Atuação pontual do BC para conter alta do dólar divide analistas

O real se destaca como a pior moeda dos mercados emergentes no ano, ao cair mais de 15%

Rodrigo Tolotti | Ricardo Bomfim

Publicidade

SÃO PAULO – Apesar de encerrar uma sequência de 12 altas seguidas nesta sexta-feira (6), quando fechou em queda, o dólar comercial ainda acumula uma valorização de 9,33% contra o real em apenas um mês.

Uma depreciação da moeda brasileira era esperada em meio ao cenário de maior aversão ao risco por conta do coronavírus, levando os investidores a buscar ativos mais seguros. Ainda assim, o real se destaca como a pior moeda dos mercados emergentes no ano, ao cair mais de 15%.

Esse movimento causa divergências entre os analistas. Alguns consideram que a alta da divisa americana é exagerada, enquanto outros defendem que é reação natural de um mercado que vive um momento atípico de incerteza exacerbada.

Masterclass

As Ações mais Promissoras da Bolsa

Baixe uma lista de 10 ações de Small Caps que, na opinião dos especialistas, possuem potencial de valorização para os próximos meses e anos, e assista a uma aula gratuita

E-mail inválido!

Ao informar os dados, você concorda com a nossa Política de Privacidade.

Enquanto isso, o Banco Central segue atuando apenas de forma pontual, seguindo um discurso feito desde o início do ano de que só iria intervir no mercado quando enxergasse uma problema de liquidez.

Na próxima semana, a autoridade monetária já anunciou leilão de venda à vista de dólar no valor de US$ 1 bilhão.

Mas este posicionamento da autoridade monetária já começa a incomodar analistas e investidores, que aguardam por uma atuação mais forte para tentar conter a desvalorização do real dado que a atual cotação é considerada exagerada.

Continua depois da publicidade

“Há indícios de que o real, à margem de todos os demais fatores de influência, esteja sob ataque especulativo, e se for o caso, a ação do BC com intervenções com leilões de swaps cambiais tradicionais deveria ser mais contundente e firme”, afirma em relatório Sidnei Nehme, diretor executivo da corretora de câmbio NGO.

Para Nehme, é esperado que o BC dê início à venda de dólares à vista de forma a suprir a demanda, que tem mitigado com oferta de linhas de financiamento em moeda estrangeira. Por outro lado, os bancos já estão com posições vendidas da ordem de US$ 38,0 bilhões, o que, segundo ele, indica que precisarão de oferta de dólares moeda efetiva.

Na mesma linha, José Faria Júnior, diretor da Wagner Investimentos, aponta que um programa de venda de dólares à vista é necessário para acalmar o mercado. Apesar disso, ele ressalta que não pode seguir o mesmo modelo de como foram programas de intervenção anteriores.

“O BC não pode indicar o volume de vendas e dar um prazo para atuar. Tem que deixar os especuladores com dúvidas. O BC pode até indicar quanto será vendido, mas sem apontar quando fará isso. A surpresa nestas horas é mais eficiente”, afirma o analista.

Mostrando a saída

Por outro lado, alguns analistas entendem que não é recomendável que o Banco Central tenha uma atuação mais agressiva no câmbio.

Bruno Lavieri, sócio da 4E Consultoria, instituição top 5 do Banco Central no ranking de previsões de longo prazo, avalia que, se a autoridade monetária decidisse vender dólares à vista, poderia paradoxalmente aumentar a pressão compradora no curto prazo e até estimular os especuladores a comprarem a briga para saber até onde vai o dólar.

“Não conseguimos entrar na cabeça do investidor que está tirando o dinheiro dele do Brasil”, explica. “O investidor não está sendo muito racional. Muitos poderiam querer sair ao mesmo tempo se o BC oferecesse mais moeda e [o BC] poderia acabar enviando a sinalização equivocada de que há um patamar ideal do câmbio”, diz.

A venda de reservas, na opinião do analista, poderia ter ainda o efeito deletério de diminuir no mercado as expectativas e a confiança de que o governo possui ferramentas poderosas para se defender de um ataque especulativo. Algo que ele não acredita que esteja ocorrendo ainda.

Na avaliação de Lavieri, a abordagem atual é a mais eficaz, pois mostra ao investidor que existe liquidez para sair do real, dando até mais segurança para os investimentos no Brasil. “O que é preciso combater é apenas a volatilidade, não adianta defender patamar do dólar”, argumenta.

Luiz Fernando Figueiredo, CEO da Mauá Capital e ex-diretor de política monetária do BC, vai na mesma linha e diz que as atuações do BC “são efetivas” e buscam manter a normalidade do sistema –  provendo liquidez – e não atenuar o movimento.

“Em momentos como este, em que você tem um choque muito grande, o que o Banco Central tem que fazer é isso: prover liquidez onde ela estiver faltando, seja no câmbio ou onde for. É isso que os bancos centrais estão fazendo”, disse ele em entrevista ao InfoMoney.

Carry trade

Outra preocupação que surge na cabeça dos investidores é acerca do carry trade, uma vez que as apostas estão altas para que o Comitê de Política Monetária (Copom) corte os juros na reunião deste 18 de março.

A operação de carry trade ocorre com a combinação entre fazer uma posição vendida em moeda com taxa de juros mais baixa e outra comprada em moeda com juro mais alto. Além da diferença entre os juros, o investidor também lucra com a variação cambial implícita.

Se o Brasil reduz as taxas de juros, a diferença entre as taxas pagas no país e as pagas nos Estados Unidos (que têm os títulos soberanos mais seguros do mundo) diminuem, prejudicando a operação.

Contudo, Lavieri afasta qualquer preocupação neste sentido, lembrando que o Federal Reserve já reduziu os juros dos EUA em 0,5 ponto percentual este mês e pode fazer isso de novo no dia 18.

“Baixar juros junto com os EUA não deveria ter efeito sobre o carry trade, mas nem sei se esse fenômeno ainda é tão relevante assim, visto que as pessoas estão correndo para o dólar de qualquer jeito”, defende.

Um outro fator que está derrubando o real é o baixo crescimento do PIB brasileiro. Em 2019, a atividade econômica cresceu 1,1% e, para 2020, várias casas de análise vêm cortando projeções para a economia nacional,

Com a Selic baixa e sem crescimento econômico, há baixa atratividade para a entrada de capital estrangeiro no país, impulsionando o dólar.

Sobre esse cenário, aponta o Itaú Unibanco em relatório, há a perspectiva de aceleração do crescimento da economia brasileira na segunda metade do ano, o que deve compensar, pelo menos em parte, o impacto do menor diferencial de juros atraindo capitais para o país e permitindo apreciação da moeda.

O banco tem projeção de um dólar a R$ 4,15 em 2020 e 2021, 10% abaixo do patamar atual. Porém, no curto prazo, avalia que a moeda deva seguir pressionada por conta do elevado nível de incerteza global.

Quer investir melhor o seu dinheiro? Clique aqui e abra a sua conta na XP Investimentos

Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.