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Durante o Brandcast 2025, o YouTube revelou que suas campanhas em CTV (Connected TV) geram mais de 50 milhões de conversões por mês, com retorno 4,5 vezes maior que o da TV por streaming tradicional. A Nielsen reforçou: a plataforma é a principal referência dos consumidores para descobrir produtos e marcas.
Os dados ajudam a entender por que o YouTube, em 2024, arrecadou quase o mesmo que Disney, Paramount, NBCUniversal e Fox somadas: US$ 36,1 contra US$ 38,7 bilhões em publicidade.
Como destacou Lucas Shaw na Bloomberg, Hollywood volta a tentar enriquecer por meio do YouTube, desta vez pressionada por uma recessão prolongada causada pelo colapso do cabo, pelo encolhimento do negócio de filmes e pela desaceleração do streaming por assinatura. Esse movimento encontra paralelos no setor esportivo. A morte lenta da TV paga e o avanço das plataformas abertas como o YouTube reacendem uma questão central sugerida pelo investidor e analista de mídia e esportes Aaron Miller: o futuro da mídia esportiva passa por um modelo sem paywall, sustentado por publicidade e parcerias estratégicas?
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Na semana passada, a Globo e a CazéTV anunciaram acordo com a DAZN para transmitir todos os 63 jogos da Copa do Mundo de Clubes da FIFA. A Globo exibirá o torneio integralmente no Sportv e, na TV aberta, focará nas partidas dos clubes brasileiros e na final.
A CazéTV, por sua vez, mostrará todos as partidas de forma gratuita no YouTube. É uma mudança de rota: pelo contrato anterior, a Globo teria 40 jogos e CazéTV, 39. Agora, ambas ampliam o pacote — sinal claro de que o conteúdo premium, distribuído abertamente, reforça seu status estratégico.
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Em relação ao canal do influenciador Casimiro, a lógica é simples: o modelo sem pedágio funciona se houver escala, atenção e uma máquina comercial eficiente. Foi assim na Copa do Mundo de 2022, quando todas as cotas de patrocínio – Coca-Cola, Nubank, McDonald’s, iFood, Vivo, Unilever e EstrelaBet- esgotaram-se em 15 dias. Em 2024, a CazéTV vendeu ainda mais espaço, garantindo 12 patrocinadores para os 25 jogos exclusivos da Eurocopa.
O modelo, no entanto, exige mais que audiência. Como alertou Miller, para que esse tipo de distribuição gratuita seja financeiramente viável, é preciso uma estrutura de vendas altamente afinada — seja por meio de redes programáticas como a do YouTube, seja por operações como a da LiveMode, coproprietária e responsável por gerenciar os ativos da CazéTV.
Ligas emergentes ou grandes propriedades que buscam expandir presença em novos mercados têm mais a ganhar com esse caminho.
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É o caso da NFL. A abertura da temporada 2025, em São Paulo, será o primeiro jogo global da liga veiculado ao vivo no YouTube. Para o Front Office Sports, trata-se de uma jogada central na estratégia de internacionalização da NFL.
Transmitir gratuitamente em uma plataforma com mais de 2,5 bilhões de usuários mensais reduz fricções culturais, econômicas e geográficas — e fortalece um modelo baseado em presença cultural, não apenas contratos de assinatura.
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Dan Naylor, ex-KPMG e especialista em patrocínios esportivos, chamou isso de “a próxima fronteira comercial”: não se trata apenas de monetizar audiência, mas de construir um ecossistema global de fãs nativos digitais.
A NFL, que já distribui jogos via Amazon, Netflix e Peacock, agora testa uma lógica complementar: mais expansiva e menos dependente de barreiras de acesso.
Na prática, a indústria volta a flertar com uma estratégia antiga, agora com roupagem contemporânea. Como apontou Nick Meacham, CEO da SportsPro Media, uma tendência discutida no SportsProNYC é a volta da venda de publicidade antes da compra de direitos.
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Emissoras e plataformas se aproximam de grandes marcas com propostas pré-formatadas: “Se eu adquirir esse pacote e te oferecer X ativos por Y, você topa?” Desta maneira, parte do risco é transferido ao anunciante.
É um retorno à publicidade premium — com inventário exclusivo, audiência ao vivo e forte contexto cultural — em contraste com a lógica de anúncios programáticos de baixo custo. O problema? O risco muda de lugar. Se a audiência não vier, a entrega combinada com as marcas desmorona. E o modelo passa a depender mais da força da operação comercial do que da fidelidade dos fãs.
Nesse cenário, o YouTube deixa de ser o inimigo do esporte e passa a ser seu principal vetor de distribuição. O discurso que via as plataformas como ameaça à monetização direta perde força diante da escala e da capilaridade que elas oferecem.
Como resumiu o Unofficial Partner: por que gastar milhões construindo um OTT próprio quando o seu público já está consumindo o conteúdo — clipes, jogos completos, bastidores — no YouTube?
Essa visão se alinha à provocação feita por Roger Mitchell em sua coluna Don’t Be Evil!, publicada no ano passado. Em um exercício de futurologia, ele projeta que a próxima era da monetização esportiva passará por parcerias profundas com plataformas.
A proposta: o Google não paga caro pelos direitos, mas vira sócio no desenvolvimento da propriedade. Ajuda a construir um superhub, opera o marketing, ativa os dados, viabiliza a distribuição. O esporte atenta-se para jogo, e o YouTube cuida do dinheiro.
A tese é sedutora. Mas também perigosa. Trocar a dependência da TV pela subordinação às plataformas pode resolver o presente, e comprometer o futuro.
Ignorar o modelo sem pedágio, porém, parece cada vez mais um erro estratégico. A audiência já se comporta como nativa do ecossistema gratuito. A barreira não é mais o acesso, e sim a relevância.
As ligas que entenderem isso cedo — e montarem teses coerentes com essa lógica — estarão melhor posicionadas para competir não apenas por receitas, mas por relevância cultural.
Em um mercado em que o valor está em engajar melhor, o esporte que se recusa a abrir os portões corre o risco de jogar sozinho.