Dólar, Ibovespa e ações: o que esperar para os ativos após a euforia inicial do mercado com o 1º turno das eleições?

Gestores e analistas destacam primeiro turno positivo para ativos de risco, mas também alertam para volatilidade e atenção com mercado internacional

Lara Rizério Vitor Azevedo Mitchel Diniz

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O grande evento doméstico do ano para o mercado aconteceu no último domingo (2), com algumas surpresas que animaram os ativos de risco nesta segunda-feira (3), também impulsionados pelo exterior. Porém, muitos analistas de mercado e gestores ainda adotam o tom de “otimismo cauteloso” e preveem volatilidade durante todo o mês de outubro para os ativos brasileiros.

Com praticamente a totalidade das urnas brasileiras apuradas, a disputa para a Presidência da República terá definição apenas no dia 30 de outubro, no segundo turno, entre o ex-presidente Lula (PT) e o atual presidente, Jair Bolsonaro (PL). Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, o petista teve quase 57 milhões de votos (48,3 %) e o candidato à reeleição teve quase 51 milhões de votos (43,31 %) computados. Em seguida, ficaram Simone Tebet (MDB), com pouco menos de 5 milhões de votos (ou 4,17 %) e Ciro Gomes (PDT), que somou cerca de 3,5 milhões de votos (ou 3,05 %).

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Este é o placar mais apertado para o 1º turno desde a redemocratização, com o primeiro e segundo colocados somando mais de 90% dos votos válidos, destaca a Levante Ideias de Investimentos.

O Ibovespa disparou nesta segunda 5,54%, superando os 116 mil pontos, e o dólar caiu cerca de 4%, na casa dos R$ 5,17 na compra, o que traz indicações importantes sobre o que os investidores acharam do pleito.

O desfecho das urnas decepcionou a campanha de Lula, que esperava, ao menos, uma margem mais confortável para o segundo turno. Os mais otimistas até acreditavam em uma definição já neste 2 de outubro. “Por outro lado, o maior vencedor desta ocasião é Bolsonaro e seu grupo de apoio – tanto em âmbito nacional, cujo desempenho foi melhor que o esperado, quanto no Congresso e nas disputas regionais, em que o bolsonarismo foi a principal força registrada nas urnas”, apontam os analistas da Levante.

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Segundo destacou a consultoria de risco político Eurasia, entre outras casas de análise, a chance de vitória de Lula diminuiu, mas ele segue favorito. Conforme ressaltou a XP, a eleição apertada trará possivelmente acenos mais ao centro por parte de Lula e de Bolsonaro, na tentativa de atrair o eleitor de centro e ainda indeciso.

“Isso vai empurrar o Lula pra um discurso mais ao centro. É positivo para a situação fiscal, que vai ser super importante a partir de 2023, e também mostra que não houve onda vermelha. A configuração atual do Congresso deve se manter e ficar ainda mais forte”, avalia Victor Candido, economista-chefe da RPS Capital.

Fabrizio Velloni, economista-chefe da Frente Corretora, avalia que a eleição da bancada do Congresso, com o PL, partido de Bolsonaro, candidato à reeleição, elegendo representantes para 8 das 27 vagas em disputa para o Senado Federal, contribuiu para essa visão mais positiva do mercado.

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“Mesmo tendo a eleição do candidato do PT, gera um hedge pro mercado que ele não vai conseguir passar com facilidade medidas controversas como tirar teto de gastos, conseguir trabalhar com estatizações”. O PL deve iniciar a próxima legislatura como a maior bancada da casa no Senado. A sigla supera forças tradicionais do parlamento, como o MDB e PSD, além do União Brasil, legenda oriunda da fusão de Democratas e PSL.

Por outro lado, “se o governo se reeleger, ele vai ter maior facilidade para implementar a agenda liberal de Paulo Guedes, que agrada bastante o mercado financeiro, evoluindo com reformas que ficaram paradas – como privatização e reforma tributária -, por falta de articulação que tinha com as outras casas”, complementa. Para o especialista, o Ibovespa ainda tem fôlego para chegar a 117 mil pontos.

Na avaliação de Velloni, o dólar, que fechou setembro perto dos R$ 5,40, com alta mensal de cerca de 3%, estava precificando risco da eleição e hoje caiu forte, mais de 4%. Contudo, o cenário para o câmbio é de volatilidade levando em conta também o mercado externo, que afeta bastante de todo o mercado.

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“O dólar segue em curva de apreciação frente outras moedas e a tendência disso ainda é continuar por um tempo mais esticado, vista a degradação principalmente de Europa, que tem tendência de subida de juros mais forte”, avalia.

O cenário de volatilidade e apreensão com o ambiente internacional também é destacado por outros analistas.

Matheus Pizzani, economista da CM Capital, alerta para o risco de volatilidade bem significativa do mercado de câmbio à frente, com investidores prestando mais atenção às pesquisas de intenção de voto diante da perspectiva de um segundo turno disputado.

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O economista também citou as incertezas sobre eventual equipe econômica de Lula. Os mercados têm reagido positivamente a especulações sobre possível nomeação do liberal e ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles para chefiar a pasta econômica do petista, mas fontes da Reuters próximas a Lula disseram na sexta-feira ver poucas chances de essa indicação se concretizar.

“Ainda não descartamos maior volatilidade no período entre o primeiro e o segundo turno”, avalia Pedro Patrão, economista e sócio da HCI Invest.

“Independente de quem vencer a disputa presidencial, a principal preocupação dos investidores para o próximo governo segue sendo a agenda fiscal e a trajetória dos gastos públicos… Os dois principais candidatos fizeram campanha por mais gastos e o presidente eleito terá esse desafio à frente, de como equilibrar as contas públicas e a trajetória futura da dívida.”

Para a XP, o mercado deve acompanhar de perto as próximas evoluções dos candidatos e suas propostas. Isso pode vir a elevar um pouco a volatilidade do mercado, que segue em um patamar baixo em relação ao histórico durante períodos eleitorais, afirma.

Paolo di Sora, CIO da RPS Capital, afirmou em edição especial desta segunda do InfoMorning, programa exibido pelo canal do InfoMoney no YouTube, que o cenário externo também deve ser monitorado de perto pelos investidores e alerta que o “Brasil não é uma ilha”.

Sobre a eleição, di Sora avalia que a probabilidade de o Lula fazer um governo muito à esquerda ficou muito pequena. “A probabilidade de um presidente mais radical, mais raivoso, com governo liderado pela Gleisi Hoffmamn ou pelo Aloísio Mercadante caiu muito”, acrescentou.

Para Tiago Cunha, gestor de renda variável da Ace Capital, pode-se dividir a reação do mercado hoje em dois pontos: i) aumento da probabilidade de Bolsonaro conseguir a reeleição, algo que até então estava próximo de zero, considerando as diferentes pesquisas de opinião disponíveis no 1º turno e ii) leitura de que, para que consiga se eleger, Lula deveria acenar para o centro, possivelmente eliminando discursos mais extremistas e eventualmente confirmando Henrique Meirelles como nome para a Fazenda.

“Difícil dizer qual dos dois elementos fornece maior suporte para a Bolsa nesse momento. A diferença favorável à Lula ainda é grande o suficiente para que o peso do item 2 seja maior. Por outro lado, algumas análises recentes demonstram que o momentum para a campanha de reeleição do presidente Bolsonaro é positivo, com aumento de uma eventual virada já no curto prazo. Seja qual for a justificativa, os dois pontos levantados são muito positivos para a Bolsa e os ativos de risco brasileiros em geral”, afirma.

Equipe de análise do JPMorgan aponta que o desfecho da véspera, com a eleição apertada, torna crucial que Lula apresente seu plano macroeconômico, talvez até dando uma visão mais firme sobre quem será seu ministro da Fazenda. Bolsonaro já indicou que Paulo Guedes seguirá na Economia.

Os estrategistas também chamaram a atenção para as surpresas no nível estadual, onde os candidatos ligados a Bolsonaro se saíram bem tanto nas eleições para governador quanto para o Congresso Nacional.

Esse cenário, avaliaram em relatório, deve encorajar a campanha de Bolsonaro no início do segundo turno e os resultados nos Estados podem ser uma dica de que proporcionalmente mais votos podem migrar para o candidato no segundo turno. “Ainda assim, não há muitos votos por aí para conquistar… Será um segundo turno muito combativo.”

Na semana passada, a equipe do JPMorgan estimou que cenário mais provável para o primeiro turno na corrida presidencial era Lula à frente de Bolsonaro em 5% ou menos.

“Nossa visão é de que o mercado é de alta independentemente das eleições”, afirmaram no relatório com data de domingo. “O período pós-eleitoral deve mostrar uma política econômica moderada e há a eventual chance positiva de que Lula, se eleito, nomeie uma equipe econômica pró-mercado.”

Além disso, acrescentaram, o Brasil foi o primeiro país a parar de subir as taxas de juros e o Banco Central indicou que as taxas podem começar a cair em junho. “Os ‘valuations’ estão atraentes, os fluxos estrangeiros estão ok, os resgates de fundos dedicados a ações locais estão diminuindo”, acrescentaram, citando ainda que, do ponto de vista geopolítico, o Brasil está muito bem posicionado, além de ser um país rico em commodities.

Petrobras e Banco do Brasil: quais os riscos no radar?

Numa visão geral, olhando para os ativos beneficiados, especialistas avaliam o saldo do primeiro turno como positivo para as estatais federais.  Lula terá de articular muito mais com quem diverge dos seus planos políticos – para a Petrobras (PETR3;PETR4), por exemplo, o petista vinha falando que é contra a política atual de preços, que sebe a paridade internacional do petróleo, e para o Banco do Brasil (BBAS3), ele já havia defendido que a instituição tem de focar menos o lucro para ter maior responsabilidade social.

Marcos Peixoto, gestor da XP Asset, avalia que a Petrobras, a despeito de Lula se sair vencedor, ainda tem dois trimestres do governo Bolsonaro. “Só de dividendos, do terceiro e quarto trimestre, ainda tem muito dividendo para ganhar”, avalia, após o recorde de provento pago no último trimestre.

“Se não houver mudança na política, a projeção é de ganhos de 30% no próximo ano. É difícil achar uma empresa no setor de petróleo que paga acima de 10%. Está barata. A assimetria é favorável [para valorização dos ativos]”, complementa.

Em caso de eleição de Lula, provavelmente haverá investimento maior em refinaria, mas o gestor avalia que é um investimento que deve demorar para ser concretizado.

Paolo di Sora, da RPS, no entanto, alerta para o fato de que Lula pode, uma vez que terá menor poder legislativo, aumentar o uso dos recursos administrativos, que não dependem do Congresso.

“Se o Lula ganhar, acho que o cenário para a Petrobras piora no relativo ao anterior, porque ele só terá a Petrobras e o Banco do Brasil para governar mais à esquerda. A possibilidade de ele utilizar as estatais, uma vez que não vai conseguir usar o Congresso, aumentou. Eu não estaria participando deste rally de hoje”, alerta o gestor. As ações de estatais como Petrobras e BB têm se destacado na sessão de hoje, com ganhos entre 7% e 9% durante toda a sessão, com fortes ganhos de valro de mercado

Olhando para as ações que não são de estatais, di Sora ressalta que as construtoras de baixa renda terão um desempenho positivo nos dois cenários, com Lula ou com Bolsonaro, uma vez que o governo atual impulsionou o Casa Verde e Amarela, enquanto o petista tem falado em retomar o Minha Casa Minha Vida, com um foco maior nas classes mais baixas. Construtoras se destacavam nessa sessão entre as maiores altas do índice.

Já o setor educacional, com Bolsonaro eleito, apesar da probabilidade ser baixa, é um setor que vai continuar tendo um desempenho ruim, avalia o gestor. Cogna (COGN3) e Yduqs (YDUQ3), apesar de amenizarem as quedas frente as mínimas da sessão, apareceram como os únicos destaques negativos do Ibovespa, uma vez que vinham reagindo positivamente com a perspectiva de que um eventual governo petista voltasse a fortalecer programas como o ProUni e o Fies.

Estatais estaduais: Sabesp e Copasa em destaque

Enquanto há visões divergentes sobre as estatais federais, o cenário parece mais claro para algumas estaduais após o primeiro turno na véspera. O destaque ficou a Sabesp (SBSP3), após a surpresa com o segundo turno com Tarcísio de Freitas (Republicanos) apresentando 42,32% dos votos, ante 35,70% de Fernando Haddad (PT), enquanto as últimas pesquisas eleitorais mostravam o petista na frente. Os ativos saltaram durante toda a sessão cerca de 17%, fechando com ganhos de 16,94%.

Analistas do Bradesco BBI avaliaram que, se Tarcísio for eleito, “a probabilidade de privatização (da Sabesp) seria bastante elevada”. No governo de Jair Bolsonaro, Freitas promoveu uma agitada agenda de concessões e privatizações do setor de infraestrutura no Brasil, buscando investimentos privados em rodovias, ferrovias, portos e aeroportos e menos em arrecadação com outorgas.

“A nosso ver, a potencial privatização da Sabesp levaria algum tempo para acontecer de fato (talvez no segundo ano do mandato do próximo governador), mas como a ação está relativamente barata, podemos ver o mercado se animando…”, apontaram os analistas do BBI.

Peixoto, da XP Asset, destaca que a Sabesp foi o destaque, com o resultado do primeiro turno indo muito contra o que as pesquisas estavam mostrando. “Havia dúvidas se o Tarcísio ia para o segundo turno. Com o que ele fez na parte de infraestrutura, traz a perspectiva de que ele vai tentar privatizar a Sabesp, o que não necessariamente será fácil, mas possível. A probabilidade de Tarcísio ganhar é alta”.

Os analistas do BBI também destacaram Cemig (CMIG4) e Copasa (CSMG3), citando que a plataforma de Romeu Zema (Novo), eleito no primeiro turno, é pró-privatização. Por isso, é provável que ambas voltem a ser destaque, mas ponderaram que será necessário respaldo legislativo, o que não houve no primeiro mandato.

“Independentemente disso, a primeira empresa a ser vendida (depois da Codemig) provavelmente seria a concessionária de água Copasa CSMG3 (não a Cemig CMIG4). Isso porque os políticos locais e os mineiros são menos ‘afetuosos’ com a Copasa – qualidade de serviço é um problema – do que a Cemig, e mudar a lei para vender a Copasa primeiro seria um passo inicial mais fácil,” segundo o Bradesco BBI.

“No caso do Zema, o cenário base já era ele ganhar. Minas Gerais tem uma peculiaridade difícil na privatização, por conta da necessidade de passar a matéria na assembleia por três quintos de votos a favor. Mas a formação da assembleia foi mais favorável”, avalia Peixoto, da XP Asset. CMIG4 fechou a sessão em alta de 10,69%, enquanto a CSMG3 teve um desempenho surpreendente de 18,79%.

No Paraná, onde Ratinho Junior (PSD) foi reeleito também em primeiro turno, os analistas do Bradesco BBI afirmaram não esperar nenhum movimento de privatização no curto prazo para Copel (CPLE6) e Sanepar (SAPR11).

“Talvez após a bem sucedida privatização da Eletrobras ELET3;ELET6), haja espaço para o Paraná cogitar vender a Copel – e a Sanepar -, mas essa é uma discussão que ainda não começou, até onde sabemos”, afirmaram os analistas em nota a clientes. Copel PNB subiu 3,95% e a unit da Sanepar subiu 7,41%.

Peixoto cita ainda o Rio Grande do Sul. O cenário confirmou os nomes que eram mais ventilados pelas pesquisas de intenção de voto, mas com uma surpresa: Onyx Lorenzoni (PL), candidato de Bolsonaro, terminou a votação à frente de Eduardo Leite (PSDB), que recebeu 37,50% contra 26,81% do tucano. Edegar Pretto (PT) terminou na terceira colocação da disputa com 26,77%.

Para o gestor, Banrisul (BRSR6) é um ativo privatizável, apesar de haver uma resistência maior à pauta. “Com Onyx, porém, aumenta a probabilidade. O mercado não vai ficar tão de olho, mas é marginalmente positivo”. Os ativos avançaram 3,66% na sessão.

(com informações da Reuters)

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.