Como a CVM pode destravar um mercado de R$ 1,6 trilhão para criptomoedas no Brasil

Definição de uma regulação cripto no país pode ajudar que diversos fundos passem a investir na classe de ativos

Rodrigo Tolotti

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O investidor que quer se expor ao mercado de criptomoedas, mas que não quer comprar os ativos diretamente, já conta com diversas opções na Bolsa entre fundos tradicionais e ETFs, mas esse ainda é um mercado pequeno perto do potencial que tem.

Desde 2018, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) estabeleceu normas para permitir que gestoras brasileiras criassem produtos com exposição ao mercado cripto, levando hoje à existência de mais de 20 fundos que investem nesse mercado.

Pelas regras, as gestoras só podem investir indiretamente em criptomoedas, no exterior e em instituições regulamentas. Além disso, para fundos voltados para o investidor de varejo, a exposição máxima é de 20% em cripto (sendo os outros 80% em títulos de renda fixa), enquanto apenas para investidores qualificados (com mais de R$ 1 milhão investidos) e profissionais (com mais de R$ 10 milhões) podem acessar produtos com até 100% de exposição em cripto.

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Para Guilherme Rebane, head para América Latina da OSL, conforme os investidores forem se interessando cada vez mais por essa classe de ativos, gestores e instituições financeiras vão querer ter acesso também ao mercado cripto. E, apesar de isso já ser uma realidade, ainda haveria muito espaço para crescer.

“Estamos falando de clientes que acessam o mercado de capitais, e sabemos que boa parte da alocação hoje está via fundos de investimento”, explica Rebane. “E quando falamos de fundo, o que temos hoje que oferece alocação a várias classes de ativos? Fundos multimercados“.

Atualmente, a maioria dos fundos cripto já estão dentro da categoria de fundos multimercados, mas esse é um segmento que hoje no Brasil tem R$ 1,615 trilhão alocados, segundo dados de setembro da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). E a fatia que está exposta a criptos ainda é muito pequena.

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“Eu acho que vamos ter um movimento que vai criar um apetite para que esse pessoal que faz gestão para classes dos fundos multimercados olharem em algum momento, como sabemos que já olham, e pensarem ‘eu preciso ter [exposição]. Se vai ser 0,1% ou 10%, vai depender do apetite de risco do gestor e do enquadramento daquele fundo pra volatilidade que ele vai querer adicionar naquele produto”, avalia o executivo da OSL.

Como valem R$ 1,6 trilhão, os fundos multimercados poderiam trazer altas cifras ao setor mesmo que apenas uma pequena parcela ganhe exposição aos criptoativos.

“Se a gente pensar que 10% de todo esse universo multimercado falar ‘vamos colocar cripto na carteira’, estamos falando de R$ 150 bilhões. E mesmo se a gente entender que, desse valor, pelo menos 1% invista, já estamos falando de R$ 1,5 bilhão”, avalia Rebane. “Não dá para achar que todo o R$ 1,6 trilhão de multimercado vai ter um pouco de alocação, mas se pensar numa fração mínima, 1% ou 2%, já é uma quantia relevante”.

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Regulação tem papel chave

E mesmo que a CVM tenha criado normas para permitir exposição a esse mercado, é exatamente a falta de uma regulação mais ampla que tem evitado que diversos outros fundos façam aportes em criptoativos.

Segundo Nicole Dyskant, chefe global do jurídico da Hashdex, foi a falta de uma regulação e escolha de uma autoridade competente de supervisão no Brasil que levou a CVM a adotar, em 2018, a visão de que os fundos precisam investir de forma indireta e no exterior quando quiserem se expor às criptos.

“Além disso, as exchanges nacionais, embora possam voluntariamente adotar controles de Conheça seu Cliente (KYC, na sigla em inglês) e prevenção à lavagem de dinheiro, ainda não possuem esta obrigação legal, nem tampouco de supervisão de que o fazem quando assim o divulgam. Falta também qualquer penalidade por descumprimentos destas regras e controles”, explica Nicole.

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Recentemente, a CVM divulgou o aguardado parecer de orientação sobre o mercado cripto, uma forma de tentar ajudar a guiar os players que atuam na área enquanto o Congresso não vota o projeto de lei que regula o setor. Mesmo assim, o documento não trouxe novidades quanto à atuação dos fundos, mantendo o entendimento de investimento indireto no exterior.

Segundo Nicole, mesmo que ainda existam outras tecnicidades e regras que terão de ser estabelecidas, a aprovação de um marco regulatório das criptos poderia ajudar a superar a questão da regulação das exchanges e controles de prevenção à lavagem de dinheiro.

Por outro lado, diz Rebane, até mesmo uma regulação simples já ajudará os gestores de fundos a entrarem mais no mercado.

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“A partir do momento que houver alguma regulação, por mais soft que seja, isso vai dar uma maior visibilidade para esses players, que são as gestoras, entenderem até onde podem ir ou não e quanto podem ou não podem fazer com a classe de ativos”, conclui.

Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.