Ecorodovias (ECOR3): por que a vitória no leilão da “Noroeste Paulista” desagradou tanto os investidores?

Apesar das perspectivas positivas, alavancagem e investimentos em capital preocupam; CEO deu mais detalhes sobre o financiamento do projeto

Lara Rizério

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A sessão da última quinta-feira (15) foi de fortes emoções para a Ecorodovias (ECOR3). Durante a tarde, a companhia participou do leilão de concessão rodoviária do chamado Lote Noroeste paulista, composto por estradas que interligam cidades como São José do Rio Preto, Araraquara, São Carlos e Barretos.

Após uma disputa com CCR (CCRO3) e Infraestrutura Brasil Holding XXI, do Pátria, a Ecorodovias se saiu vitoriosa na disputa ao apresentar um valor de outorga fixa de 1,236 bilhão, um ágio de 16.151% ante a outorga mínima de R$ 7,6 milhões.  A segunda maior proposta foi de R$ 753,8 milhões, da CCR, enquanto a da Infraestrutura Brasil Holding XXI foi de R$ 321,3 milhões.

“O lote noroeste gera Ebitda [lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações] desde o início da concessão e alonga o prazo de duração do portfólio”, disse a Ecorodovias em fato relevante, acrescentando que sua oferta “demonstra claramente o compromisso de crescimento da companhia com retorno sustentável e disciplina financeira”.

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A concessão, de 30 anos, é composta por cerca de 600 quilômetros de rodovias e tem previsão de R$ 10 bilhões em investimentos em obras e mais R$ 3,9 bilhões em operação, segundo o governo de São Paulo. O contrato ainda inclui uma outorga variável de 8,5% da receita bruta.

Apesar da vitória no leilão, as ações da Ecorodovias desabaram quase 12% na última quinta-feira, com os investidores e analistas de mercado mostrando preocupação quanto aos valores pagos pela companhia. A rival CCR, no mesmo pregão, teve queda de 1,59% de seus ativos.

Pedro Bruno e Lucas Laghi, analistas da XP, veem espaço para bons retornos assumindo algumas eficiências operacionais versus as estimativas do governo e alavancagem no projeto (Taxa Interna de Retorno, TIR, real alavancada de 10,7%; Valor Presente Líquido, VPL, de cerca de R$250 milhões, cerca de 7% do valor de mercado).

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“No entanto, o lance vencedor aumenta as preocupações do mercado em torno da alavancagem financeira da Ecorodovias e do seu alto compromisso de capex, ou investimentos em capital (4,1 vezes a relação entre dívida líquida e Ebitda e cerca de R$ 30 bilhões em capex a executar, pré-leilão), que, em nossa opinião, é o motivo por trás do desempenho negativo das ações”, avaliaram os analistas, que reiteraram recomendação neutra para a ação.

Segundo os analistas, apesar do perfil maduro e de baixo risco do projeto, sua necessidade de investimentos de R$ 10 bilhões (50% nos primeiros sete anos) mais R$ 1,2 bilhão de outorga superam o Ebitda projetado até 2029, aumentando a já alta alavancagem da Ecorodovias (relação entre dívida líquida e Ebitda do projeto atinge pico de 6,2 vezes em 2027). Além disso, apontam, a Ecorodovias atingiu um total de cerca de R$ 40 bilhões em compromissos de capex incluindo este projeto (mais de 10 vezes o seu valor de mercado atual).

Os analistas do Goldman Sachs estimam um VPL potencial negativo em R$ 656 milhões. “No entanto, aguardaremos que a Ecorodovias forneça mais contexto sobre esta licitação para melhor entender e avaliar o potencial de criação de valor”, destacaram.

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Os analistas permanecem com recomendação neutra para as ações, vendo outros nomes do segmento com maior potencial. O preço-alvo para os ativos é de R$ 7,60 para doze meses, um potencial de valorização de 41,5% em relação ao fechamento da véspera.

O Bradesco BBI destacou que a derrocada das ações da Ecorodovias na véspera reflete duas preocupações do mercado: 1) se a Ecorodovias pode gerar valor por meio dessa oferta e 2) se a empresa precisará levantar capital para desalavancar o seu balanço.

Sobre a primeira questão, os analistas que assinam o relatório avaliam que a Ecorodovias pode alcançar um retorno alavancado atrativo de 13,5% com a concessão Noroeste Paulista.

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“Embora a outorga de R$ 1,2 bilhão (a ser paga no início de 2023) pareça agressiva, notamos que a diferença de R$ 483 milhões nos lances oferecidos pela Ecorodovias e CCR é inferior ao Ebitda de um ano para esta concessão com as operações de Intervias e Tebe. Tanto a Ecorodovias quanto a CCR pareciam esperar retornos semelhantes”, apontam.

Sobre o segundo ponto, os analistas projetam que a alavancagem financeira da Ecorodovias poderia aumentar para 4,3 vezes a relação entre dívida líquida e Ebitda para 2023 e depois cair para 3,7 vezes em 2024, isso de uma relação de 4,1 vezes a  dívida líquida/Ebitda acumulada em doze meses no fim do segundo trimestre de 2022.

“Embora essa alavancagem limite o poder de fogo da Ecorodovias para licitar novas concessões sem realizar uma oferta de ações, se levarmos em consideração sua resiliência de fluxo de caixa, plano de capex e perfil de dívida, a alavancagem parece ser administrável”, apontam. Por fim, estimam que a Noroeste Paulista deve adicionar VPL de R$ 523 milhões ou R$ 0,80 por ação ECOR3. Assim, mais otimistas, mantêm a recomendação outperform (desempenho acima da média do mercado), com um preço-alvo de R$ 12, ou potencial de valorização de 123% frente o fechamento da véspera.

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Visão da empresa e planos para o futuro

Após o leilão, Marcello Guidotti, presidente da EcoRodovias, disse estar confiante de que o Lote Noroeste de rodovias paulistas irá agregar “muito valor” ao grupo.

“Estudamos muito bem esse lote, assim como todos os outros. Esse, em particular, é muito maduro, com histórico de tráfego consolidado, estamos entrando em projetos com disciplina financeira”, disse após o leilão promovido na B3. “Não temos que nos balizar pela proposta dos outros, temos uma proposta muito sólida, estamos absolutamente confiantes que conseguiremos agregar valor ao grupo”, acrescentou.

O executivo destacou que a companhia tem uma equipe de engenharia forte, com ativos de várias complexidades. “(Esse projeto tem) capex muito simples em termos de engenharia, embora volumoso, não tem grandes obras.”

Guidotti disse que a companhia deve ter um financiamento tradicional.

“Já conversamos com o BNDES, o (banco) gosta muito do projeto. Seguramente faremos um empréstimo-ponte inicial, para que possamos levar a concessão nos primeiros 2 ou 3 anos”, esclarece. “Teremos empréstimo-ponte e take out com o BNDES, provavelmente usaremos debêntures de infraestrutura”, acrescentou.

O executivo disse que, neste projeto, 70% deve ser financiamento e 30% equity. Guidotti destacou ainda que esse ativo diminui a alavancagem do grupo nos primeiros anos. “É importante ressaltar que a concessão já começa com geração de caixa muito forte, com Ebitda importante desde o primeiro dia. (O ativo) gera mais caixa do que perda de dívida.”

Segundo ele, conforme o capex for executado, no futuro os outros ativos já estão mais maduros. “Temos essas métricas sob controle, entendemos que esse projeto cabe muito bem no nosso portfólio.” A EcoRodovias foi assessorada pelo Santander.

O presidente da EcoRodovias disse que a companhia segue olhando projetos prioritários para o futuro. “Temos nossas prioridades, no programa federal em especial (as rodovias) do Paraná. (O projeto da BR) 381 também está sendo estudado.”

Ele acrescentou que “tudo indica” que esses leilões devem sair esse ano. “Estamos num momento de eleições, mas estes são programas de Estado, não de governo.” O executivo acrescentou que a inflação e os custos dos materiais são informações conhecidas. “Conhecer essas informações nos deixa aptos para colocar isso na proposta, não é novidade que o preço do asfalto cresceu mais que a inflação.”

(com Estadão Conteúdo)

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.