço de capitalização foi baseado na premissa de que o governo federal teria menos influência sobre a empresa, permitindo que a administração tornasse a elétrica uma empresa eficiente e aumentasse sua capacidade de investimento, avalia.

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Além disso, analistas destacam que a maioria das principais decisões aprovadas pelos acionistas provavelmente não teriam sido aprovadas se os direitos de voto do governo federal fossem proporcionais aos seus 42,5% de ações com direito a voto.

Segundo relatório, ultrapassar o limite do direito de voto colocaria em xeque a Lei das SAs, o que afetaria também outras empresas listadas ,como B3 (B3SA3), com 7%, Rumo (RAIL3), com 20%, PRIO (PRIO3), com 15% e Embraer (EMBR3), com 5% . De acordo com o Artigo 110 do Projeto de Lei 6404/1976, comumente conhecido como Lei das SAs, o estatuto social da companhia tem o poder de estabelecer um limite ao direito de voto.

O BBA ainda lembra que a iniciativa do governo federal de retirar o limite do direito de voto não tem apoio do Congresso nem do Tribunal de Contas da União (TCU). “Os chefes da Câmara e do Senado, assim como o presidente do TCU, têm afirmado publicamente que a aprovação do processo de privatização seguiu todos os trâmites legais e que não apoiam a reabertura da discussão.”

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O banco acredita que os acionistas minoritários da Eletrobras possam concordar com a eleição de um conselheiro a ser indicado pelo governo federal. A eleição da diretoria da Eletrobras foi realizada por maioria de votos para um grupo de conselheiros com mandato até 2025. O governo federal não pode substituir um conselheiro. Em caso de renúncia de um membro, os acionistas devem propor potenciais candidatos ao cargo, ocupando o cargo vago aquele que obtiver o maior número de votos. O governo, portanto, não tem poder para nomear um conselheiro se os acionistas minoritários não apoiarem o candidato.

Com relação ao futuro, o banco espera que o processo de mediação pode levar algum tempo para ser concluído e, caso não haja acordo, o Conselho do Supremo Tribunal Federal julgará o mérito. Essa é uma discussão muito complexa com implicações tanto para a Eletrobras quanto para todo o mercado de capitais. Sendo assim, analistas acreditam que os argumentos legais da Eletrobras são fortes e provavelmente prevalecerão, mas a incerteza permanecerá, afetando potencialmente o apetite dos investidores por outras privatizações no Brasil.

O BBA reitera avaliação outperform (desempenho acima da média do mercado, equivalente à compra) para as ações ordinárias da Eletrobras (ELET3) e preço-alvo de R$ 61,60, o que representa potencial de valorização de 70,7% frente à cotação de fechamento da véspera, com base em avaliações atrativas e catalisadores positivos de curto prazo.

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E se o voto proporcional for adotado?

Assim como o Itaú BBA, o Bradesco BBI também apontou que tem como cenário-base a manutenção das regras de privatização.

Porém, em relatório, discutiu alguns riscos que podem surgir se o governo for bem-sucedido em sua petição ao STF e conseguir retirar o limite de 10% dos votos.

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“Conforme amplamente discutido pelo mercado/imprensa, a implicação mais óbvia desse cenário seria a reversão da privatização da Eletrobras e seu objetivo de fomentar investimentos no setor. No entanto, outros riscos podem incluir, por exemplo, investidores minoritários reivindicando o direito de retirada, recebendo o valor patrimonial por suas ações (R$ 48,00)”, avaliam.

Nesse cenário, se todos os minoritários decidirem sair, a Eletrobras teria que desembolsar cerca de R$ 66 bilhões (contra um valor de mercado de R$ 84 bilhões), o que ela não tem disponíveis.

Esta tese legal poderia ser apoiada, pois a liminar, se concedida, criaria ações super ordinárias “sem voto-limite” na Eletrobras (contra outras ordinárias limitadas a 10% dos votos), traçando um paralelo com o “voto múltiplo” – dispositivo que já está incluído na legislação societária.

Notadamente, se uma ação de “voto múltiplo” for criada em qualquer empresa (ou seja, 1 ação ordinária com poder de voto maior que 1), de acordo com a legislação societária, os acionistas que discordarem podem retirar-se, recebendo o valor contábil de suas ações.

Nessa abordagem, uma vez que a Eletrobras não tem dinheiro para pagar, ou: (i) o governo precisaria injetar dinheiro ou, (ii) se a Eletrobras deixar de pagar os direitos de retirada, os acionistas poderiam entrar com pedido de falência, por sua vez, acelerando o pagamento de grande parte da dívida da empresa. “Este cenário/risco pode ser visto como de baixa probabilidade, mas as consequências podem ser tão significativas para a Eletrobras, o setor e todos os acionistas, incluindo o Governo Federal, o que é outra razão pela qual acreditamos que o limite de votos será mantido”, avaliam os analistas do banco.

Eles avaliam ainda que, como era de se esperar, desde que o Governo impetrou, em 5 de maio, a liminar pedindo ao Supremo Tribunal Federal (STF) para retirar o limite de 10% dos votos da Eletrobras, os investidores desviaram a maior parte de sua atenção da reestruturação pós-privatização da Eletrobras, que está apenas começando, para debater os riscos potenciais se o STF deferisse a petição do governo.

“Nosso cenário base é que o limite de 10% dos votos da Eletrobras será mantido, aplicando-se a todos os acionistas, incluindo o Governo –que possui cerca de 43% das ELET3/ações ONs. Nossa visão é sustentada, entre outras coisas, pela lei de privatização da Eletrobras, que inclui o limite de 10% dos votos e foi aprovada pelo Congresso após um longo debate”, apontam, reforçando a visão de que todos os aspectos técnicos da privatização da empresa foram analisados e aprovados pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

Assim como o Itaú BBA, o Bradesco BBI também tem recomendação outperform para Eletrobras, mas para as ações PNB ELET6, com preço-alvo de R$ 71 (ou potencial de valorização de 83% frente o fechamento de quinta-feira).