Mercado acompanha Fomc de novembro de olho em sinais para dezembro

Com expectativa quase unânime de alta de 0,75% amanhã, dúvida é se comunicado apontará redução do ritmo na próxima reunião

Roberto de Lira

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A reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) do Federal Reserve (Fed), que começa nesta terça-feira (1) e se encerra amanhã (2) vai testar a capacidade do colegiado em se comunicar com os agentes do mercado. Nem tanto pela decisão de alta na taxa dos Fed Funds, uma vez que o consenso do mercado é praticamente unânime que um novo ajuste para cima de 75 pontos base será aplicado.

O que ainda gera alguma dúvida e expectativa é como o Fed pode conduzir uma redução do ritmo a partir de dezembro sem antecipar alguma decisão de cortes e, assim, perder o respaldo atual de sua política monetária, dizem analistas ouvidos pelo InfoMoney.

Mudança de tom

Segundo análise do Modal, a dúvida veio da própria comunicação dos integrantes do Fed. Em outubro, quando o comitê decidiu elevar novamente a taxa em 75 pontos base, os avisos vieram na linha “hawkish”.

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O chairman Jerome Powell reduziu as chances de um “pouso suave”, ressaltando que o cenário ensejaria ainda mais juros. Na sequência, Loretta Mester, do Fed de Cleveland disse que o risco maior seria o Banco Central não subir juros o suficiente. E Neel Kashkari, presidente do Fed Mineápolis, afirmou ter visto pouco alívio no mercado de trabalho até então.

Mas no dia 21 de outubro, um dia antes dos membros do Fomc entrarem o período de silêncio, a presidente da regional de São Francisco, Mary Daly, comentou que o Fed pode facilmente se encontrar apertando demais, destacou o Modal. Após a fala, a probabilidade de uma alta de 75 ponto base em dezembro despencou de 75,38% para 45,60%.

“Em nossa visão, a fala corrobora a expectativa de redução para 50 p.b. em dezembro, salvo por uma leitura significativamente desfavorável do mercado de trabalho. No entanto, entendemos que o desafio reside na comunicação adequada para que não se perca o progresso feito com o aperto das condições financeiras”, diz banco em relatório.

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“Cabe então ao Fed a tarefa de transparecer a intenção de desacelerar o ritmo de aperto monetário, sem se deixar confundir com a intenção de cortar juros”, comenta.

Segundo André Kitahara, gestor de portfólio macro da AZ Quest, essa comunicação será importante porque, observando apenas os dados, nada é muito sugestivo de que inflação vai cair de forma abrupta em direção à meta. “Está longe disso. Temos visto a inflação flutuando em níveis altos”, comenta.

Sobre a atividade, os sinais são mistos, segundo Kitahara. “O setor de ‘housing’ está claramente em desaceleração, com hipotecas em alta. Se esse mercado não está em recessão no momento, é o que mais se aproxima”, avalia. Por outro lado, o gestor da AZ Quest diz que o mercado de trabalho já mostra alguma perda de ritmo. Ele destaca que ainda há mais postos de trabalho do que pessoas procurando emprego, mas o ‘gap’ tem caído nos últimos meses.

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Fabio Fares, especialista em análise macro da Quantzed, diz esperar que Fed cumpra o que vem falando, continuando com um discurso duro com a inflação. Afinal, lembra, o mercado de trabalho continua apertado e a inflação permanece se espalhando em vários setores.

Mas ele acredita que também é possível comunicar que a inflação já fez pico, com os preços do petróleo se comportando, e que (o Fed) poderá diminuir o ritmo para ir acomodando as altas que ele já deu. “A transmissão entre subir juros e pegar na economia demora nove meses em média nos Estados Unidos. Ou seja, os efeitos da alta ainda estão chegando na economia”, afirma.

Sem dar brecha

Para Fares, o Fed sabe que os mercados se ajustam na expectativa, Então, ele deve diminuir a alta a partir de dezembro, mas isso não significa que a taxa vai para de subir. “Significa que o ritmo que vai usar para alcançar a meta vai ser menor. Talvez ele não precise subir tanto, mas precisa ter tempo e observar o comportamento da inflação”, comenta.

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O analista da Quantzed acredita que vai acontecer uma alta de 75 pontos base amanhã e que virá um comunicado que reduzirá a expectativa para dezembro, apontado para uma lata de 50 pontos base. “Mas não dará brecha para o mercado achar que vai para de subir”, prevê.

Para ele, a taxa terminal (a que aponta o final do ciclo) será de 5% em março do ano vem, o que incorpora 75 p.b em novembro, 50 p.b. em dezembro e duas altas de 25 pb, em fevereiro e março. “Não acho que o Fed vai dar sinal que vai parar de subir. Apenas que vai continuar combatendo a inflação, mas num ritmo menor a partir de dezembro”, afirma.

Angelo Polydoro, economista da ASA Investments, tem uma visão similar. Ele lembra que o “dot plot” de outubro, o famoso gráfico de bolinhas que o Fed divulga apontando as projeções de cada integrante, já mostrou que a preferência era para 50 pontos base de alta em dezembro.

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A dúvida do mercado, diz Polydoro, é sobre como o Fed vai guiar as expectativas sobre os próximos aumentos. “Se o Fed vai optar por não dizer explicitamente o que vai fazer na reunião de dezembro e só sinalizar quando os dados (macroeconômicos) saírem, ou se vai afirmar que pretende reduzir o ritmo. Nossa opinião é que eles vão deixar as opções em aberto, mas que, no futuro veem desaceleração do ritmo de altas”, afirma.

Para Roberto Motta, estrategista macro da Genial Investimentos, se o Federal Reserve estivesse de alguma forma incomodado com a narrativa do mercado que o ritmo poderá ser reduzido em dezembro, já teria enviado algum tipo de comentário ou aviso.

Para ele, há argumentos para começar esse alívio, ainda que a inflação continue forte. Há uma queda de preços no setor imobiliário, por exemplo. E outros bancos centrais já iniciaram esse movimento, como o Banco da Austrália, que reduziu seu ritmo há um mês de, 0,50% para 0,25% (que manteve hoje), e o Banco do Canadá, que promoveu uma alta na semana passada de 50 pontos base, quando o mercado esperava 75 p.b. Além disso, o BCE elevou suas taxas em 0,75 , mas três integrantes do comitê votaram por uma alta menor, de 0,50%.

“O mercado de ativos de risco já se posicionou que o Fed vai deixar de ser monotemático sobre inflação e que terá mais preocupação, ficará mais sensível à atividade econômica. E reduzir o ‘pace’ para 50 (pontos base) ainda é subir forte”, comenta.

Duração maior

A avaliação da Galapagos Capital se assemelha em vários pontos com as de outros agentes do mercado, mas a visão sobre a extensão da política restritiva em 2023 é menos otimista. “A questão de desacelerar o ritmo, que viria em foco na reunião de dezembro, é menos clara para nós e exigirá mais pensamento tático do Fed. O que faria sentido para nós em uma decisão de dezembro seria uma alta de 50 p.b., mas acompanhado de uma revisão da taxa terminal para entre 5,25 e 5,5% e uma explicação clara de que a campanha de aperto vai durar mais”, diz relatório.

A Galapagos não descarta nem mesmo um aumento de 75 pontos base em dezembro, “pois a inflação é bastante problemática”.

“A inflação continua a ser um problema difícil de resolver. É persistente em níveis muito altos, altamente disseminada e mostrando sinais claros de inércia. O núcleo da inflação permanece desconfortavelmente alto e os serviços ainda não atingiram um pico, enquanto os principais bens têm sido bastante voláteis”, comenta a Galapagos.

A Galapagos acredita que uma mudança de ritmo se materializará em algum momento, mas o timing e a comunicação terão que ser criteriosos. “A desaceleração do ritmo, potencialmente em dezembro, terá que ser acompanhada de uma forte afirmação de que, embora o ciclo possa ser mais lento, ele durará mais do que se imaginava, com uma taxa terminal mais alta e, uma vez lá, terá que ficar por um tempo.”