Qual será o destino dos investimentos bilionários do SoftBank na América Latina?

Grupo tem maior fundo de venture capital dedicado à região, de US$ 8 bilhões. Mas a saída de um executivo-chave gera questionamentos sobre o futuro

Mariana Fonseca

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No final de janeiro, o conglomerado japonês  SoftBank se despediu de um de seus principais executivos, Marcelo Claure. Ele era o braço direito de Masayoshi Son, o fundador e CEO da holding que detém uma das maiores operadoras de internet e telefonia do Japão e também um dos maiores fundos para investir em negócios de tecnologia — o Vision Fund, de US$ 100 bilhões.

Como CEO do SoftBank Group Internacional, divisão que reúne os investimentos internacionais do SoftBank, Claure coordenou a reorganização de gigantes como as americanas WeWork, de escritórios compartilhados, e Sprint, de telefonia móvel.

O executivo também foi responsável por colocar a América Latina no mapa de investimentos do grupo. O SoftBank Latin America Fund, coordenado por ele, foi criado em 2019 e se tornou o maior fundo de venture capital para a América Latina, com um total captado de US$ 8 bilhões em duas rodadas. Entre as 80 companhias investidas, estão os unicórnios Creditas, Gympass, Loggi, Loft, Quinto Andar e VTEX.

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Relatos publicados em diferentes veículos de notícias indicam que a saída de Claure foi tudo menos amigável. O rompimento total se deu por problemas de remuneração: Claure, segundo relatos, buscava US$ 2 bilhões por sua atuação na fusão entre Sprint e T-Mobile e na reestruturação do WeWork.

Para entender os impactos que essa mudança pode ter para o Softbank e os investimentos do grupo na América Latina, o Do Zero Ao Topo, marca de empreendedorismo do InfoMoney, ouviu cinco gestores brasileiros que acompanham de perto o assunto.

A região deverá continuar importante para o SoftBank no curto prazo, segundo esses gestores. “Foi o bom resultado do primeiro fundo levou ao segundo fundo, de US$ 3 bilhões. O ritmo de investimentos continuou agressivo nos últimos meses. Não vejo uma tendência de freio. O Masayoshi Son tem a América Latina como região prioritária e inclusive colocou dinheiro do próprio bolso no fundo para a região”, diz um deles. A taxa interna de retorno (TIR) foi de 103% em moeda local e 85% em dólares entre 2019 e junho de 2021.

“A América Latina tem um peso maior para o SoftBank do que outros fundos. Enquanto outras regiões costumam representar cerca de 5% dos investimentos internacionais, a América Latina já deve estar na casa dos dois dígitos”, afirma outro gestor.

“Não vemos uma mudança radical na estratégia do SoftBank em relação à América Latina. Prepondera o movimento oposto: o SoftBank está cada vez mais presente em processamento de deal flow [fluxo de negociações], inclusive no early stage [startups em estágio inicial]”, completou mais um investidor.

Reorganização interna

Olhando para o médio prazo, a dúvida é como ficará a administração dos investimentos na América Latina sem a presença de Claure. Michel Combes foi nomeado como novo CEO do SoftBank Group International. A equipe continua com gestores reconhecidos no mercado, como Alex Szapiro, Paulo Passoni, Rodrigo Baer e Shu Nyatta.

Um dos investidores ouvidos para a reportagem acredita que as conversas sobre a estrutura organizacional mais adequada aos investimentos internacionais do SoftBank devem durar cerca de dois meses. “Com certeza haverá uma reorganização, porque o Marcelo era uma figura importante. Mas as prioridades não devem mudar, já que a América Latina é a menina dos olhos do SoftBank.” Procurado, o Softbank não comentou.

Outra incerteza é se o bom momento do mercado de tecnologia na América Latina vai continuar. “O atual capital comprometido no SoftBank para a região será investido de toda forma, a não ser que haja um problema significativo no ecossistema local, independente da atuação do SoftBank. Em fundos futuros, a relevância da região pode diminuir frente aos demais planos e geografias visados pelo SoftBank”, diz outro investidor.

Sob a ótica dos fundadores, o trabalho feito pelo SoftBank criou um ambiente de investimentos que já vai muito além do próprio fundo. O capital seguirá desembarcando na América Latina – se as oportunidades de cada país continuarem atrativas, claro.

“A América Latina já está comprovada como oportunidade diante dos seus casos de sucesso, de unicórnios até saídas. Então deve continuar atraindo cada vez mais capital externo, independente da participação ou não do SoftBank. Especialmente se uma eventual saída for motivada por estratégias internas”, diz um dos investidores.

“O ecossistema não é o mesmo de quando o SoftBank começou na região e era o único grande investidor internacional apostando em VC no Brasil. Mesmo que o SoftBank resolva ir embora, outros fundos globais estão olhando para o Brasil. Nunca foram tão próximos dos fundadores daqui”, concorda outro investidor.

Claure entrou para o SoftBank em 2014. “A América Latina era uma região com pouca representação e pouco capital disponível, mas próxima e querida por mim”, escreveu o executivo, que é boliviano, em um post de despedida na rede social LinkedIn.

“Com nosso apoio e liderança, a América Latina se destacou como uma região fértil, com crescimento exponencial de fundadores e com um mercado efervescente de venture capital. Provamos para o mundo que os empreendedores latino-americanos são tão bons quanto os outros. O que faltava era capital”.

E emendou: “Eu aguardo meu próximo capítulo profissional, que anunciarei quando for a hora certa.”

Mariana Fonseca

Subeditora do InfoMoney, escreve e edita matérias sobre empreendedorismo, gestão e inovação. Coapresentadora do podcast e dos vídeos da marca Do Zero Ao Topo.