Crise hídrica de um lado, regulamentação do marco legal de outro: os sinais dúbios para as ações de saneamento

Decreto regulamentando marco legal é ofuscado por notícias sobre crise hídrica e privatização distante da Sabesp, mas expectativa é de investimento no setor

Equipe InfoMoney

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SÃO PAULO – O noticiário dos últimos dias têm movimentado o setor de saneamento, com indicações positivas e negativas para as companhias.

Do lado positivo, está o decreto de regulamentação do novo marco legal do saneamento, considerado bastante importante para a transformação do setor (veja mais clicando aqui), principalmente para chegar às metas de universalização num contexto em que o abastecimento de água e do tratamento da rede de esgoto ainda é bastante precário no Brasil.

Por outro, a crise hídrica, ainda que tenha gerado mais preocupações num primeiro momento sobre um possível encarecimento na conta de luz por conta da ativação de energia térmica, é monitorada de perto e pode impactar as empresas de saneamento. As últimas declarações de representante do governo paulista indicando uma privatização mais distante da Sabesp (SBSP3) também acabaram impactando a ação da companhia na B3 nos últimos dias.

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Nesta quarta-feira (2), a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) publicou, no Diário Oficial da União resolução que declara “situação crítica de escassez quantitativa dos recursos hídricos” na Região Hidrográfica do Paraná, polo de produção agropecuária e de grandes hidrelétricas, até o dia 30 de novembro.

De acordo com a ANA, após a análise de cada situação, poderão ser adotadas medidas, como regras de operação temporárias para os reservatórios preservar seus volumes. “Num primeiro momento, a necessidade de restrições para usos consuntivos [que consomem água], como a irrigação e o abastecimento humano, não é vislumbrada”, esclarece a agência ao informar que, por meio das medidas adotadas “em caráter preventivo” pretende “mitigar possíveis riscos aos usos consuntivos de água, decorrentes do cenário desfavorável de chuvas, até o fim do período seco”.

A agência acrescenta que a Região Hidrográfica do Paraná passa por um “déficit de precipitações severo” desde outubro de 2019, e que diversos locais dessa região registraram vazões baixas a extremamente baixas tanto em 2019 quanto no período chuvoso de 2020/2021, quando foram registradas as menores vazões afluentes.

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“Quanto aos volumes armazenados nos reservatórios, em 1º de maio, sete dos 14 principais reservatórios de hidrelétricas da região estavam com seu pior nível desde 1999. E os demais estavam com níveis entre os cinco piores desse período”, informou a ANA. Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná estão na Região Hidrográfica do Paraná; na semana passada, o governo já havia publicado um alerta de emergência hídrica para o período de junho a setembro para esses cinco estados brasileiros.

Em relatório desta semana, os analistas do Credit Suisse apontam que a Sabesp (SBSP3) e Copasa (CSMG3), estatal mineira de saneamento, estão mais preparadas para enfrentar o cenário atual depois da crise hídrica de 2014, não apenas aumentando a oferta, mas também melhorando a flexibilidade entre os reservatórios.

“Somando-se a isso, ambas as empresas têm observado crescimento limitado do consumo desde a crise, com população mais consciente do uso da água e da mudança de hábitos de consumo”, apontam Carolina Carneiro e Rafael Nagano, analistas do banco suíço.

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Já para a Sanepar (SAPR11), a empresa tem enfrentado limitação de oferta desde 2020 e os clientes na região metropolitana de Curitiba estão sofrendo com o rodízio de abastecimento por mais de um ano. Mesmo assim, o Paraná segue em emergência de crise hídrica.

Novo marco legal 

No noticiário do setor, os analistas do Credit Suisse ainda destacaram a publicação pelo governo federal do decreto de regulamentação do novo marco legal do saneamento na última terça-feira (1). O decreto que disciplina trecho do novo marco, em vigor desde julho, foi publicado no Diário Oficial da União (DOU) e estabelece uma linha de corte para empresas de saneamento atuarem no mercado. O objetivo da comprovação de capacidade econômico-financeira é assegurar que as empresas tenham condições para cumprir as metas de universalização dos serviços.

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Em março, o ministro do Desenvolvimento Regional (MDR), Rogério Marinho, adiantou que, considerando o nível atual de caixa, pelo menos dez companhias estaduais de saneamento não conseguiriam atingir os índices necessários para continuarem operando, segundo as regras do decreto.

O ato determina que, se não se regularizarem até março de 2022, prazo final para os contratos em vigor se adequarem às metas de universalização de saneamento, essas empresas devem perder esses negócios. “O processo de comprovação de capacidade econômico-financeira deverá estar concluído, com a inclusão de decisões sobre eventuais recursos administrativos, até 31 de março de 2022”, cita o decreto.

Pelas regras, a avaliação da capacidade econômico-financeira será feita pela entidade reguladora em duas etapas sucessivas. Na primeira etapa, será analisado o cumprimento de índices referenciais mínimos dos indicadores econômico-financeiros e, na segunda etapa, a adequação dos estudos de viabilidade e do plano de captação de recursos. As empresas têm até 31 de dezembro de 2021 para apresentar requerimento de comprovação de sua capacidade à cada entidade reguladora responsável pela fiscalização.

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Para a aprovação na primeira etapa, o prestador deverá comprovar que os indicadores econômico-financeiros do grupo econômico a que pertence atendem aos seguintes referenciais mínimos: índice de margem líquida sem depreciação e amortização superior a zero; índice de grau de endividamento inferior ou igual a um; índice de retorno sobre patrimônio líquido superior a zero; e índice de suficiência de caixa superior a um.

Para a aprovação na segunda etapa, a empresa deverá comprovar que os estudos de viabilidade resultam em fluxo de caixa global com valor presente líquido igual ou superior a zero e que o plano de captação de recursos – detalhado no decreto – está compatível com os estudos de viabilidade. Esse plano deve conter os termos e as condições das captações previstas nos estudos de viabilidade para o cumprimento das metas de universalização, além de seguir prazos e fases de implementação.

As regras do decreto não se aplicam à prestação direta de serviços públicos de abastecimento de água potável ou de esgotamento sanitário pelo município ou pelo Distrito Federal titular do serviço, ainda que seja feita por intermédio de autarquia, empresa pública ou sociedade de economia mista por ele controladas.

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Quanto às empresas estatais em processo de privatização, o decreto garante seu pressuposto de capacidade econômica e financeira, uma vez que as empresas atendem a alguns requisitos, incluindo a conclusão da privatização até 31 de março de 2024.

Por fim, os analistas do Credit ainda apontam esperar por mais avanços na agenda da ANA para a definição de novas regras e diretrizes federais para a regulação regional das agências, incluindo metodologia de indenização de ativos, metodologia de revisão tarifária, de metas operacionais e definição da tarifa de resíduos sólidos urbanos.

Carolina e Nagano veem a regulamentação como positiva para o futuro do setor, destacando a definição dos requisitos econômico e financeiro para as empresas nos termos da nova lei de saneamento, uma vez que as prestadoras de serviços menos eficientes tendem a perder participação no mercado, favorecendo assim o atendimento à população.

Além disso, a opção de privatização poderia ser acelerada após as novas metas o que, a rigor, favoreceria mais a Sabesp, apesar de também verem Sanepar e Copasa também sendo beneficiadas com as novas diretriz regulatórias.

Porém, cabe ressaltar, uma notícia negativa sobre o tema afetou a ação da Sabesp desde a última sexta-feira (28). Em apenas três pregões, entre sexta-feira (28) da semana passada e a última terça-feira (1), as ações SBSP3 tiveram queda de 7,5%.

Marcos Penido, secretário de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado de São Paulo, afirmou em entrevista ao Valor Econômico que o Governo de São Paulo não deverá levar adiante nem a capitalização nem a privatização da Sabesp até 2022. O foco neste momento, disse ele, é a universalização dos serviços.

De acordo com o Credit Suisse, independentemente do cenário de estrutura de capital no curto prazo, os analistas mantêm a visão de que a Sabesp tem uma valorização descontada e que a perspectiva de lucro é positiva dada a recente revisão tarifária aprovada. Se a revisão tarifária for totalmente implementada, deve implicar em números melhores que o esperado pelos analistas.

“Ainda assim, o fluxo de notícias relacionado à privatização foi um catalisador potencial para as ações (para desbloquear o potencial de valor para o ativo) e, até que o governo decida sobre essa possibilidade, o desempenho das ações pode ser limitado. Além disso, embora não vejamos risco de racionamento no momento para garantir abastecimento de água em São Paulo, o fluxo de notícias relacionado à hidrologia seca deve continuar e também pode ser um obstáculo para as concessionárias de água”, apontam os analistas do banco suíço.

A recomendação atual do Credit para as ações do setor é de outperform (desempenho acima da média do mercado) para Sabesp, com preço-alvo de R$ 60,90, uma alta de 57% em relação o fechamento da véspera, enquanto possui recomendação neutra para Copasa, com preço-alvo de R$ 17,03 (queda de 2,3%) e possuem recomendação underperform (desempenho abaixo da média) para as units da Sanepar, com preço-alvo de R$ 27,10 (ainda que com um potencial de valorização de 33% frente o último fechamento).

O cenário é de cautela mas, mesmo assim, algumas notícias mostram que o ambiente de longo prazo é de investimentos fortes para o setor, em boa parte em decorrência da aprovação do novo marco legal do saneamento. Na última sexta-feira, em 28 de maio, foi lançado o edital de um novo projeto de saneamento básico no Amapá. A concessão engloba o atendimento de 16 municípios, mais de 90% da população do estado e deverá trazer investimentos da ordem de R$ 3 bilhões para o setor.

A concessão terá prazo de 35 anos. A universalização dos serviços de água deverá, por exigência do contrato, ocorrer em até no máximo 11 anos. “A notícia é positiva uma vez que se projeta a entrada de forte investimento para o projeto de universalização dos serviços de água e esgoto”, avalia a Levante Ideias de Investimentos. Assim, apesar dos sinais contraditórios no curto prazo, a expectativa é de fortes aportes no setor.

Cabe destacar que, no final de abril, o leilão da Cedae, maior concessão de saneamento do Brasil, arrecadou R$ 22,7 bilhões e superou projeções – e mais certames do gênero estão no radar. E, além do Amapá, quatro novos leilões estão no radar do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para serem realizados até o primeiro semestre do ano que vem.

(com Estadão Conteúdo e Agência Brasil)

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