Ata mostra Fomc alinhado no combate à inflação, mas em dúvida sobre dose de juros, dizem analistas

Economistas viram um Fed ciente que desinflação está lenta, mas preocupado com os efeitos da política monetária na atividade

Roberto de Lira

(Crédito: Shutterstock)

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A Ata da última reunião do Comitê de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) do Federal Reserve mostrou que o colegiado mantém o viés de aperto monetário, mas que julgam ainda ser necessário um tempo maior para que os efeitos cumulativos da alta de juros se manifestem totalmente, segundo análise de economistas.

O documento revelou que a maioria dos participantes do Fomc acreditam ser apropriado realizar aumentos adicionais nas taxas e que enxergam a possibilidade de uma leve recessão entre o final desde ano e o começou do próximo.

Para Andressa Durão, economista da ASA Investments, a Ata do Fomc pode ser considerada neutra em relação ao comunicado oficial da reunião em 14 de junho (quando o Fed optou para uma pausa no ciclo de altas), mas que o texto foi levemente “dovish” (suave) em relação aos últimos discursos do presidente Jerome Powell.

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“Apesar de citar que quase todos os participantes acham que aumentos adicionais este ano são necessários, a Ata deixa muito claro que os membros do Fomc querem olhar mais dados para decidir os próximos passos da política monetária”, comentou.

Para Andressa, parece que as altas que estão nos dots (as projeções do gráfico de pontos do fed) e que Powell tem citado como “pelo menos duas” ainda não estão confirmadas.

“Além disso, citaram várias vezes defasagem da política monetária e efeito acumulado do que já foi feito”, alertou. “Achei que demonstraram preocupação maior com efeito da política monetária na atividade, além de ainda continuarem enxergando recessão”, completou.

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Já André Cordeiro, economista-sênior do Banco Inter, considerou que o documento divulgado nesta quarta-feira forneceu poucas novidades em relação ao comunicado após a decisão. “O Fed enxerga um cenário em que a economia continua expandindo, em um ritmo moderado, com o mercado de trabalho ainda apertado e a inflação em patamar elevado”, disse.

Segundo Cordeiro, para os membros do Fomc, dado o grau de contração monetária já realizado e a incerteza sobre a defasagem da política monetária, o ideal seria pausar para dar tempo suficiente para averiguar a situação da economia à medida que novos dados sejam divulgados. “Entretanto, alguns membros se mostraram favoráveis a uma alta adicional de 25 bps na reunião de junho, apesar de não terem votado para isso”, ponderou.

“Outra consideração importante é que os membros do Fomc ainda mantêm como cenário base uma leve recessão entre o último trimestre desse ano e o primeiro trimestre do ano que vem. Mas que, devido à robustez da economia, veem um cenário em que a economia continue crescendo moderadamente, enquanto a inflação diminui, tão provável quanto o cenário base”, afirmou o economista do Banco Inter.

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Para Cordeiro, a conclusão é que o Fed irá decidir os próximos movimentos na política monetária de acordo com o cenário desenhado pelas próximas divulgações econômicas, sendo uma alta de 25 pontos-base na reunião de julho o cenário mais provável hoje.

Ciclo perto do fim

Francisco Nobre, economista da XP Investimentos, avaliou que o documento veio muito em linha com as comunicações recentes do Fed e que reforça a intenção do comitê de continuar elevando os juros, embora num ritmo menor.

“Acreditamos que o Fed está muito próximo de encerrar seu ciclo de aperto e que uma nova alta de juros não mudará significativamente a trajetória da economia americana ou dos preços dos ativos”, comentou.

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Para Nobre, devido à ausência de dados que poderiam deixar o Fed mais confiante de que a inflação está em trajetória de convergência para a meta de 2%, está se tornando cada vez mais provável que a autoridade monetária dos EUA eleve as taxas em 0,25 ponto percentual em julho.

Porém há uma chance de a autoridade monetária adiar ou, eventualmente, até desistir da decisão de aumentar os juros. “Mas isso exigiria que os dados de inflação e mercado de trabalho referentes a junho viessem consideravelmente mais benignos do que o mercado espera”, ponderou.

Para o economista da XP, a recessão nos EUA provavelmente será adiada para o início de 2024, devido à resiliência da atividade no curto prazo. “Esperamos que o Fed comece a cortar as taxas no primeiro semestre de 2024, porém gradualmente, mantendo as taxas reais restritivas até o final do ano.”

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Lucas Zaniboni, economista da Garde Asset Management, por sua vez, afirmou que a Ata corroborou a visão de um comitê que ainda tem o viés de aperto de política monetária, mas quer se mover a um ritmo menor à medida que se aproxima do que julga restritivo.

“A alta em julho está praticamente dada, mas ali para frente, acreditamos em dados mais benignos de inflação nos próximos meses o convencerão a passar para a próxima fase do ciclo, de manutenção dos juros por período prolongado”, previu.

Zaniboni destacou que, na própria Ata o Fed cita riscos altistas para os componentes de aluguéis na inflação, uma das principais divergências com o cenário da Garde. “Pode ser uma fonte de surpresa baixista para o Fomc”, afirmou.

William Castro Alves, estrategista-chefe da Avenue, destacou como pontos principais da Ata o comentário que a maioria dos participantes acreditam que serão necessários mais aumentos de juros e que a inflação segue inaceitavelmente alta e sendo um problema a ser controlado.

“Como reflexo disso, os membros do Fed atualizaram sua previsão de aumento de juros, estimando uma taxa terminal de 5,6%, acima da previsão anterior de 5,1%, reforçando a ideia de mais aumentos à frente.”

Castro Alves afirmou que o mercado já adotou o discurso e atualmente 86% esperam que o Fed retome o aumento de taxas na reunião de 25 a 26 de julho, isso de acordo com o monitor de juros da CBOE. “Não obstante, a curva de juros americana também reflete isso, com os juros de vencimento de 2 anos chegando a 4,95%, próximo as máximas de 52 semanas. A questão toda é que tais aumentos seguem condicionados aos dados e devem se dar em ritmo mais lento”, disse.