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Lobby: a regulamentação da discussão política

Após anos de debates o lobby está prestes a ser regulamentado no Brasil. Enfim o país terá mecanismos modernos de ética, transparência e diálogo.
Por  Eduardo Galvão
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Desde que a ocupação napoleônica na Europa obstruiu o entreposto comercial que Lisboa representava para os produtos do Brasil, os grupos sociais se organizam no país para participar do processo de discussão e formulação de políticas públicas. Naquela ocasião foi fundada a associação Praça do Comércio da Bahia, que culminou na Abertura dos Portos às Nações Amigas de Portugal. Essa política pública permitiu o escoamento de produção brasileira aos mercados consumidores da Europa.

Nosso amadurecimento social e político ao longo das décadas vem refinando e qualificando essa participação social junto aos Poderes Políticos para discutir políticas públicas de investimentos, sociais, ambientais, e outras. Tal é a diversidade da colaboração de grupos na formulação de políticas que se diz que a Constituinte de 1988 contou com a participação “da tanga à toga” na construção da nossa Constituição Cidadã.

De lá para cá pode-se dizer que quase todas as políticas públicas relevantes para os grupos sociais contaram com a contribuição desses atores, que, levando a sua visão e o seu conhecimento sobre seu setor, podem colaborar para a construção de políticas públicas mais equilibradas e eficientes.

Sim, estamos falando de lobby. Lobby no conceito literário. Não a deturpação sensacionalista que alguns, equivocadamente, insistiram em atribuir ao termo. O lobby é inerente ao exercício da democracia. Estamos falando de uma atividade, para citar o Ministério da Transparência, entendida como “função acessória e subsidiária na formulação das políticas públicas”. Hoje a evolução do conceito, para abranger atividades acessórias na representação de interesse, é chamada de Relações Institucionais e Governamentais.

Quando a Uber discutiu no Congresso Nacional a regulamentação dos aplicativos de compartilhamento de transporte individual de passageiros, estava praticando Relações Governamentais. Quando o setor hoteleiro passou defender a regulamentação dos serviços de hospedagem colaborativa pela Airbnb, também estava praticando Relações Governamentais. Quando as instituições filantrópicas estavam a defender a manutenção de sua isenção fiscal por conta de serviços gratuitos prestados à população; quando as cervejarias buscaram sua inclusão no Simples Nacional; quando ambientalistas defendem agenda contra o desmatamento; quando o Ministério Público buscou a aprovação das 10 Medidas contra a Corrupção, em todos esses casos estamos falando da mesma atividade de defesa legítima de interesses em políticas públicas.

É importante desmistificar e mostrar como isso faz parte do nosso dia-a-dia, embora muitas vezes não nos demos conta.

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Principalmente em países legalistas e com alto grau de intervenção do Estado na economia é fundamental contar com equipes técnicas para monitorar e participar das formulações de políticas públicas. Recentemente a Nubank e outras pequenas emissoras de cartão de crédito como Renner, Riachuelo e Pernambucanas estiveram com seus negócios em risco caso o Banco Central aprovasse a redução nos prazos de pagamento. Casos como esse são frequentes em nosso país e mostram o alto grau de impacto das políticas públicas na atividade econômica.

O gráfico abaixo demonstra o aumento dessa atividade regulatória do Estado nos últimos anos. Ademais, dados da Primeira Secretaria da Câmara demonstram um expressivo aumento do número de profissionais representantes de setores sociais se cadastrando para acesso à Câmara dos Deputados.

 

 

Paralelamente a isso tem se multiplicado espaços de participação social no Poder Executivo. Neste último caso, vemos fóruns como o “Conselhão”, cujo formato tem se replicado em ministérios e agências reguladoras. Trata-se de uma evolução quantitativa e qualitativa que institucionaliza e refina a participação social para discutir política.

E certamente algo imbuído de uma função social tão importante para o amadurecimento democrático não pode ser confundido com os malfeitos que permearam a mídia recentemente. Esses atos criminosos têm outros nomes, todos tipificados no Código Penal.

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Para trazer transparência, separar o joio do trigo e deixar às claras a atividade a Câmara dos Deputados está prestes a votar o projeto que regulamenta as Relações Institucionais e Governamentais. O projeto, de autoria do deputado Carlos Zarattini e relatado pela deputada Cristiane Brasil, parte de três pilares, os mesmos indicados pela OCDE e pela Transparência Internacional: ética, transparência e diálogo. Prevê princípios, limites e sanções para o descumprimento da norma. Passa a ser obrigatória a identificação de quem é e quem representa, bem como garante a participação dos diferentes grupos interessados num mesmo tema e delimita como essa relação deve se dar. A votação está prevista para o início de julho.

Com isso a atividade sai das sombras, a transparência, o diálogo e a ética são garantidos e a sociedade assegura a sua voz.

Ter a sociedade discutindo política é bom e isso deve ser enaltecido.

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