Casas Bahia: as fraquezas em meio ao turnaround que fizeram BHIA3 cair 9% pós-balanço

Analistas destacam continuidade do plano de reestruturação e melhora de margens, mas ainda veem ações da companhia com cautela

Lara Rizério

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Mais um resultado fraco e poluído em meio à continuidade de seu plano de reestruturação marcou o Grupo Casas Bahia (BHIA3), que teve prejuízo contábil de R$ 1 bilhão no 4º trimestre de 2023 (4T23), o maior da história, superando o recorde apurado no último trimestre de 2019, quando a perda foi de R$ 875 milhões.

O plano dá sinais de melhores dias para a companhia, mas o cenário segue desafiador. O fluxo de caixa livre da Casas Bahia foi positivo em R$ 721 milhões no período, desempenho que a companhia atribuiu à execução do seu plano de reestruturação para melhora da performance de caixa. No ano, a geração de caixa foi de R$ 648 milhões. Com isso, após o resultado, as ações tiveram um dia inteiro de pregão em queda, fechando em baixa de 9,09%, a R$ 6.

A Casas Bahia anunciou no início do segundo semestre de 2023 um plano de reestruturação para 2025, que já levou à demissão de mais de 8 mil funcionários, ao fechamento de 55 lojas com desempenho abaixo do esperado, à redução de mais de R$ 1 bilhão em estoques e à migração da venda de 23 subcategorias de produtos com margens negativas para o marketplace da companhia.

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A reestruturação continua, mas os números do 4T23 ainda foram considerados fracos. Como destaca o JPMorgan, os números foram afetados por uma demanda ainda fraca, mas também pela execução do plano de reestruturação e simplificação de sua estrutura que adicionou volatilidade às vendas e à lucratividade, que se somou “a uma base já poluída do ano passado”.

“Neste contexto, acreditamos que o foco do mercado está na execução do plano de turnaround e não nos resultados, e a empresa trouxe em comunicado uma atualização detalhada sobre as diferentes iniciativas. Ainda assim, em nossas estimativas, a empresa queimou cerca de R$ 530 milhões de caixa trimestralmente ao excluir a venda de créditos fiscais, que atingiu um valor líquido de R$ 682 milhões no trimestre”, apontam os analistas do JPMorgan.

Para a XP, a varejista apresentou resultados fracos no 4T23, com a fraca conjuntura macroeconômica e as bases de comparações difíceis afetando a receita líquida consolidada, enquanto as iniciativas de reestruturação prejudicaram a rentabilidade. O GMV (Gross Merchandise Volume, ou volume bruto de mercadorias) total diminuiu 12% em relação ao ano anterior, impactado pelo cenário macroeconômico ainda desafiador, pela base de comparação difícil da Copa do Mundo e pelo encerramento de 55 lojas em 2023, aponta a equipe de análise. Como resultado, o GMV de lojas físicas diminuiu 7%, enquanto o GMV online diminuiu 22% (1P, ou estoque próprio, caindo 23% e o 3P em baixa de 6%).

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A rentabilidade foi destacada pela XP como o ponto fraco dos resultados, ainda fortemente afetada pelos custos de reestruturação. A margem bruta (não ajustada pela atividade promocional) diminuiu 1,70 ponto percentual (p.p.) na base anual, afetada pela estratégia comercial mais agressiva da empresa no trimestre, resultante do foco da gestão na redução dos níveis de estoque. Já a margem Ebitda (Ebitda = lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações dividida pela receita) ajustada diminuiu 4,90 p.p trimestralmente, devido à desalavancagem operacional, que mais do que compensou os esforços de otimização das despesas de vendas, gerais e administrativas (SG&A).

A XP destaca que o prejuízo bilionário ocorreu pelo impacto da elevada alavancagem financeira e custos de reestruturação não recorrentes relacionados com i) encerramento de lojas, ii) otimização do número de colaboradores e iii) provisão relacionada com o DIFAL.

A XP ressalta a projeção da varejista de que a margem bruta deve retornar aos níveis normalizados após a redução de estoques no quarto trimestre e que a empresa continua avançando em seu plano de transformação, trabalhando em gestão de passivos para postergar R$ 1,5 bilhão em dívidas para 2027; monetização de créditos fiscais, com R$1,3 bilhão reconhecido em 2023 e otimização de categorias online, com 23 subcategorias migradas do 1P para 3P.

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À medida que a empresa avança em seu plano de transformação, os números do 4T23 ainda permanecem sob pressão, ressalta o Bradesco BBI. Durante a segunda metade de 2023, a nova gestão iniciou – conforme prometido em agosto – diversas iniciativas buscando rentabilidade/recuperação de fluxo de caixa, que são perceptíveis nos números do 4T23: isso inclui redução de pessoal, redução de estoques, monetização de ativos fiscais, racionalização do capex e fechamentos de lojas não lucrativas. “A caminho de 2024, esperamos que a maior parte da pressão do plano de transformação tenha ficado para trás e que vejamos tais iniciativas dando frutos, com as margens operacionais aproximando-se gradualmente de níveis mais normalizados”, apontam os analistas do BBI.

A Genial Investimentos, por sua vez, ressalta que, mesmo já sendo um dos sell-sides mais pessimistas em relação aos números esperados para o período, ainda assim foi negativamente surpreendida por maiores despesas de reestruturação – o que culminou em um prejuízo 42,2% acima de sua estimativa.

“Apesar de, por um lado, a margem bruta nos surpreender positivamente – dado o menor impacto da redução de estoques em relação ao esperado –, Ebit, despesas financeiras e lucro líquido se consolidaram bem aquém de nossas estimativas”, avalia a casa de análise.

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O Goldman Sachs destaca que os números foram mistos: embora a receita líquida tenha ficado 5% abaixo do consenso Bloomberg e 7% abaixo da projeção do banco, o Ebitda ajustado surpreendeu positivamente devido à margem bruta ajustada melhor do que o esperado. “Acreditamos que isso foi impulsionado, pelo menos parcialmente, por um mix de vendas mais favorável, uma vez que a varejista continua a se inclinar para um sortimento mais rentável e a mudar algumas categorias de 1P para 3P. De fato, o plano de transformação continua a evoluir: a empresa fechou 17 lojas no 4T23 (atingindo 55 em 2023, de um encerramento proposto de 50 a 100 lojas com baixo desempenho) e reduziu significativamente as despesas com pessoal e os níveis de estoque (menos 32 dias face ao período homólogo)”, avalia.

Embora as iniciativas de curto prazo da gestão em torno do estoque, número de funcionários, despesas de marketing e redução da pegada devam continuar a permitir que a empresa se torne mais enxuta e mais lucrativa, o Goldman continua a acreditar que a sua capacidade financeira para investir estrategicamente e defender a participação num mercado altamente competitivo permanece limitada. O BTG Pactual também aponta estar cauteloso sobre a tese devido às perspectivas competitivas do ecommerce, aos altos custos de financiamento da Casas Bahia e à incerteza sobre a monetização de créditos fiscais, o que pode prejudicar sua capacidade de investir no crescimento de suas operações e continuar impactando sua estrutura de capital.

O Goldman Sachs e o JPMorgan possuem recomendação de venda ou equivalente, enquanto XP, Genial e o Bradesco BBI têm recomendação de manutenção ou neutra para os ativos, este último ressaltando o ainda “ambiente desafiador”.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.