Conflito Israel-Hamas vai “escalar”? O papel dos principais atores geopolíticos e como isso afeta o petróleo

Após conversa com professor Hagai M. Segal, da Universidade de Nova York, Bradesco BBI destacou cenários para o conflito

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A escalada do conflito Israel-Hamas segue no radar do mercado, levando a um novo avanço do petróleo brent, com o contrato futuro do brent avançando mais de 1% e batendo os US$ 93 o barril na manhã desta sexta-feira (20).

Nos últimos dias, o ataque (com autoria ainda não identificada, levando a trocas de acusações) a um hospital de Gaza esta semana e uma invasão terrestre prevista por tropas israelenses aumentaram os receios de que o conflito se espalhe no Médio Oriente.

Neste cenário de forte instabilidade geopolítica, analistas se atentam sobre as variáveis do conflito, os países que possuem grande poder de influência e o impacto no mercado.

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Desta forma, na véspera, Vicente Falanga e Gustavo Sadka, analistas do Bradesco BBI, destacaram as principais conclusões de uma conversa que tiveram na véspera com o professor Hagai M. Segal, da Universidade de Nova York, consultor respeitado em geopolítica e temas sobre Oriente Médio, para discutir o conflito entre Israel e o Hamas.

“Segal forneceu informações importantes para compreender melhor o que está em jogo para cada país e impacto no conflito”, avaliaram os analistas.

Além disso, ele apresentou diferentes cenários para uma potencial escalada ou um potencial alívio nos conflitos, cenários estes listados a seguir:

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Quais são os riscos e as posições ocupadas pelos principais atores do conflito?

Israel – O professor aponta que o país precisa mostrar uma resposta militar forte contra o Hamas para compensar a impressão de que não conseguiu proteger as suas fronteiras. Aproximadamente 90% dos israelenses acreditam que o governo falhou em termos de inteligência militar, pois havia vários sinais de que este ataque poderia acontecer, especialmente tendo em conta o 50º aniversário da guerra do Yom Kippur.

Irã – O país pretende há algum tempo consolidar a sua hegemonia política/econômica na região do Oriente Médio. Neste sentido, ajudar a provocar um conflito com Israel poderá atrasar as negociações de paz entre a Arábia Saudita e Israel. Ao mesmo tempo, parece haver alguma vontade interna de minimizar o envolvimento direto do Irã nos ataques do Hamas, uma vez que uma escalada poderia ser custosa para o país, que não está numa situação financeira sólida.

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EUA – O envolvimento direto dos EUA na guerra (apoiado pela visita do Presidente dos EUA, Joe Biden, bem como pelo envio de um navio de guerra para a região) mostra que Washington não quer que o conflito se agrave. Os EUA querem que Israel lide com a invasão da forma mais “humanitária” possível, deixando bastante tempo para os civis fugirem do norte de Gaza. Além disso, a gestão Biden quer que Israel reserve algum tempo para pensar num plano de recuperação para Gaza e evite cometer erros semelhantes por parte dos EUA nas suas invasões pós-11 de Setembro. Um plano de recuperação cuidadosamente elaborado será um elemento-chave na manutenção da paz com o mundo árabe a longo prazo. Na verdade, o envolvimento dos Estados árabes na reconstrução de Gaza poderia ajudar a reforçar esta paz a longo prazo, avalia o especialista.

Arábia Saudita – Embora os sauditas provavelmente ainda queiram reabrir acordos diplomáticos com Israel a longo prazo, o acordo recente será suspenso pelo menos a curto prazo, dado o apoio histórico dos sauditas aos palestinos. A longo prazo, a possibilidade de o acordo regressar à mesa dependerá, em última análise, da forma como Israel lidar com o conflito em Gaza. É por esta razão que garantir uma abordagem “humanitária” à crise é fundamental e o envolvimento dos países árabes na reconstrução de Gaza será necessário.

Rússia – A Rússia provavelmente obterá alguma vantagem com o conflito Israel/Hamas, uma vez que a guerra enfraquece potencialmente a frente ucraniana. O presidente da Ucrânia Volodymyr Zelensky demonstrou preocupação clara com a possibilidade de um apoio mais fraco. Vale a pena notar que parece não haver provas de que a Rússia tenha estado diretamente envolvida no ataque do Hamas.

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China – Sobrecarregar os EUA com dois grandes conflitos (a guerra Rússia-Ucrânia e agora um conflito no Oriente Médio) poderia forçar um resultado mal sucedido em ambas as frentes e até pressionar a opinião pública americana contra o envolvimento de Washington em conflitos internacionais. Isto poderia ajudar a preparar o caminho para a China aumentar a sua influência sobre Taiwan a longo prazo.

Líbano – O Hezbollah, tal como o Hamas, é um grupo que prospera num ambiente de conflito e incerteza e poderá ser capaz de alargar o seu poder na região. Contudo, o Líbano como nação, após vários anos de dificuldades econômicas e conflitos, enfrenta o risco de estar à beira do colapso. Se o Hezbollah intensificar significativamente os seus ataques, isso poderia levar os EUA e Israel a coordenarem uma invasão terrestre (como no passado), o que poderia, em última análise, resultar numa mudança de governo no Líbano em direção aos maronitas e/ou aos sunitas orientados pelos sauditas e pelos EUA. Portanto, poderia reduzir significativamente a influência que o Irã tem no país. Como resultado, uma escalada excessiva de ataques por parte do Hezbollah pode não ser do interesse do Irã.

Qual seria um caminho de escalada da guerra?

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Uma escalada seria provavelmente provocada por um ataque iraniano em múltiplas frentes através de vários países como o Líbano, a Síria, o Iraque e o Iêmen. Isto poderia desencadear uma reação de Israel para atacar instalações nucleares dentro do Irã (algo que sempre foi considerado por Israel no passado, para evitar o enriquecimento nuclear que poderia resultar em armas de destruição maciça).

“Dito isto, os benefícios de o Irã provocar uma guerra multifrontal não são óbvios, pois poderia ser muito custoso para o país, podendo ser um ‘tiro pela culatra’ e resultar na perda de influência em regiões satélites como o Líbano, bem como graves perdas econômicas para o país”, destaca o BBI.

Qual seria um caminho para a “desescalada” da guerra?

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De acordo com o professor Segal, a desescalada ocorreria se o Irã permanecer à margem, principalmente como espectador de ataques isolados. A entrada de Israel em Gaza respeitando as diretrizes “humanitárias” (apoiadas pelos EUA), com a faixa permanecendo militarizada até que uma autoridade palestiniana mais forte recupere o controle e Israel apele a outros países árabes para que ajudem nas ações de pacificação na região também estaria no cenário.

Estes países poderiam fornecer informações e apoio essenciais para ajudar a evitar que o Hamas recupere influência na região e também poderiam evitar a impressão de que se tratava de uma ocupação por parte dos israelenses.

Os EUA também teriam um papel fundamental a desempenhar, avalia o professor, a fim de manter a paz a longo prazo, e precisariam reforçar as sanções.

Os ataques do Hamas parecem ser mais um dado que mostra que o financiamento do Irã acabou por resultar em conflitos na região.

Tanto Israel como a Arábia Saudita esperam que os EUA reconheçam o erro que cometeram quando permitiram alguma flexibilidade nas sanções iranianas. Se as sanções não forem reintroduzidas, Israel poderá eventualmente atingir as instalações nucleares do Irã, embora este seja um risco de cauda neste momento. Isso porque tal ataque provavelmente desencadearia uma guerra entre as nações, o que não é do interesse de Israel e muito menos do interesse dos EUA, avalia o professor.

Conclusões do banco e impactos no mercado

Levando todos esses pontos em conta, o BBI avalia que o ataque a Israel por parte do Hamas parece ter cumprido o seu objetivo de atrasar um acordo entre a Arábia Saudita e Israel, enquanto os benefícios de uma guerra totalmente ampliada para o Irã não são óbvios, o que limitaria uma escalada do conflito.

“Dito isto, assim que Israel iniciar a sua invasão terrestre em Gaza, a probabilidade de o Hezbollah intensificar ações contra Israel e de milícias pró-Irã levarem a cabo ações ocasionais contra alvos dos EUA e do Ocidente, como na Síria e no Iraque, seria elevada. Isto provavelmente traria uma pressão de alta sobre os preços do petróleo. Por outro lado, também vemos que estes movimentos podem ser vistos como atos isolados a serem contidos e não resultariam numa escalada mais ampla (com ameaça às instalações de fornecimento de petróleo)”, apontam os analistas do BBI.

Ao mesmo tempo, se Israel lidar cuidadosamente com a ocupação de Gaza, com a participação do mundo árabe e de outros intervenientes relevantes, a pacificação a longo prazo na região seria mais provável.

“Com base na forma como Israel tem comunicado sobre o trágico ataque com mísseis a um hospital, parece que transmitir uma abordagem cuidadosa sobre a ocupação é um aspecto importante”, complementa o banco.

Finalmente, a reintrodução de sanções ao Irã parece altamente provável, na opinião do banco. A prova disso é de que os EUA já estão a tentar encontrar formas de substituir estes barris através de acordos com a Venezuela. Estas sanções ao Irã retirariam mais barris de um mercado já com uma suboferta, o que forçaria os sauditas a reduzir os cortes de produção em meio à pressão ascendente sobre os preços do petróleo.

Sobre o ponto do alívio das sanções contra a Venezuela, com novos acordos anunciados na véspera, Paulo Gitz, estrategista global do Research da XP, destacou ao InfoMoney que a produção da Venezuela atualmente é pequena.

Com cerca de 800 mil barris por dia, está muito distante dos mais de 3 milhões que já produziu no final dos anos 90.

“Sem as sanções, esse número deve aumentar, mas deve demorar alguns meses para que os investimentos amadureçam. O impacto no curto prazo deve ser pequeno, pois haverá apenas uma troca de comprador (sai China, entra EUA) para a produção atual. Conforme essa produção aumente, aí sim poderá fazer mais preço. Entretanto, é importante lembrar que a Venezuela é membro da Opep e deveria se sujeitar às restrições e quotas impostas pelo grupo”, avalia.

A percepção de que, após anos de baixo investimento no país latino-americano, a capacidade de produção fique aquém do esperado, se refletiu na cotação do petróleo na véspera. A commodity chegou a cair na manhã de ontem com o anúncio de alívio nas sanções pelos EUA contra a Venezuela, mas voltou a subir com o conflito Israel-Hamas voltando para o foco.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.