BRF disputada: confira os cenários caso a Marfrig queira comprar 100% da companhia – e as dificuldades que a JBS pode impor

Especulações ganham força no mercado, agora com a possibilidade da JBS entrar no páreo pela empresa de processados; expectativa é de volatilidade para BRFS3

Lara Rizério

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SÃO PAULO – O noticiário sobre frigoríficos tem sido movimentado nas últimas semanas. Após a Marfrig (MRFG3) realizar diversas operações de aquisições de ações da BRF (BRFS3) através de opções e da compra em leilões realizados em Bolsa – no agregado, a participação pode chegar a 31,66% – nos últimos dias ganhou força a notícia de que a JBS (JBSS3) entrou na briga pelos ativos da companhia.

Na sexta-feira (11), os ativos BRFS3 chegaram a disparar 14% com a notícia do colunista Lauro Jardim, do Jornal O Globo, de que a JBS poderia comprar ações da companhia de processados. Contudo, as ações logo amenizaram, ainda que fechando com ganhos de 4% (veja mais clicando aqui). Apenas em maio, em meio às operações de compra pela Marfrig, os ativos BRFS3 subiram quase 24%.

Porém, as especulações não pararam por aí. Conforme destaca a Levante Ideias de Investimentos, num primeiro momento, a notícia divulgada não parecia fazer tanto sentido, pois hoje a JBS dificilmente teria aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para aquisição da BRF. Isso porque, ao somar a participação das marcas da Sadia e Perdigão, pertencentes a BRF, com as marcas da Seara, pertencente a JBS, a concentração de mercado seria relevante.

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Posteriormente, o Valor Econômico destacou que o BTG estaria sondando players de mercado para a realização da aquisição da BRF em conjunto com a JBS. A operação seria fatiada, diminuindo a concentração, já que não seria toda a operação que seria abocanhada pela JBS. Outra possibilidade seria adquirir as marcas da BRF e se desfazer da Seara.

Os analistas da Levante não esperam impactos relevantes nos preços das ações da JBS no curto prazo. Já as ações da BRF, enquanto as especulações sobre investidas de grandes players continuarem, devem continuar com fortes oscilações.

Para eles, contudo, a operação de fusão ainda não faria sentido, já que a JBS está investindo forte na Seara, e pretende continuar expandindo sua participação no mercado de proteínas de frango e processados através da marca. Então a possibilidade de troca parece descartada.

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Como a Marfrig adquiriu participação relevante na BRF no último mês e hoje é a maior acionista com 31% do capital total, a estratégia da JBS pode ser para dificultar a aquisição do controle da BRF por uma de suas concorrentes, ou apenas tornar essa aquisição a mais difícil possível. Olhando para a atual estrutura acionária da BRF, o free float disponível é de aproximadamente 39,55%.

Cabe destacar que a Marfrig, companhia de Marcos Molina, aplicou mais de US$ 1 bilhão para montar uma posição  na dona de Sadia e Perdigão, declarou que será um acionista passivo. A empresa vem declarando que tem o objetivo de diversificar seus investimentos no setor de proteína e que não pretende alterar o controle ou a estrutura administrativa da BRF. Além disso, disse que não busca eleger membros para a administração da empresa ou influenciar em suas atividades.

Porém, conforme destaca matéria do Valor, pouca gente acredita que essa postura se sustente no longo prazo. No curto prazo, a narrativa de investidor passivo está mais desenhada, já que a Marfrig está atrelada a determinadas condições com o JPMorgan, seu financiador na compra dos papéis.

Cenários para aquisição

Em relatório, o Bradesco BBI também apontou cenários sobre uma possível aquisição da totalidade da BRF pela Marfrig, uma vez que a empresa está perto de desencadear a “pílula de veneno” (ou poison pill – tipo de tática defensiva usada pelo conselho de administração de uma empresa contra uma aquisição) da BRF que a forçaria uma oferta para os acionistas minoritários com um prêmio.

O “poison pill”, incluído no estatuto social da BRF, determina que qualquer acionista que se torne titular de 33,33% das ações da empresa terá de divulgar este fato e lançar, em até trinta dias contados a partir da aquisição mais recente, uma oferta pública de aquisição (OPA) para todos os demais acionistas. O preço da OPA embutiria um prêmio de 40% sobre a média de preço das ações da BRF nos 120 dias anteriores e também nos trinta dias anteriores.

Leandro Fontanesi e Matheus Sleiman, analistas do BBI, destacam dois cenários hipotéticos para uma aquisição de 100% da BRF pela Marfrig.

Leia também: Quanto faturam e quais marcas têm BRF, JBS, Marfrig e Minerva? Quadro compara frigoríficos e explica preferências dos analistas

No primeiro cenário, a Marfrig paga um preço de acordo com as regras da poison pill. Isso levaria a uma queda de R$ 25 para R$ 23 do preço-alvo dos analistas para a ação da companhia, uma vez que a ação BRFS3 seria precificada a R$ 34 (acima do que os analistas veem como valor justo) mas que ainda resultaria em um potencial de valorização de 24% em relação ao fechamento de R$ 18,60 de sexta-feira das ações MRFG3. Já com o preço-alvo para a BRF iria de R$ 32 para R$ 34, ou um potencial de valorização de 17% em relação ao fechamento de 17% de sexta-feira.

“Um desafio importante aqui seria o financiamento de cerca de R$ 19 bilhões que a Marfrig teria que arcar. No entanto, por exemplo, um empréstimo-ponte poderia permitir que a Marfrig avançasse com o negócio e aproveitasse o saldo de caixa da BRF para ajudar a pagar a transação (após pagar pelos mais de 30% de participação na BRF, estimamos que a Marfrig ainda tem cerca de R$ 7 bilhões em caixa, enquanto a BRF teve caixa de R$ 9 bilhões ao final do primeiro trimestre de 2021)”, destacam os analistas.

Já a segunda hipótese é de que a Marfrig buscasse votos suficientes para remover a poison pill (ou seja, sendo necessários 50% mais um voto em uma Assembleia Geral Extraordinária.).

Fontanesi e Sleiman apontam ser incerto que tal transação poderia realmente ocorrer. No entanto, assumindo que a Marfrig lançaria oferta de compra ao preço atual da ação da BRF com a “pílula de veneno” removida, o preço-alvo para Marfrig iria para R$ 27,00, ou uma alta de 45% em relação ao fechamento de sexta-feira, em função do benefício de adquirir ainda mais ações da BRF a um valor que eles consideram abaixo do valor justo estimado de R$ 32. Nesse cenário, o valor da oferta pública cairia para R$ 16 bilhões ante os R$ 19 bilhões da hipótese anterior.

Eles destacam ainda que, após a aquisição, a Marfrig e a BRF poderiam ficar com as operações segregadas, com Marfrig operando com bovinos e BRF com frango / suínos, o que poderia limitar as sinergias. Os analistas também estimam que cerca de 80% dos custos totais são difíceis de cortar e estão relacionados aos preços das commodities.

Os cenários listados acima, desta forma, não consideram: (1) sinergias, uma vez que cada corte de 5% nos custos não-commodities a relação EV/​Ebitda (valor de mercado mais dívidas sobre Ebitda) para a empresa combinada em 0,6 vezes e ii)
uma eventual listagem nos Estados Unidos, estratégia semelhante planejada pela JBS que poderia ajudar a reduzir o desconto EV/EBITDA esperado para 2022 da empresa combinada de 20-25% frente a empresa americana Tyson Foods.

Os analistas possuem atualmente recomendação outperform (desempenho acima da média do mercado) para as ações da Marfrig e da JBS, com preços-alvos respectivos de R$ 25 (upside de 34% em relação ao fechamento de sexta) e de R$ 38 (upside de 30% em relação ao fechamento de sexta). Já para a BRF, a recomendação é neutra, com preço-alvo de R$ 32, ou potencial de alta de 10% em relação ao fechamento do último dia 11.

Em relatório divulgado na semana passada, antes das notícias sobre a possível entrada do BTG na operação, o Itaú BBA ressaltou que, do ponto de vista da JBS, o cenário competitivo não mudaria muito se a Marfrig adquirisse a BRF (pelo menos no curto prazo).

Isso porque a a nova companhia resultante da operação provavelmente arcaria com um elevado endividamento, o que seria um fator limitante à sua capacidade de investimento no curto prazo, além de indicar que a empresa também teria que realizar uma integração cultural.

Já do ponto de vista da Marfrig, apontaram os analistas do BBA, uma transação JBS-BRF poderia ser até ter um lado positivo para a empresa focada em carne bovina.

A primeira leitura da Marfrig é de que, por ser a maior acionista da BRF, se beneficiaria se a JBS se mobilizasse para adquirir ações da BRF, o que elevaria o preço das ações.

Além disso, se a transação entre JBS e BRF acontecesse, a primeira companhia provavelmente teria que se desfazer de uma parte das operações da BRF (ou Seara) e a Marfrig seria um comprador natural – provavelmente a um preço mais baixo. Já uma eventual venda de sua participação na BRF não sobrecarregaria o balanço da Marfrig e poderia dar mais poder de fogo para investimentos.

Cabe destacar que, nas últimas semanas, analistas, como da XP,  vêm destacando que uma fusão entre Marfrig e BRF  seria positiva, principalmente devido à diversificação entre as proteínas animais e entre geografias, o que provavelmente diminuiria a percepção de risco da empresa resultante. Também destacam que existiriam sinergias entre as operações também, mas a maioria delas se restringe à frente comercial.

O maior desafio, entretanto, seria a aderência cultural entre as empresas: “vemos duas culturas muito diferentes tentando se fundir, o que não é fácil de acontecer. A operação de commodities é mais nervosa, enquanto produtos processados ​​precisam de uma estrutura melhor e de um prazo mais longo para amadurecer”, avaliaram Larissa Pérez e Leonardo Alencar, analistas da XP, em relatório do final de maio.

As movimentações no setor de frigoríficos parecem estar apenas no começo e, por enquanto, as mais impactadas são as ações da BRF, que devem seguir com volatilidade na Bolsa.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.