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Dólar a R$ 5? Como política fiscal trava valorização do real em novo cenário de juros

Queda de juros nos EUA e alta no Brasil, em tese, deveria levar à queda do dólar; entenda o que impede que isso

Matheus Prado

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Apesar do movimento global de corte das taxas de juros, especialmente nos EUA, e da alta da taxa Selic no Brasil, dificilmente o dólar retomará o patamar de R$ 5 no curto prazo, segundo especialistas.

Embora esses movimentos realizados, por parte dos bancos centrais, devessem favorecer, em tese, a valorização do real frente ao dólar, a falta de confiança na gestão fiscal do governo e os ruídos internos limitam o potencial de recuperação da moeda brasileira.

A espera pelo início do ciclo de afrouxamento monetário nos Estados Unidos parece ter sido tão longa que, quando o Federal Reserve (Fed) anunciou seu primeiro corte de juros na última semana, o Banco Central já estava iniciando outro ciclo de elevação da Selic.

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Mas a verdade é que incertezas internas, principalmente fiscais e também de credibilidade do próprio BC, fizeram com que o mercado praticamente exigisse novas altas de juros.

Dólar e juros

Um dos grandes vetores dessa pressão – sobre os juros – foi o câmbio, que saiu do nível de R$ 5, que sustentou entre março de 2023 e março de 2024, para máxima de R$ 5,86 em agosto.

E assim, com a alta da Selic ocorrendo por aqui enquanto as taxas caem ao redor do globo, havia uma expectativa de que a elevação do diferencial de juros servisse como prêmio de consolação e o real conseguisse recuperar parte do terreno perdido. 

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Mas o que se viu até aqui foi uma tendência de queda atenuada em parte pela continuação dos ruídos internos.

Um exemplo claro disso foi a movimentação da divisa em setembro. Recuou de R$ 5,66 para R$ 5,42 entre os dias 12 e 19 de setembro, diante da expectativa e da materialização do corte pelo Fed e da alta do Copom. E já voltou a R$ 5,53, no dia 23 após o governo reduzir contingenciamentos de gastos. 

“Alguns ativos descem de escada e sobem de elevador”, diz Otávio Oliveira da Silva, gerente de tesouraria do Banco Daycoval.

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“Compra-se dólar em momentos de insegurança, especialmente aqui no Brasil, então as dinâmicas de alta e de baixa não são simétricas. No início do ano, o viés era mais neutro, mas o mercado achou por bem sair do real durante o ano, seja por questões internas ou incertezas externas, e não voltou. Agora a volatilidade voltou a subir e, no momento, parece fácil o dólar ‘estilingar’ e mais difícil voltar.”

Efeito carry trade

O executivo diz que o diferencial de juros, ou ‘carry trade‘, tem limite de efeito, que acaba no ponto em que começam as questões idiossincráticas de um país – ou seja, características únicas ou específicas.

Nessa linha, aponta que se fosse só ter juro alto para a moeda performar, outros países com juros elevados estariam em posição melhor. Trazendo para o cenário local, acredita que existe uma insegurança em relação ao compromisso do governo com as contas públicas.

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“No fim das contas, se fiscal, ruídos políticos e transição do BC forem relativamente controlados e não ocorrer evento fora do esperado lá fora, dá para pensar em um dólar a R$ 5,30 no fim do ano. Lula e Haddad também estão tentando diálogo com agências de rating e a volta do grau de investimento seria uma ótima notícia. Agora, se as coisas não correrem bem, fica até difícil precificar o patamar que o dólar pode atingir”, resume.

Diferencial de juros

O trader da Clear Corretora Rafael Perretti nota que o Brasil tem o segundo maior diferencial de juros do mundo, atrás apenas da Rússia. Além disso, o cenário externo é muito favorável porque o Fed começou a cortar juros, ou seja, espera que investidores saiam dos EUA para buscar maior rentabilidade em outros mercados.

Mas, olhando especificamente para o Brasil, ele enxerga um cenário interno instável e, enquanto continuar assim, acredita que o dólar continua sendo uma opção de proteção.

“Olhando para o gráfico, vejo o dólar entre R$ 5,50 e R$ 5,70. Se passar disso, pode ir a R$ 6. Se o governo sinalizar qualquer tipo de controle, pode voltar para a região dos R$ 5,40 e, se perder essa região, pode voltar ao patamar de R$ 5,10. O dólar ficou travado de novembro do ano passado até abril, e depois a volatilidade aumentou. E quanto mais aumenta o preço, mais aumenta a volatilidade”, diz.

O estrangeiro chegou a ter este ano uma posição muito grande comprada em dólar, de cerca de R$ 70 bilhões, e o custo para carregar isso está crescendo, diz José Faria Junior, diretor da Wagner Investimentos, indicando que o diferencial tende a limitar os ganhos do dólar.

Para ele, a Selic não deve ir muito além de 12% e o piso dos Fed Funds é em torno dos 3%. O diferencial que estava em 5% abriria para 9%, o que deveria trazer alívio, diz. 

“Mas os preços das commodities, por exemplo, já estiveram melhores recentemente. E o saldo da balança comercial brasileira depende muito disso. Questão eleitoral dos EUA também pega. Kamala Harris quer aumentar impostos e o Donald Trump, tarifas. Os dois vão tentar atacar a China, mas o Trump vai ser mais incisivo, o que é pior para o Brasil. E, localmente, tem a questão fiscal”, diz.

Arcabouço

Em relação ao cenário local, ele argumenta que o arcabouço parece fácil de ser rompido. Muitos gastos ficam de fora e não há punição, ressalta Faria Júnior, e isso tem sido muito negativo para o mercado.

“Estamos vivendo momento de arrecadação alta e o governo só consegue pensar em equilibrar as contas via impostos. A queda das commodities impacta nisso, inclusive. Mercado está duvidando que o governo irá cumprir a meta fiscal.”

Por mais que o diferencial ajude, diz, o fiscal está pesando e deve continuar. Para ele, o dólar pode ir a R$ 5,20, R$ 5,30, mas não muito mais que isso.

“A inflação não deve ser um problema extremo porque o BC voltou a subir juros, mas vai continuar exigindo taxas elevadas e levará a piora do déficit nominal”, afirma. “Estamos vendo movimento especulativo para pressionar o governo a segurar a onda nos gastos, mas não parece que isso vai ocorrer.”

Recessão nos EUA?

O executivo da Wagner Investimentos diz ainda que está entre os que acreditam que é provável que haja uma recessão nos Estados Unidos, expectativa que ainda não se provou, mas que pode se materializar nos próximos seis a nove meses.

Caso isso ocorra, projeta ele, o Fed vai cortar mais do que o que está precificado e as commodities devem continuar performando mal. Isso seria ruim para o real inicialmente, podendo melhorar num segundo momento, completa.