PIB (pelo menos) abaixo de 6%: os fatores que levam os economistas a verem recessão ainda pior para o Brasil em 2020

Especialistas de instituições financeiras destacam período de isolamento maior e dados piores do que o esperado para projetarem queda da atividade

Lara Rizério

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SÃO PAULO – O que já era um cenário bastante negativo para a economia brasileira ficou ainda pior. Nas últimas semanas, diversos economistas de bancos e casas de análise, que já previam uma recessão profunda para o Brasil, revisaram suas projeções e passaram a ver uma queda de pelo menos 6% em meio aos efeitos da pandemia de coronavírus na atividade econômica, uma baixa sem precedentes.

Entre os motivos para o maior pessimismo, estão os últimos dados da atividade (com destaque para a forte queda da produção industrial em março), as expectativas de que a economia ficará fechada por mais tempo, o adiamento da agenda de reformas estruturantes – uma vez que o Congresso agora vai se concentrar em medidas econômicas para combater os efeitos da doença -, além do forte endividamento do Brasil, que deve ser um dos principais desafios nacionais no médio prazo.

“A covid-19 deve continuar a se espalhar pelo Brasil, o que deve aprofundar a recessão econômica, a despeito dos estímulos sem precedentes”, destacou o JPMorgan em relatório. O banco revisou na última semana as suas projeções para o PIB de 2020, passando de queda de 3,2% para baixa de 7%, mesma projeção do BNP Paribas (que tinha expectativa anterior de baixa de 4%). Porém, há quem esteja ainda mais pessimista, caso do Bank of America, que passou a prever uma queda de 7,7% do PIB no ano, enquanto o Goldman Sachs revisou as suas estimativas de queda de 3,4% para de 7,4%.

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O banco suíço UBS, por sua vez, projetou no final de abril três cenários, sendo que em um deles (o mais pessimista), o PIB poderia cair 10,1%. Em relatório, os economistas Tony Volpon e Fabio Ramos destacaram que a imposição de medidas de distanciamento social geraram um choque extremo de oferta, no qual muitas empresas “não essenciais” acabaram interrompendo (ou reduzindo drasticamente) sua produção, gerando um corte repentino nas receitas, em muitos casos a zero. “Isso gerou uma cadeia de cortes repentinos na renda dos trabalhadores e pagamentos a fornecedores e credores.” Contudo, maior probabilidade, por enquanto, seria de queda entre 5,5% e 7,2% neste ano.

Outras casas que passaram a prever uma queda da atividade econômica nacional de ao menos 6% foram: a XP Investimentos (que revisou de queda de 1,9% para baixa de 6%), Deutsche Bank (baixa de 6,2%), Credit Suisse (queda de 6,5%) e Santander (que revisaram de projeção de baixa de 2,2% para queda de 6,4%). Relativamente menos pessimista, o Itaú revisou recentemente sua projeção para o PIB de baixa de 2,5% para queda de 4,5%.

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“Com os dados de atividade econômica piores do que o esperado em março e abril, ficou mais claro que o choque negativo na atividade ao longo do primeiro semestre será considerável”, destaca a XP Investimentos. A XP ainda ressalta que as medidas fiscais anunciadas pelo governo, apesar de apontarem na direção correta, mostraram-se mais limitadas em alcance e tempestividade.

A equipe de economistas cita o exemplo do desembolso do voucher mensal, que teve uma implementação menos tempestiva, enquanto o saque do PIS/Pasep através dos fundos do FGTS ainda encontra-se em fase de implementação e está prevista para ocorrer no começo de junho e a antecipação da 2ª parcela do 13º salário de aposentados e pensionistas do INSS também ocorrerá em junho.

O Bank of America também aponta que os dados econômicos sugerem que o impacto inicial da pandemia em março foi mais forte do que o previsto, o que significa que os dados de abril – quando a paralisação de atividades atingiu o mês cheio – também serão piores.

O BofA ainda ressalta que, a princípio, os bloqueios deveriam durar até o início de maio, mas com o número de novos casos de covid-19 e as mortes ainda aumentando, eles poderiam permanecer até junho ou julho. Na comparação anual, o BofA espera que o PIB caia 1,5% no primeiro trimestre e 16% no segundo, de acordo com relatório elaborado pela equipe liderada por David Beker, chefe de economia e estratégia do Bank of America no Brasil.

O Goldman Sachs reforça a preocupação de que, nas últimas semanas, o Brasil se tornou um dos focos principais no mundo para novas infecções (agora sendo o terceiro país com mais casos confirmados em todo o mundo). Além disso, até agora, não há indicação de quando o pico da curva será atingido dado, entre outras coisas, o enfraquecimento do cumprimento das medidas de distanciamento social nas principais cidades. “De fato, a maior cidade do país, São Paulo, traçou planos para um bloqueio total no caso de que os indicadores de isolamento não melhorem”, aponta em relatório.

Já o Santander avalia que as medidas de quarentena deverão ser relaxadas a partir de meados de junho nas regiões do país com maior participação no PIB, com a atividade só devendo voltar a estar “totalmente operacional” a partir de setembro. Assim, a recuperação da atividade deverá começar no terceiro trimestre, sendo que a demanda será atingida em cheio pela elevação do desemprego e das incertezas pela mudança de comportamento de consumidores e empresas.

De acordo com o JPMorgan, a combinação entre uma crise mais profunda no setor de saúde e as incertezas políticas deve afetar a capacidade de a economia do país se recuperar.

Reforçando o último ponto, a XP aponta que o risco político se materializou, com o Brasil testemunhou a demissão de ministros e a escalada do conflito do governo federal com governos locais. “A polarização política volta a crescer e a impactar ainda mais a confiança de empresários e consumidores. Esse contexto coloca o Brasil na contramão do mundo”, afirma.

Queda mais forte em 2020, alta (porcentual) maior em 2020

Já para o ano que vem, as casas de análise apontam expectativa de recuperação, mas ainda modesta em meio ao tombo que será registrado em 2020. O JPMorgan projeta o PIB brasileiro crescendo 4,4%, ante expectativa anterior de alta de 2,4%. Porém, vale destacar, o aumento da projeção ocorre por conta de uma base de comparação mais enfraquecida e, ao fim de 2021, a atividade econômica continuará 3% abaixo de 2019.

Além disso, apontam os economistas do JP, embora a pandemia seja algo temporário, os efeitos não ceifarão tão rapidamente, fazendo menção à recessão de 2015-2016, em que houve perdas permanentes na produção, o que não deve mudar na recessão desse ano. “Em particular tememos que o apoio a políticas favoráveis ao mercado tomadas até agora tenha queda após a crise, que também aumentará o endividamento de pessoas físicas, jurídicas e do setor público, impactando a recuperação”.

Para 2021, o BNP prevê uma recuperação da atividade de 4%, enquanto a XP mantém a previsão de recuperação a 2,5%, apesar de reforçar que a velocidade da retomada dependerá do sucesso no combate ao coronavírus e da efetividade de políticas públicas adotadas no curto prazo.

O Santander, por sua vez, passou a ver uma alta de 4,4% para o PIB, ainda indicando alta maior acumulada no biênio, além de uma ociosidade de fatores mais prolongada.

Com a atividade em um ritmo de desaceleração maior, a expectativa do Santander é de que a taxa de desemprego suba a 14,9% (ante 11,9% em 2019), recuperando-se gradualmente a 13,1% em 2021 e 11,8% em 2022. A desaceleração também deve levar a uma inflação menor, com uma projeção de alta de 1,4% (ante 2,2%) para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do ano, enquanto a previsão para 2021 passou de 3,1% para 2,9%.

Desta forma, o banco também revisou para baixo, de 3% para 2,25%, a projeção para a Selic ao final do ano, avaliando que a queda mais intensa da atividade indica a normalização de uma política monetária mais flexível.

Já a XP apontou que a piora na atividade levou a projeção para o IPCA de 2020 de 2,5% para apenas 0,7%, bem abaixo do limite inferior da meta do Banco Central e com considerável desaceleração do núcleo de inflação. “Mesmo com a depreciação de quase 40% do real contra o dólar no ano, observamos intensa deflação de bens duráveis e semiduráveis, provavelmente com as empresas varejistas realizando liquidações após o colapso da demanda e pela necessidade de ‘fazerem caixa’”, ressaltou.

A equipe de economistas da XP também acredita que a Selic será reduzida para 2,25% e, apesar do Comitê sinalizar que o próximo corte deva ser o último, é razoável possibilidade de que estímulos adicionais sejam considerados dada a complexidade do cenário. “Para 2021, a Selic deverá permanecer praticamente estável durante todo o ano, sendo elevada para 3,0% a.a. apenas no 4º trimestre”, afirmam.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.