É noite no mercado

Em mais um dia com muita volatilidade e pouco sentido na dinâmica de preços, o assunto mais uma vez é a treasury de 10 anos, mesmo em um dia sem mercado de treasuries.
Por  Alexandre Aagesen
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O andar estava silencioso e o escritório vazio enquanto os dois analistas olhavam o fechamento. Os dois tinham a impressão de que podiam ser os únicos players ainda olhando mercado. A BIC azul sem tampa e a HP que compraram no primeiro ano da faculdade completavam o conjunto com um café gelado num copo de plástico. O dia tinha sido estranho, com muita vol e pouco sentido. Se um quisesse vender uma ação, o outro teria que topar comprar, ou não teria saído negócio. A conversa? Treasury de 10 anos, claro. Até num dia melancólico, sem mercado de bonds, o tema era obrigatório. Os dois silenciaram enquanto matutavam que diabos estava acontecendo. Depois da resposta ao NFP de sexta, o fim da tarde de segunda tinha esquisitado tudo. “É” – concordaram – “essa é a palavra”.

Quando o estagiário entrou no andar, os dois lembraram que era semana do saco cheio. Finalmente o garoto ia esticar com eles. “Que bom”, pensou o mais velho. Bem hoje que Evergrande parou de fingir que ia sair uma reestruturação de dívida e que a Country Garden havia dito que ia anunciar a sua própria reestruturação ainda esse ano. A noite ia ser longa. Lá no cantinho, a analista de Oil and Gas ia varar a noite também. Com risco de petróleo subir com a guerra contra o Hamas e o Prates tirando uma política de preços “da cartola” (não foi essa a palavra que ela usou), toda a projeção do setor precisava ser revista.

Pelo menos o estrategista de US já tinha ido embora. O cara tava sempre pessimista, com razão, eu sei, mas… Também, coitado do cara, ia perder o feriado entre PPI na quarta, CPI na quinta e início de mais uma temporada de balanços na sexta. Já era o poker do fim de semana. Melhor ele descansar mesmo. Quando começou a tocar Amado Batista no celular, o analista mais velho sabia que era hora de voltar a focar. Ainda tinha que terminar de olhar o VIX, e o MOVE, e a abertura de China, e o TLT (na falta de Treasury), e o… Se bem que se não olhasse, quem iria criticar ele? Como é que aquele tonto do One Page sempre fala? Risco é o que sobra depois que você (acha que) já pensou em tudo. “Taí”, pensou: “esse vai ser meu lema”. Decidiu tomar mais um café.

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Alexandre Aagesen Com mais de 15 anos de mercado financeiro, é CFA Charterholder, autor do livro "Formação para Bancários", host do podcast "Mercado Aberto" e Investor na XP Investimentos

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