Cielo: desafios cada vez maiores se refletem em balanço pouco inspirador e reforçam ceticismo; ações caem 3%

Apesar do progresso em algumas linhas do balanço e do valuation considerado atrativo a princípio, analistas veem cenário macro e concorrência como desafios

Lara Rizério

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SÃO PAULO – Pouco inspiradores e com sinais de uma estrada tortuosa pela frente, ainda que apresentando alguns dados positivos. Assim que os analistas de mercado projetaram o futuro da Cielo (CIEL3) após o resultado do primeiro trimestre de 2021, divulgado na noite da última terça-feira (27). Os dados, por sinal, levaram a uma queda expressiva dos papéis: CIEL3 fechou em baixa de 3,29%, a R$ 3,53, acumulando perdas de 11,54% em 2021, ante alta de 1,71% do Ibovespa no mesmo período.

A administradora de maquininhas divulgou lucro líquido de R$ 241,3 milhões para o primeiro trimestre, crescimento de 44,6% na comparação com o mesmo período do ano passado.

Por outro lado, excluindo efeitos não recorrentes, a Cielo teve lucro líquido de R$ 135,8 milhões no primeiro trimestre, quedas de 54,5% sobre o período de outubro a dezembro do ano passado e de 18,6% ante o primeiro trimestre de 2020.

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Já a receita líquida de R$ 2,72 bilhões entre janeiro e o fim de março, queda de 9,9% na comparação com o quarto trimestre de 2020 e recuo de 3,8% na relação anual. A receita com aquisição de recebíveis e Fidc consolidada somou R$ 95,8 milhões, expansão de 17,5% na base trimestral, mas com recuo de quase 50% sobre os três primeiros meses de 2020.

O resultado foi impactado negativamente tanto por volumes quanto por margem, destacam Marcel Campos e Matheus Odaguil, analistas da XP. Os volumes vieram abaixo do esperado, uma vez que o Volume Total de Pagamentos (TPV, na sigla em inglês) da empresa não se recuperou no trimestre, enquanto as margens também não ajudaram (margem líquida de 0,73% versus 0,78% no primeiro trimestre de 2020). No geral, 2021 começou com um declínio de 20% no lucro recorrente em relação ao ano anterior.

Neste sentido, de acordo com o Credit Suisse, a menor lucratividade em termos recorrentes continua sendo uma preocupação para os próximos trimestres. Desta forma, os analistas seguem mantendo uma visão cautelosa com a companhia.

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“Em nossa opinião, os resultados do trimestre implicam em risco de queda para nossas estimativas de lucro líquido e consenso para 2021, uma vez que tanto a Cielo Brasil quanto a Cateno relataram resultados pouco inspiradores. Portanto, mantemos uma visão cautelosa sobre as ações CIEL3 por enquanto. Se anualizássemos o lucro líquido do trimestre como um proxy para o ano inteiro, veríamos a Cielo sendo negociada a um múltiplo de preço sobre o lucro de 19 vezes, o que não parece atrativo tendo em vista os desafios operacionais”, avaliam.

O Morgan Stanley destaca que o lucro líquido recorrente da Cielo ficou 33% abaixo de sua estimativa e 28% abaixo do consenso.

Para os analistas, os volumes de transações abaixo do consenso, aliados à notícia de que Fiserv e a Caixa Econômica Federal estão negociando parceria para serviços de adquirência, devem colocar as ações sob pressão, em meio aos sinais de maior concorrência.

O Bradesco BBI ressaltou que os destaques negativos foram o desempenho fraco da Cateno e perdas ainda relevantes na Merchant e-Solutions, operação nos EUA e outras subsidiárias.

Porém, para os analistas do BBI, olhando atentamente, os números não são tão ruins quanto parecem.
O desempenho das atividades centrais de adquirência da companhia continua melhorando, mas aos poucos, ainda mais levando em conta o cenário macroeconômico, que segue desafiador.

O ponto positivo fica para os custos, pois a Cielo segue ganhando eficiência na operação, segundo a avaliação da XP.

O custo dos serviços prestados da empresa caiu 6% na base anual, para R$ 760 milhões, enquanto as despesas operacionais caíram 48% na base anual, para R$ 154 milhões. “Como esperamos que os volumes se recuperem nos últimos trimestres de 2021, acreditamos que a lucratividade da Cielo deve melhorar com custos mais baixos e receitas mais altas”, avaliam os analistas da XP.

Desafios estruturais se somam à economia fraca

Apesar do resultado mostrar uma trajetória de melhora, a Cielo ainda continua com desafios estruturais ao seu modelo de negócios, aponta a Levante Ideias de Investimentos.

A adquirente vem apresentando uma trajetória de queda de lucros nos últimos três anos, devido a um aumento na competitividade do setor de pagamentos e a dificuldade da companhia em adaptar seu modelo de negócios.

“Apesar de líder, a Cielo vem perdendo consistentemente participação no mercado. Para conseguir se manter competitiva a companhia teve de ajustar seus preços para baixo sucessivamente nos últimos anos, a receita extraída por volume transacionado, que chegou a 1,17% no primeiro trimestre de 2017 caiu para 0,73% neste trimestre”, avaliam os analistas da casa de research.

O ambiente para o setor de pagamentos é marcado por uma redução das taxas praticadas, tendência vista no mundo inteiro e que é intensificada no Brasil devido a um aumento de concorrência e maior digitalização do mercado.

“Enquanto concorrentes como a Stone (STNE, negociada na Nasdaq) são capazes de se diversificar oferecendo produtos bancários e soluções de software aos lojistas, a Cielo não consegue seguir a mesma linha pois tem como principais acionistas o Banco do Brasil e o Bradesco, o que torna essa opção prejudicial aos controladores da companhia”, avaliam os analistas da Levante.

Enquanto isso, apontam, players não tradicionais também criam soluções de pagamentos, pulverizando ainda mais o mercado. Entre eles, o Magazine Luiza (MGLU3) que já oferece serviços de pagamentos e créditos para seus clientes.

“Uma possível resolução quanto aos problemas de controle da companhia, com um deles vendendo sua fatia, e um reaquecimento da economia mais acelerado devido a aceleração no ritmo de vacinação são os principais catalisadores para a companhia no curto prazo”, destacam.

Já o Bradesco BBI aponta que, dependendo das tendências macroeconômicas de curto prazo, a Cielo pode se beneficiar de uma estrutura mais enxuta e gastos mais normalizados da Cateno. Os analistas veem a ação a patamares atrativos: uma valorização maior, contudo, depende de certos eventos corporativos, como a venda da Merchant e-Solutions, provedora americana para soluções de pagamentos.

O BBI mantém recomendação neutra para a Cielo, com preço-alvo de R$ 5. A recomendação neutra, por sinal, é da maior parte das casas de análise que cobrem a ação, segundo informações da Refinitiv: nove casas se posicionam desta maneira com relação aos ativos, enquanto três recomendam venda e apenas duas recomendam compra. O preço-alvo médio, por sua vez, é de R$ 4,59, um valor 25,75% acima do fechamento da véspera.

Desta forma, em meio a um cenário de aumento da concorrência associado ao cenário macroeconômico ainda bastante desafiador, mesmo vendo progressos, os analistas seguem bastante céticos com os ativos da companhia.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.