Como construir um Twitter descentralizado

A rede social será moldada por estatutos, regulamentos e normas existentes – e pode ser limitada por sua tecnologia

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Twitter

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*Por Preston J. Byrne

A compra do Twitter pelo CEO da Tesla, Elon Musk, ressuscitou discussões antigas no “criptoverso” sobre uma nova categoria de produto: “mídia social descentralizada”.

Assim como o Bitcoin (BTC) é dinheiro resistente à censura, a teoria diz que também podemos usar a infraestrutura das criptomoedas para executar aplicativos de mídia social resistentes à censura! Embora criar um app de social media seja trivialmente fácil, administrar um negócio bem-sucedido nessa área é extraordinariamente difícil.

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E digo isso com propriedade: em 2014, eu, Casey Kuhlman (CEO da Monax) e Tyler Jackson (matemático quântico) propusemos uma DAO (sigla em inglês organização autônoma descentralizada) chamada “Eris”, que era basicamente uma versão distribuída do Reddit que poderia rodar em uma blockchain – na rede Ethereum (ETH), para ser mais preciso. Esse projeto falhou por várias razões – até porque em 2014 o mercado não conseguia distinguir entre um contrato inteligente e ideias sem muito fundamento.

Os problemas com as tentativas de “descentralizar o Facebook” são tecnológicos e legais. Por um lado, os aplicativos descentralizados raramente são dimensionados. O Facebook gera mais de 4 petabytes de dados por dia. Isso é simplesmente muita informação para qualquer número sério de “nós” (computadores ligados a uma blockchain). Mesmo plataformas federadas como o Mastodon (rede social semelhante ao Twitter), que andam na linha entre o Bitcoin descentralizado e o Facebook centralizado, encontram gargalos.

Blockchains resolvem o problema de censura nas bordas, mas provavelmente são muito sobrecarregadas e redundantes para gerenciar plataformas de comunicação globais massivas. Da mesma forma, é essencial poder excluir posts – dos insanos aos impetuosos – de plataformas como o Twitter.

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Onde as coisas ficam realmente confusas, no entanto, é no encontro entre a tecnologia e a lei. A mídia social descentralizada provavelmente é possível, mas a forma que ela assume será moldada pelos estatutos, regulamentos e normas existentes.

As empresas de mídia social, como se sabe, estão sujeitas a uma série de regulamentações. Essas regras regem a destruição e a denúncia de conteúdo ilegal, questões de direitos autorais, proteção de dados e divulgação obrigatória de registros de assinantes, entre outras coisas. A legislação também varia de país para país. Todos esses fatores precisam ser considerados no design de qualquer aplicativo de mídia social descentralizado.

Conteúdo ilegal

Um obstáculo para aplicativos descentralizados é o problema do “material ilegal”.

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Nos Estados Unidos, no Brasil e em todo o mundo, um tipo de conteúdo ilegal encontrado é aquele que envolve abuso sexual infantil. Apesar de as penalidades por hospedar conscientemente esse tipo de material serem extremas, variando de multas pesadas a longas penas de prisão, a resposta da indústria de criptomoedas a esse problema antigo da internet tem sido ignorá-lo completamente.

Reddit, Twitter e Facebook, que hospedam o conteúdo do usuário, adotam uma abordagem proativa para eliminar esses conteúdos. Nos EUA, por exemplo, a lei federal exige que “provedores de serviços de comunicação eletrônica” – provavelmente incluindo operadores de nós de blockchain e provedores de serviços tradicionais e centralizados – removam as imagens e vídeos, guardem com segurança por 90 dias e depois destruam tudo.

No exterior, onde não existe a Primeira Emenda (parte da Declaração dos Direitos dos Estados Unidos), existem categorias ainda mais amplas de “conteúdo ilegal”. Alguns exemplos são a lei alemã Netzwerkdurchsetzungsgesetz, ou “NetzDG”, que exige que os operadores de serviços de mídia social se registrem no governo e, após atingir uma certa escala, cumpram as solicitações de remoção; a lei francesa número “2020-766”, que impõe multas para quem não remover material ilegal, incluindo conteúdo “terrorista”, dentro de uma hora após a postagem; ou a Seção 5 da Lei de Difamação do Reino Unido, de 2013, que possui um procedimento de notificação e remoção para suposta difamação semelhante à lei dos direitos autorias dos EUA.

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Enquanto plataformas como Reddit e Facebook são muito responsivas a todas as solicitações e requisitos acima, serviços baseados em blockchain, como StorJ ou Sia, que eu saiba, não têm esses controles. Eles permitem o armazenamento de dados criptografados sem a criação de um registro de assinante ou os meios para o provedor de serviços – neste caso, o operador do nó – verificar quais dados estão sendo armazenados.

É provável que os serviços de armazenamento de dados descentralizados estejam sendo usados atualmente para hospedar conteúdo ilegal, provavelmente sem o conhecimento do operador do nó que o hospeda. Esse nível de cegueira intencional não seria uma boa ideia para um aplicativo de mídia social “descentralizado”, que deve ser projetado de tal forma que um usuário cumpridor da lei possa participar da rede e estar seguro de que não está violando a lei local.

Até agora, nenhuma solução blockchain com um componente de armazenamento tenta resolver esse problema. Isso ocorre porque ninguém executará um nó para um serviço descentralizado se existir risco de ir para a prisão por fazer isso.

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Propriedade intelectual

Da mesma forma, nosso regime de propriedade intelectual não é adequado para a descentralização.

Os operadores de nós de mídia social – sendo entidades “que oferecem a transmissão, roteamento ou fornecimento de conexões para comunicações digitais online … de material de escolha do usuário, sem modificação do conteúdo do material enviado ou recebido” – são “prestadores de serviços”, conforme as lei de direitos autoriais dos EUA.

Portanto, eles precisam considerar sua própria exposição por hospedar material que possa dar origem a uma reivindicação de violação de direitos autorais. No mínimo, resolver esse problema exigirá uma implementação descentralizada do procedimento de notificação e remoção do materiais protegidos para qualquer conteúdo de terceiros hospedado em um nó.

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Também é possível que “trolls de direitos autorais” – empresas de advocacia que adquirem diversos direitos e processam “supostos” infratores de suas propriedades intelectuais – destruam os operadores de nós em repetidas tentativas de má-fé de extorquir pequenos acordos em dólares. Isso pode resultar em aplicativos descentralizados que não suportam imagens ou vídeos – visto que são os tipos de materiais protegidos mais frequentemente usados por escritórios de advocacia mal-intencionados.

É difícil especular que tipo de infrações e repressão alguém pode encontrar em um meio de comunicação que ainda não existe. A julgar pelo que vemos na Web 2.0, no entanto, a presença de trolls de direitos autorais na Web 3.0 é uma certeza virtual assim que se tornar lucrativo para eles estarem lá.

Proteção e divulgação de dados

Uma outra questão surge quando consideramos que uma pessoa participante de uma rede descentralizada pode, durante a operação de seu nó, adquirir grandes quantidades de dados de assinantes.

Nos EUA, os operadores de nós podem ser vistos como “prestadores de um serviço de comunicação eletrônica” para fins legais e, portanto, podem ser obrigados a entregar registros de seus computadores ao governo sem um mandado – pelo menos, na medida em que esses registros pertencem a terceiros que estão sob a posse e controle de um operador de nó.

É improvável que os usuários desejem administrar uma rede que tenha esse grau de intrusão em suas vidas pessoais. Os aplicativos precisarão ser projetados para que mantenham o mínimo possível de dados de terceiros em seus nós.

O design de uma mídia social descentralizada

Todos os problemas identificados acima compartilham um fator em comum: a mídia social requer um grau de censura e exclusão – não imutáveis conjuntos de informações compartilhados globalmente. A tecnologia descentralizada como o Bitcoin é projetada de forma a tornar a exclusão impossível ou proibitivamente cara. Um Twitter descentralizado não será, portanto, parecido com o BTC.

A necessidade de remoção e moderação de conteúdo – seja por responsabilidade criminal, responsabilidade civil ou simples usabilidade – será o fator mais importante no design de qualquer sistema de mídia social descentralizado. No mínimo, a centralidade da moderação de conteúdo para a experiência do usuário de mídia social significa simplesmente despejar tudo na blockchain, como faz a Bitclout (rede social de código aberto.), e então replicar em cada nó da rede. Mas acho que apenas isso não vai funcionar.

Meu palpite é que o primeiro sistema de mídia social “descentralizado” verdadeiramente bem-sucedido não tentará ser super moderninho, mas sim fará com que seus usuários repliquem as informações viáveis mínimas absolutas necessárias para que a rede funcione. A parte da “blockchain”, se houver, deve ser relegada a fornecer um registro de nomes de usuários e chaves públicas associadas.

Provavelmente também limitará os tipos de dados que os usuários hospedam em texto simples, na maioria das vezes. Essa é uma proposta de baixa responsabilidade do ponto de vista da lei criminal, de direitos autorais e de proteção de dados. Também é muito mais leve em largura de banda e será mais fácil de transmitir ponto a ponto.

A hospedagem de vídeo e imagem, simplesmente devido à grande quantidade de dados envolvidos, provavelmente será terceirizada de qualquer maneira, tanto quanto é agora. Existem muitas plataformas de terceiros (Bitchute, Cozy, Odysee) que têm políticas de moderação de conteúdo frouxas, mas não inexistentes, para conteúdo de vídeo. Isso poderia suprir a lacuna no mercado atualmente atendido por empresas como o YouTube.

Tudo o que um sistema de mídia social descentralizado precisaria fazer para entregar esse conteúdo é não bloquear links para esses serviços.

A moderação que existe depende dos usuários – eles podem controlar o conteúdo que eles veem operando sua própria lista de permissões/lista negra de provedores de conteúdo de terceiros. O sistema descentralizado se tornaria apenas mais uma fonte de tráfego de referência para esses sites.

Posso estar errado, claro. Algum prodígio em algum lugar poderia, enquanto falamos, estar escrevendo um post com 6 mil palavras com uma proposta de mídia social descentralizada que resolverá todos os problemas de dimensionamento por mágica. Meu palpite, no entanto, é que as respostas mais simples são mais prováveis de serem as corretas. “Mídia social descentralizada” provavelmente será mais parecida com um RSS (forma simplificada de apresentar notícias) do que com a rede Ethereum.

Embora este esboço descreva uma solução imperfeita para o debate sobre a censura, uma solução imperfeita pode, no entanto, ser suficiente. A maior parte da “censura” politicamente motivada que ocorre no Twitter e no Facebook não é de imagens e vídeos, mas sim de links para sites de terceiros, formas equivocadas de expressão de pensamento e das próprias identidades digitais.

Uma solução para o problema da censura provavelmente precisa garantir principalmente que o texto, os links e a identidade não sejam censuráveis – com o texto e os links sendo auto hospedados, e a identidade imutável. Se enquadrarmos o problema nesse conjunto limitado de questões, acho que uma versão utilizável do Twitter descentralizado é alcançável em um futuro muito próximo.

*Preston Byrne é colunista do CoinDesk e sócio do escritório de advocacia Anderson Kill.

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