O mundo mudou

Por  Alexandre Aagesen
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

O mundo mudou. Eu posso senti-lo nos preços. Eu vejo isso nos números. Ouço isso nos discursos. Começa lentamente, depois de repente. Você olha dados de emprego mais fracos, ganhos médios por hora em queda, PMI cedendo, Confiança do Consumidor caindo. A inflação ainda não está onde gostaríamos, mas os antecedentes, os dados de atividade, o próprio livro Bege do Fed, já começam a mostrar um novo mundo. Ontem, feriado por aqui, foi um dia agitado lá fora. Tivemos o FOMC mantendo juros estáticos, como era amplamente esperado. No discurso, Powell “dezembrou” e trouxe mais elementos de corte do que a equipe dele gostaria. De forma mais prática, o Fed anunciou uma redução significativa do QT – o esforço de retirada de liquidez do mercado. Diminuir um QT que já tinha pouco (ou nenhum) efeito, é quase o equivalente à um QE.

Na secretaria do tesouro, diferente dos anúncios anteriores, o plano de leilão de dívidas não cresceu nesse trimestre. Isso já seria bom sozinho. Também estão prometendo incrementar ligeiramente a oferta de TIPS, títulos indexados à inflação – as NTN-Bs deles. E o que mais surpreendeu o mercado – é foi positivamente – é que pela primeira vez desde 2002, o tesouro está lançando um programa de recompra de títulos, principalmente os mais antigos, para melhorar a liquidez do mercado. Acho que a Yellen acha que a taxa tá gorda e quer comprar barato, mas de qualquer jeito, isso é pressão pra baixo na curva. O mundo está mudando. Tesouro comprando título do tesouro enquanto emite título do tesouro. Isso, caro leitor atento, é fluxo.

E fluxo é o que faz preço. Você até pode argumentar que é o fundamento quem deveria chamar o fluxo, mas o que faz preço de fato, é o fluxo. Se você não está olhando para fluxo, você pode olhar para renda, seja ela fixa, via um contrato que te garante esse caixa (dívida) ou variável, via lucro não reinvestido nas companhias e distribuídos via dividendos (equity). Renda pode ser uma ótima fonte de retorno e uma ótima estratégia de investimento. Mas se você quer price action, você quer fluxo. E tem poucas coisas que puxam fluxo de forma mais repentina – e para fazer preço, isso é o que você mais quer. Uma nota – ou no caso uma perspectiva – positiva vindo da Moody’s é uma coisa que pode ajudar. Ainda ontem, a agência confirmou a nota do Brasil e deu uma sinalização positiva para o outlook, citando surpresas positivas na economia nos últimos anos. Ainda não é o suficiente, mas o cheiro no mundo mudou.

É muito raro o mundo mudar de verdade. Acontece, mas é raro. Mais raro ainda o mundo mudar em um único dia. Mas algumas datas marcam de verdade, e o mundo muda. As certezas caem por terra e a vida toma outro rumo. Todo mundo (com idade suficiente) se lembra onde estava em 15 de setembro de 2008, ou em 8 de novembro de 1991 (ok, esse eu não lembro, no auge dos meus 2 anos), ou em 11 de setembro de 2001, ou, por fim, em 01 de maio de 1994. Dias como esses mudam o mundo. Há 30 anos (e um dia), o mundo mudou. E ficou pior.

Ficou com alguma dúvida ou comentário? Me manda um e-mail aqui.

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Alexandre Aagesen Com mais de 15 anos de mercado financeiro, é CFA Charterholder, autor do livro "Formação para Bancários", host do podcast "Mercado Aberto" e Investor na XP Investimentos

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