Unicórnio de carros usados vira 2ª startup mais valiosa da América Latina – e Brasil segue como seu queridinho

Kavak triplica a quadruplica de tamanho anualmente. Com nova captação de US$ 700 milhões startup quer ter 10% do mercado de usados e seminovos

Mariana Fonseca

Centro da Kavak (Divulgação)

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SÃO PAULO – A Kavak chegou por aqui faz apenas dois meses, mas com grandes números. Mais especificamente, um investimento de R$ 2,5 bilhões para participar do mercado brasileiro de compra e venda de carros usados e seminovos. O dinheiro ainda não foi esgotado – mas a plataforma mexicana já está reforçando o caixa, de olho em uma escalada que transformará o Brasil em seu maior mercado até o fim de 2022.

A Kavak anunciou nesta quarta-feira (22) uma rodada série E de US$ 700 milhões (entenda os estágios de investimento em startups). A captação foi liderada pela General Catalyst, gestora que investiu em negócios como Airbnb e Instacart. O investimento também teve participação dos fundos como Tiger, Spruce House, D1, SEA, Founders Fund, Ribbit e SoftBank.

Essa nova injeção de capital vem apenas cinco meses após a série D da Kavak, refletindo o crescimento acelerado da startup de automóveis. O negócio foi criado por Carlos Garcia Ottati, Loreanne Ottati e Roger Laughlin Carvalho em 2016. Em outubro de 2020, a Kavak se tornou o primeiro unicórnio, ou startup com avaliação de mercado igual ou superior a US$ 1 bilhão, do México. Em abril deste ano, com a série D, o valuation subiu para US$ 4 bilhões.

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Com a série E, a avaliação bateu US$ 8,7 bilhões. Assim, a Kavak se tornou a segunda startup mais valiosa da América Latina, segundo o ranking da empresa de dados CB Insights. O negócio mexicano fica atrás apenas da fintech brasileira Nubank.

O Do Zero Ao Topo, marca de empreendedorismo do InfoMoney, conversou com Laughlin sobre os planos da plataforma de compra a venda de automóveis depois da série E. A companhia triplica a quadruplica seu tamanho a cada ano – e Laughlin ainda vê uma demanda não atendida por carros seminovos e usados. O plano é dominar 10% do mercado em longo prazo.

“Os recursos mudam mais a nossa vida do que o novo valuation. Mas é um marco que ajuda a gerar confiança para o consumidor e a atrair mais talentos. Essa avaliação também atrai mais fundos para as oportunidades vistas no ecossistema de inovação da América Latina.”

“Estamos sendo agressivos para capturar a oportunidade”

Em um contexto de mais digitalização e de carros novos em falta, a Kavak busca se consolidar nos países em que já atua (Argentina, Brasil e México) e chegar a novos mercados. A empresa vai expandir para outros locais na América Latina e abrir sua primeira operação fora da região nos próximos seis meses, mas não divulga quais serão esses países.

Veja Também: Chegou a hora de se preparar para investir em 2022. Veja como

“Durante a pandemia, houve uma adoção acelerada dos consumidores às experiências digitais ou híbridas. Ao mesmo tempo, o mercado de carros passa por falta de oferta para atender um excesso de demanda. O consumidor procurou ainda mais automóveis usados e seminovos, mas não existe ainda muito inventário que forneça garantia do veículo e segurança na transação. Estamos sendo agressivos para capturar a oportunidade”, diz Laughlin.

A Kavak pretende se consolidar em mercados grandes para usados e seminovos, porém informais e muito fragmentados. “Nenhuma empresa tem mais de 0,5% de participação onde atuamos, então imaginamos um cenário com múltiplos players“, diz o cofundador.

No Brasil, alguns exemplos de concorrentes são Creditas Auto, InstaCarro, Karvi e Volanty – veja como e por que as startups esperam dominar o mercado de usados e seminovos. Apesar da esperada competição, a startup mexicana espera atingir um share de mercado de 5% no médio prazo, e de 10% em longo prazo.

Os US$ 700 milhões vão ajudar nessa conquista de participação. O investimento irá para mais equipe, tecnologia, inventário, infraestrutura e expansão.

Brasil, o mercado queridinho

Apenas no Brasil, 11,4 milhões de automóveis do tipo foram vendidos em 2020. Para especialistas ouvidos anteriormente pelo Do Zero Ao Topo, o mercado de usados e seminovos no país é de quatro a nove vezes maior do que o de carros novos, a depender do estado da economia.

A Kavak estima que o Brasil seja o terceiro maior mercado para usados e seminovos do mundo, atrás apenas da China e dos Estados Unidos. Esse seria um mercado de cerca de R$ 600 bilhões por aqui – e isso contando com uma baixa penetração de automóvel por habitante.

Mesmo assim, a startup mexicana ainda tem “bastante” dos R$ 2,5 bilhões investidos no país. “Temos caixa suficiente para escalar de forma agressiva no Brasil. Mas a captação de agora funciona como um reforço para que o que estamos esperando que o Brasil se torne”, diz Laughlin. A Kavak espera que o país seja seu maior mercado até o final de 2022.

A Kavak tem 5 mil funcionários, 1 mil deles em terras brasileiras – uma quantidade nacional de funcionários que estava prevista apenas para o final do ano. A empresa não tem uma meta global de contratação, mas destaca que a equipe de tecnologia será dobrada.

“Temos 600 engenheiros atualmente e vamos contratar outros 600 nos próximos 12 meses. 300 deles ficarão no Brasil. Estamos com uma contratação acelerada desde que chegamos justamente para fazer um treinamento que garanta nossa escala nos próximos meses”, diz Laughlin.

Esses profissionais vão melhorar a tecnologia da Kavak em três grandes frentes. Primeiro, a tecnologia para os carros: coletar mais informações dos automóveis e melhorar a operação durante o processo de inspeção, reforma, disponibilização, entrega e pós-venda. Em segundo lugar, a tecnologia para o consumidor: facilitar a compra e venda dos usados e seminovos no aplicativo ou no computador. Por fim, a tecnologia para melhorar o acesso ao financiamento desses veículos.

Depois de melhorar as plataformas digitais, a Kavak precisa melhorar sua infraestrutura física. Em São Paulo, a startup mexicana tem cinco unidades que funcionam ao mesmo tempo como centros de recondicionamento dos automóveis e como lojas. O plano é inaugurar mais duas unidades em setembro, e mais cinco unidades em outubro. A Kavak vai chegar a Campinas e Sorocaba em 2021. No próximo ano, pretende atingir novos estados brasileiros.

A Kavak já adquiriu cinco mil automóveis em seus dois meses de operação oficial no Brasil. Vendeu 1,5 mil deles, então restam 3,5 mil carros em seu inventário nacional. Apenas em agosto, o negócio comprou 1.100 carros no país. “Demoramos quatro anos para atingir essa mesma marca no México. Crescemos de forma agressiva a cada mês”, reforça Laughlin.

Até o final de 2022, a startup espera comprar mais de 100 mil carros e vender mais de 50 mil deles no Brasil. Isso fará com que o país se torne o maior mercado para a Kavak. “Estamos olhando para essa meta como realista. Provavelmente reajustaremos para um valor acima desse.”

Como funciona a Kavak?

Os vendedores colocam no site da Kavak informações básicas como ano, modelo, versão, cor e quilometragem aproximada. O preenchimento leva cerca de dois minutos, segundo a startup. Depois, cada vendedor agenda uma inspeção em sua casa, em seu local de trabalho ou em um centro de inspeção/loja da Kavak. O negócio diz comprar carros fabricados há até dez anos e com menos de 90 mil quilômetros totais rodados.

A Kavak coleta as informações do cadastro e da inspeção para alimentar um algoritmo próprio, um de seus diferenciais. O algoritmo rastreia preços em sites concorrentes, classificados, leilões e tabelas de mercado, como a da Fipe. Também projeta tendências de oferta e demanda de forma dinâmica.

Após o algoritmo finalizar sua avaliação e emitir uma proposta de preço pelo veículo, a Kavak oferece algumas formas de venda: pagamento imediato, pagamento em 30 dias e pagamento em consignação (a startup paga apenas quando o veículo for vendido). Quanto maior o prazo, maior deve ser o valor pago pelo veículo.

A Kavak se torna dona de todos os carros a serem vendidos e apenas os cadastra em seu site após reformas “estéticas” e “de detalhamento” em um centro de recondicionamento em Barueri, interior do estado de São Paulo. Para os compradores, a startup oferece possibilidade de ver o carro em um de seus centros de inspeção/loja; garantia de dois anos; agendamento de manutenção por aplicativo; e possibilidade de contratação online de financiamento de veículos com bancos parceiros. Os compradores podem devolver o veículo em até sete dias.

Segundo Laughlin, a Kavak pode capturar tanto quem quer comprar pela internet quanto quem quer comprar de forma física. As motivações também são diversas. “Tem quem precise de fluxo de caixa; tem quem queira um carro de nível superior por meio de um usado ou seminovo; e tem quem queira trocar um carro por dois mais econômicos”, diz. Para a mexicana, atender qualquer cliente será fundamental para conquistar 10% de cada gigante mercado de usados e seminovos.

Mariana Fonseca

Subeditora do InfoMoney, escreve e edita matérias sobre empreendedorismo, gestão e inovação. Coapresentadora do podcast e dos vídeos da marca Do Zero Ao Topo.