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Em 2007, quando o Brasil ganhou a disputa para sediar a Copa do Mundo de 2014, começou a ser utilizada a palavra “legado” para justificar os investimentos e defender a ideia de que os benefícios não se restringiriam às vantagens que a nossa seleção poderia ter para conquistar, em casa, mais uma estrela e nem à facilidade que os brasileiros teriam para assistir, em pessoa, partidas emocionantes. A expressão “Legado da Copa” pretendia enfatizar que, terminado o torneio, os brasileiros herdariam inúmeras vantagens com impacto positivo sobre a sua qualidade de vida. Foram muito citados os benefícios decorrentes dos novos sistemas de transporte (aeroportos, portos, metrôs, terminais, etc.), a rede hoteleira atualizada e ampliada, equipamentos urbanos e turísticos revitalizados, modernizados ou restaurados, além dos próprios estádios que passariam a servir de base subseqüente para melhorar a prática esportiva nacional.
Os itens que compunham os investimentos para a Copa e que, portanto, passariam a ser parte integrante do “legado” nas 12 cidades-sede e em suas periferias, puderam ser vislumbrados, com mais clareza, a partir de 2010, quando foi organizada e divulgada a respectiva “Matriz de Responsabilidades”. Dois anos depois, em 2012, esse documento básico ainda previa a implementação de 51 projetos, envolvendo investimentos privados e públicos (federais, estaduais e municipais) que, à época, estavam orçados em quase R$ 18 bilhões. Agora, faltando menos de três meses para o início do torneio, temos plena consciência de que muitos dos investimentos previstos acabaram por não se materializar ou, em alguns casos, estarão apenas parcialmente concluídos em 12 de junho, na abertura da Copa.
A diferença entre as previsões e a realidade está sendo objeto de muita polêmica, cujo exame imparcial demandaria tempo e espaço incompatíveis com as disponibilidades imediatas deste blog. Mas, existe um ponto que pretendo enfatizar no presente tópico: como utilizaremos, cuidaremos e defenderemos a parte do “legado” que efetivamente estará concretizada? Em muitos casos, essa parcela representará investimentos significativos e facilidades com importante impacto sobre a qualidade de vida de numeroso contingente populacional. Pretendo exemplificar esse assunto, com o projeto BRT MOVE, cuja primeira etapa acaba de ser implantada em Belo Horizonte e já promoveu uma grande transformação no sistema de transporte coletivo da cidade.
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Quando completamente implantado, o sistema contará com 500 ônibus e terá mais de 23 km de extensão, em três espaços (Av. Antônio Carlos, Av. Cristiano Machado e Área Central), com cerca de 40 estações de transferência e cinco estações de integração, todas elas modernas e confortáveis. A BHTRANS (Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte) estima que 700 mil passageiros sejam atendidos diariamente pelo MOVE, quando todo o sistema estiver em operação, com redução média de 45% no tempo de deslocamento dos usuários.
Numa época em que o vandalismo de bens públicos e privados está se transformando em hábito corriqueiro de desocupados, recalcados e baderneiros criminosos, traz grande preocupação o destino futuro desse moderno sistema de transporte. Nesse particular, estou convencido de que, para a preservação desse “legado” que efetivamente se materializou e para o seu usufruto continuado e futuro, não basta apenas admirar a passagem dos belos ônibus articulados em suas vias especiais. É preciso, principalmente, que a população se mobilize preventivamente em sua defesa, cobrando dos três níveis de governo a ativação de um programa específico de segurança patrimonial e de policiamento efetivo. Afinal, mais do que defender o novo padrão de eficiência e conforto representado pelo BRT MOVE, precisamos lembrar à administração gestora e às autoridades policiais de que essa parcela do “Legado da Copa” resultou, no fundo, do nosso esforço contributivo com o sofrido pagamento de impostos. O equipamento é nosso e devemos exigir a sua proteção enquanto estivermos pagando a conta.