O terceiro capítulo do Ebanx: unicórnio que conecta brasileiros a AliExpress, Amazon e Uber

Primeira startup bilionária da região Sul recebeu um aporte de US$ 430 milhões, que abriu a temporada de preparação para um IPO

Mariana Fonseca

Sede do Ebanx (Divulgação)

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SÃO PAULO – Se você comprou um produto internacional pela Amazon ou pelo AliExpress, pagou a mensalidade do Spotify ou fez uma corrida pelo Uber, usou o Ebanx sem nem saber.

A fintech sediada em Curitiba (Paraná) conecta gigantes internacionais a mais de 100 métodos de pagamento pela América Latina. Assim, 70 milhões de consumidores latino-americanos já pagaram por produtos e serviços de sites como Amazon, AliExpress, PlayStation, Shopee, Shein, Spotify e Uber.

O Ebanx foi criado em 2012. Alphonse Voigt, João Del Valle e Wagner Ruiz buscavam resolver a falta de acesso desses consumidores a sites globais, especialmente quando os latino-americanos não têm um cartão de crédito que permita compras no exterior. A fintech cresceu desde então, e está em seu terceiro capítulo.

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O primeiro foi o percorrido por tantos outros empreendedores: sobreviver com os próprios recursos. O segundo capítulo foi a entrada na “esteira do capital de risco”: uma sequência de captações com o fundo de venture capital FTV Capital fez a startup de pagamentos chegar a valer US$ 1 bilhão em 2019, tornando-se o primeiro unicórnio da região Sul do Brasil.

O terceiro e atual capítulo é o de preparação para a estreia na Bolsa de Valores, por meio de uma oferta pública inicial de ações (IPO). A virada de página foi um aporte de US$ 430 milhões, liderado pela gestora de private equity Advent.

Essa trajetória foi explicada por Ruiz, em entrevista ao Do Zero Ao Topo, marca de empreendedorismo do InfoMoney. “São estágios de começo, consolidação e continuação do crescimento. O quarto capítulo será o IPO. Vamos apertar o botão quando for prudente para os acionistas, dependendo também do momento do mercado”, diz o cofundador.

Wagner Ruiz, fundador e CFO do Ebanx (Do Zero ao Topo/InfoMoney)

O caminho até o IPO

As conversas com a Advent acontecem desde 2015, e o fundo de private equity ficou de olho na rodada que levou o Ebanx a atingir o status de unicórnio. A Advent investiu US$ 430 milhões na fintech brasileira por meio de seus quatro fundos: Latin American Private Equity Fund (LAPEF), Global Private Equity (GPE), Advent Tech (AGT) e Sunley House Capital (SH).

“O Ebanx é uma das empresas mais impressionantes que conheci nos últimos 20 anos”, escreveu em comunicado Mario Malta, sócio da Advent responsável pelos investimentos do fundo na área de serviços financeiros na América Latina. “É o líder em um mercado em altíssimo crescimento, servindo clientes que estão entre as marcas que mais crescem no mundo, e os ajudando a vender com simplicidade, confiança e alto nível de aprovação de transações”.

A rodada com o Ebanx também se tornou o maior investimento da Advent em uma empresa latino-americana de tecnologia. A Advent já investiu mais de US$ 5 bilhões em onze empresas de pagamentos, e apoiou essas companhias em mais de 40 processos de aquisição.

A gestora de private equity entra como sócio minoritário e os fundadores do Ebanx permanecem como majoritários. “É uma gestora de grande porte e especialista em ofertas públicas. O aporte dos quatro fundos da Advent valida nossa construção de quase dez anos e dá uma noção ao mercado sobre o tamanho da aposta feita”, diz Ruiz.

O aporte da Advent será usado para contratações, expansão e fusões e aquisições (M&As). O Ebanx tem 1.000 funcionários e está com 200 vagas em aberto.

A fintech também pretende ir de nove para 15 países atendidos. O Ebanx atende Brasil, México, Colômbia, Argentina, Chile, Peru, Bolívia, Uruguai e Equador. Até o final do semestre, vai inaugurar operações em Costa Rica, Paraguai, El Salvador, Panamá, Guatemala e República Dominicana.

O Ebanx está conversando com cinco empresas na frente de M&A. “Olhamos para o e-commerce cross border, que é nosso foco, mas também para áreas complementares, como processamento de pagamentos locais e serviços para o consumidor. Estamos trazendo o trator dos M&As, que é a Advent, para ajudar em julgamento das companhias e processos de fusão e aquisição.”

As compras estão focadas principalmente no exterior, como forma de acelerar o crescimento do Ebanx fora do seu país natal. “O Brasil é mais nossa casa e temos outras opções para manter nossa expansão”, afirma Ruiz. Já dentro de casa, a companhia criar e lançar produtos voltados ao consumidor nesses outros países. Por aqui, o Ebanx já oferece uma conta digital com cartão pré-pago e cashback em sites internacionais.

Pandemia, dólar e crescimento

É conhecido que a pandemia de Covid-19 levou hábitos dos brasileiros para a internet. O estudo Beyond Borders 2020/2021, elaborado pelo próprio Ebanx, apontava que cerca 52 milhões de consumidores latino-americanos compraram pela primeira vez na internet em 2020.

Esse número é o dobro do esperado antes da pandemia. Em 2022, a penetração do comércio eletrônico deve ser de 63% entre a população da região, ante 45% no começo de 2020. A América Latina só perde para o Sudeste Asiático em velocidade de crescimento do e-commerce.

Recortando especificamente o comércio transfronteiriço na América Latina, houve uma queda de 9% em 2020. Compras internacionais movimentaram US$ 26,7 bilhões no último ano, enquanto as compras domésticas equivaleram a US$ 148,1 bilhões.

Mas o cross border deve se recuperar nos próximos anos. O crescimento esperado para 2021 é de 23%, e de 32% para 2022. A fatia das compras internacionais no total do e-commerce deve crescer de 14% em 2020 para 16% em 2022.

Ruiz diz que o salto da transformação digital cross border foi maior em países mais defasados em pagamentos alternativos, como Colômbia, México e Peru. Já países como Brasil e Chile têm propostas mais desenvolvidas de cartões internacionais, então cresceram relativamente menos.

Atualmente, 40% da receita do Ebanx está fora do Brasil. O plano em longo prazo é que essa porcentagem suba para 50%, mas aumentando tanto a receita no Brasil quanto no resto da América Latina.

O cofundador também diz que não foi valorização do dólar ante o real que prejudicou o comércio transfronteiriço. Em 2020, a moeda americana teve alta de 29% sobre a moeda brasileira. “Quem trabalha com mensalidades segurou o preço, sabendo que seria prejudicial ao usuário e no fim para as próprias companhias. Vimos um comportamento mais diverso entre quem vende bens físicos. Mas não notamos um grande impacto nas vendas mesmo entre quem não segurou preço”.

Segundo o Beyond Borders, varejistas que vendem produtos físicos pela internet cresceram cerca de 21% no último ano, enquanto as companhias que vendem produtos digitais, como assinaturas, expandiram cerca de 45%.

“Tivemos quedas de consumo em algumas companhias, mas mais relacionadas com a pandemia do que com o dólar. O brasileiro demora algumas semanas para mudar suas condições de consumo, e isso depende não apenas da cotação, mas também de instabilidade econômica e sentimento de segurança no emprego”, completa Ruiz.

Em outros países atendidos pelo Ebanx, nem mesmo o contexto pessimista é suficiente para abalar o consumo internacional. “Não tivemos nenhuma queda de consumo na Argentina, por exemplo. É um país acostumado com variações cambiais e turbulências econômicas.”

Ao todo, a fintech cresceu 38% e processou 145 milhões de transações em 2020. “Temos um negócio B2B [que atende outras empresas]. Algumas companhias cresceram muito, outras caíram muito. Mas conseguimos manter nossa taxa de crescimento e agora vemos uma recuperação daquelas companhias que caíram, ainda que longe dos números antes da pandemia”, diz Ruiz.

O momento é de espera. As empresas internacionais estão de olho na retomada completa – e o Ebanx mira o momento certo para sua estreia na Bolsa de Valores.

Mariana Fonseca

Subeditora do InfoMoney, escreve e edita matérias sobre empreendedorismo, gestão e inovação. Coapresentadora do podcast e dos vídeos da marca Do Zero Ao Topo.