Ações de qualidade ou small caps de crescimento? Os papéis para ficar de olho após a recente recuperação da Bolsa brasileira

Cenário de queda de juros tem favorecido ações de menor capitalização, mas analistas da XP destacam ser importante fazer aportes em papéis de qualidade

Lara Rizério

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O Ibovespa registrou alta de cerca de 6% no acumulado de maio até o último dia 22, com o índice chegando a superar os 110 mil pontos, ainda que tenha perdido esse patamar na sessão da última terça-feira (23).

Analistas têm buscado explicações sobre o que tem mais contribuído para esse avanço e se esse movimento de alta deve continuar, em meio a tantos riscos no radar.

Na visão dos analistas da Guide Investimentos, parte da explicação para a alta está na maior convicção na queda da taxa Selic ainda em 2023 (atualmente a 13,75% ao ano) e parte está na redução das posições vendidas em ações.

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A Guide aponta que as ações “small caps” tiveram o melhor desempenho no mês, com avanço de cerca de 12%, seguidas pelo Ibovespa e IFIX ([índice de fundos imobiliários, com alta de cerca de 5%).

Os índices de renda fixa “pré-fixados” como IMA-B ( índice que acompanha o desenvolvimento e o crescimento de uma carteira constituída pelos títulos do Tesouro associados ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo, o IPCA) e IRF-M (formado por títulos públicos prefixados) também tiveram desempenho positivo, mas em menor magnitude.

Conforme destacam os analistas, este padrão é típico de momentos de redução na Selic. “Vale destacar que a renda fixa teve desempenho relativamente melhor em abril e em 2023 até agora (ou seja, a renda fixa começou a ter performance positiva antes dos demais ativos)”, apontam.

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Fonte: Guide Investimentos

A casa também destaca que a posição dos investidores locais em ações é bastante baixa atualmente: os fundos multimercados parecem pouco alocados em ações e a posição vendida em ações na B3 ainda está elevada, sendo este outro fator por trás da alta do Ibovespa.

Com a alocação ainda baixa, os analistas acreditam que as ações ainda tem um longo caminho para “andar” antes de deixar de ser uma boa opção de investimentos. Eles apontam ainda que ações com recentes posições vendidas elevadas estiveram entre as maiores altas, incluindo Ultrapar (UGPA3) e Rede D’Or (RDOR3), por exemplo. As empresas, vale destacar, também tiveram resultados que foram bem recebidos pelo mercado.

Fonte: Guide Investimentos

Fluxo mudou?

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Enquanto o índice de small caps teve uma alta percentual duas vezes maior do que o Ibovespa, as ações de empresas voltadas ao consumo doméstico e bastante descontadas foram as que registram maiores ganhos entre os ativos do benchmark da Bolsa no acumulado de maio.

Assim, estrategistas e analistas de mercado apontam que há uma mudança de fluxo de investimentos, de saída das chamadas ações de valor, que apresentam lucros mais consistentes e são mais resilientes em momentos de fraqueza econômica, para as empresas de crescimento, com um índice de preço/lucro elevado, que ainda não geram um nível consistente de lucro e que se beneficiam de um cenário de juros mais baixos.

Entre as altas acima de 30% do índice no mês até o dia 22, estão: Yduqs (YDUQ3; +65,02%) , Locaweb (LWSA3, +43,97%), Dexco (DXCO3, +42,77%), Alpargatas (ALPA4, +41,97%), Azul (AZUL4, +41,41%), Hapvida (HAPV3, +34,06 %), MRV (MRVE3, 31,94%) e Cogna (COGN3, +30,885).

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Já as ações com queda de mais de 5% foram de ações em sua maioria consideradas mais defensivas ou ligadas a matérias-primas, como BB Seguridade (BBSE3, -9,85%), Embraer (EMBR3, -7,16%), Copel (CPLE6, -5,99%), Vale (VALE3, R$ -5,94%) e Carrefour Brasil (CRFB3, -5,52%).

Assim, analistas e estrategistas se debruçam sobre quais são as melhores opções de investimentos. As small caps subiram demais ou há espaço para alta? O fluxo para as ações de crescimento versus de valor vai continuar?

Sobre as small caps, cabe destacar que o índice de referência da B3 possui maior exposição  aos setores de consumo discricionário e de construção civil em relação ao índice principal (peso de 25% versus 5% do Ibovespa) menor exposição aos setores de matérias-primas e energia (peso de 15% versus 36% do Ibovespa), o que ajuda a explicar a performance pior no acumulado dos últimos 28 meses (queda de 31% versus baixa de 10%; ou cerca de 21 pontos percentuais de diferença), mas a boa performance recente.

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Contudo, em relatório recente, os estrategistas do Morgan Stanley apontaram que não veem as small caps como uma boa opção para se posicionar em um cenário de menores taxas nominais de longo prazo.

Um dos motivos para isso é o chamado “beta” das ações. O beta é um indicador que mensura a volatilidade de uma ação em comparação ao desempenho de um benchmark financeiro. Um beta de 1 indica que o ativo sendo analisado tende a reagir de acordo com o mercado. Por exemplo, se a análise for realizada no mercado brasileiro de ações, caso o Ibovespa suba 2%, um ativo com beta 1 tende também a acumular ganho de 2%. Já um beta superior a 1 indica que o ativo deve reagir com maior intensidade, enquanto beta entre 0 e 1 aponta para um ativo com volatilidade inferior ao mercado. Já ações com beta negativo representam ativos que costumam se comporta na direção oposta ao indicador de referência.

Neste sentido, o Morgan aponta que a ação mediana de setores domésticos chave do índice de small caps possuem um beta em relação a taxas de juros nominais de longo prazo similar aos seus pares do índice principal (Ibovespa). Por exemplo, o beta das ações medianas dos setores de consumo discricionário e de construção civil do índice de small caps são -1.05 e -0.93, respectivamente, ou muito próximo aos -1.00 e -0.95 dos seus pares setoriais no índice principal desde janeiro de 2021.

“Em outras palavras, baseado na nossa análise, comprar a ação mediana no grupo doméstico do benchmark de small caps daria exposição similar a menores taxas nominais de longo prazo do que comprar a ação mediana no grupo doméstico do índice principal (Ibovespa)”, aponta.

O banco ainda destaca que o benchmark de small caps é negociado com um desconto de cerca de 30% em relação ao grupo doméstico ex-bancos do índice principal, mas os investidores tem que pagar um preço em forma de menor liquidez. Este fator é muito importante, uma vez que ações com menor volume médio diário negociado no Brasil geralmente são negociadas a múltiplos muito mais baratos versus seus pares mais líquidos, uma vez que sair de posições em companhias menos liquidas é uma tarefa mais difícil.

Neste cenário, o Morgan destacou as ações que mais devem se beneficiar em um cenário de queda nas taxas de juros de longo prazo, os estrategistas destacam os nomes de Azul (AZUL4), Magazine Luiza (MGLU3), Stone (ação negociada na Nasdaq, cujo BDR é STOC31), B3 (B3SA3), Localiza (RENT3), BTG Pactual (BPAC11), Banco do Brasil (BBAS3), Lojas Renner (LREN3) e Natura (NTCO3).

Segundo os estrategistas, estes são nomes com: 1) um beta alto (invertido) para taxas de juros nominais de longo prazo; 2) recomendação de compra ou neutra por seus analistas fundamentalistas e 3) volume de negociação média diária maior que US$ 50 milhões. Os estrategistas também destacam Iguatemi (IGTI11), ainda que com um volume médio de negociação menor, de US$ 12 milhões, como uma das suas ações favoritas no seu portfolio de ações brasileiras para ter exposição a menores taxas de juros nominais de longo prazo.

Ações de “qualidade” devem seguir no radar

Apesar do cenário marginalmente mais otimista para o Brasil, alguns analistas destacam também ser importante ter as chamadas ações de “qualidade”, uma vez que há riscos no Brasil e lá fora.

No Brasil, riscos ficais permanecem, avaliam, com a tramitação do novo arcabouço fiscal agora em curso no Congresso (na véspera, o texto-base foi aprovado na Câmara); globalmente, há riscos de recessão nos EUA, e mais recentemente volatilidade por conta das negociações do teto de dívida americana, o que também tem levado a um menor ímpeto das ações brasileiras nas últimas sessões. “Com isso, continuamos posicionados em ações de qualidade nos próximos meses”, destaca a XP Investimentos.

Os estrategistas apontam que, nos últimos meses, a sua visão em relação à Bolsa brasileira ficou mais positiva por conta de uma combinação de: (i) inflação desacelerando, (ii) o anúncio da proposta do arcabouço fiscal que trouxe uma maior visibilidade sobre a política fiscal; e (iii) a discussão sobre o início da afrouxamento do ciclo de juros no Brasil.

As estimativas de valor justo da XP para o Ibovespa está em 128 mil pontos até o final do ano, e os estrategistas da casa veem que a margem de segurança dos ativos brasileiros continua elevada.

Porém, alguns riscos estão no radar. Apesar da discussão sobre um corte de juros ter voltado à mesa, ainda se está falando de dígitos duplos da Selic por um tempo, o que significa que empresas altamente alavancadas e setores voltados para o consumidor devem continuar sofrendo.

“Além disso, ainda vemos muitos ruídos políticos, mais recentemente relacionados à reforma tributária que pode impactar muitos setores, e outras notícias pressionando os ativos brasileiros”, apontam, o que beneficia ações mais defensivas.

Portanto, os estrategistas ainda preferem se posicionar de forma mais defensiva, focando em empresas de qualidade. “Nesse momento, achamos adequado investir em empresas com bons índices de lucratividade, ou seja, geram caixa, e baixos níveis de endividamento”, destacam.

Os analistas destacaram uma lista com 24 ações que possuem altos indicadores de lucratividade. São eles: ROE (Retorno sobre Patrimônio), ROIC (Retorno sobre o Capital Investido), Fluxo de Caixa sobre Ativos, margem bruta e margem Ebit.

Além disso, destacam seleção de ativos que possuam baixos indicadores de alavancagem: dívida Líquida por Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações), baixa dívida líquida por valor da firma (EV), além de considerar o Fluxo de Caixa por Endividamento.

Segue a lista abaixo, que conta com nomes como Ambev (ABEV3) e WEG (WEGE3): 

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.