Financiamento Habitacional (5)
Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores
Nesta série já mencionei a importância das regras de remuneração das Cadernetas de Poupança e do FGTS para a fixação das espécies “B” (correção monetária) e “C” (juros ou remuneração propriamente dita do capital), conforme a notação que venho adotando para identificar as espécies de pagamento embutidas nos financiamentos habitacionais. Essa importância decorre de duas circunstâncias: boa parte do capital utilizado pelos agentes financeiros para os empréstimos habitacionais é oriunda desses dois fundos (a poupança voluntária das Cadernetas e a poupança compulsória do FGTS); mesmo no caso de “funding” formado a partir do mercado de capitais, com a captação livre e juros não limitados legalmente, as respectivas remunerações continuam fortemente balizadas pelas duas fontes principais já mencionadas, que funcionam como paradigmas. Assim, para os propósitos pretendidos nesta série, há que se examinar a natureza e o comportamento da remuneração dessas fontes de capital, seja no passado recente, seja prospectivamente. Antes disso, no entanto, eu gostaria de fazer um registro importante para a compreensão geral dos processos que estamos examinando. Quando os agentes financeiros utilizam os recursos da Caderneta de Poupança ou do FGTS como “funding” para os financiamentos habitacionais, o seu trabalho de intermediação e administração das operações é remunerado pelo que se convencionou chamar de “spread bancário”, ou seja, pela diferença entre o custo (B + C) cobrado do tomador do empréstimo e o custo (B + C) pago na captação ao titular da poupança ou do capital investido.
O regime de remuneração das Cadernetas de Poupança sofreu modificações recentes (03/05/2012). Mas, a parcela “B” (correção monetária) não foi alterada e continua sendo creditada a seus titulares com base na variação mensal plena da TR – Taxa Referencial estabelecida pelo Banco Central. As modificações concentraram-se na parcela “C” (juros ou remuneração propriamente dita do capital). Os depósitos anteriores a 03/05/2012 continuam sendo remunerados com juros “C” de 0,5% ao mês, que correspondem à taxa capitalizada de 6,17% ao ano. Os depósitos feitos posteriormente a essa data (03/05/2012) passaram a ser remunerados com juros “C” equivalentes aos anteriores (6,17% ao ano) sempre que a taxa SELIC (Sistema Especial de Liquidação e Custódia, que corresponde aos juros básicos da economia fixados pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central) estiver acima de 8,5% ao ano. Quando a mesma taxa SELIC estiver em níveis iguais ou menores do que 8,5% ao ano, os depósitos feitos a partir de 03/05/2012 serão remunerados com juros “C” correspondentes a 70% dessa mesma taxa SELIC.
No caso da poupança compulsória no FGTS não ocorreram mudanças recentes e todos os depósitos continuam sendo remunerados com a parcela “B” (correção monetária) correspondente à aplicação plena da TR – Taxa Referencial e com a parcela “C” (juros) calculados pela taxa nominal de 3,0% ao ano (correspondendo, por analogia, a uma taxa anual capitalizada de 3,12%).
Por conta da regulamentação legal e administrativa, a fixação da TR, conquanto continue sendo um ato discricionário do Banco Central, é obrigada a manter certa aderência ao valor da SELIC e não pode variar de modo totalmente aleatório. A título de exemplo, a média da TR nos últimos 10 anos, situa-se em torno de 1,8% ao ano, ou seja, bem abaixo dos níveis de inflação. Mas, por causa do Redutor (R) embutido no seu cálculo, a TR alcançou o valor “zero” em 17 dos 45 meses compreendidos no período de setembro de 2009 a maio de 2013 e permanece rigorosamente nula desde setembro de 2012. Na realidade, por sua estrutura de cálculo, concebida à época do Plano Collor II para evitar a contaminação dos períodos futuros com a memória inflacionária carregada em cada mês, a TR apresenta mais a natureza de uma taxa de juros do que a de um corretor inflacionário. Daí a forte aderência dela às outras taxas, incluindo a SELIC, a TBF, a TJLP e demais mecanismos assemelhados. Em geral, sempre que a SELIC apresenta valores iguais ou menores do que 9,0% ao ano, a TR tende a ser inferior a 2,3% ao ano, com uma única e pouco expressiva exceção nos últimos anos. Assim, para os propósitos simplificados da análise feita neste blog, pode ser admitido, com alguma segurança, que a TR continuará nula ou muito próxima de zero nos próximos meses, mesmo se o Banco Central optar pela continuidade da elevação dos juros básicos da economia dentro do limite mencionado.
Para a conclusão desse exame, vou admitir que a taxa de inflação anualizada da nossa economia não excederá o limite superior da meta considerada pelo governo (6,5%). Dentro desse limite, e assumido um valor nulo ou próximo de zero para a TR, pode-se concluir que os financiamentos habitacionais ainda permanecerão muito vantajosos e “com juros negativos” em todos os contratos que vierem a ser celebrados com taxas de remuneração do capital “C” iguais ou inferiores a 6,5%. Essa é uma possibilidade concreta para o crédito imobiliário das faixas inferiores de renda do Programa “Minha Casa, Minha Vida” (“C” = 4,5%) e pode ser explorada, também, para outros estratos mais elevados, embora com vantagens decrescentemente menos pronunciadas para o tomador dos empréstimos. De todo modo, os parâmetros que apresentei expeditamente nesta série, poderão servir de base para que cada comprador examine a sua própria realidade e situe o nível de vantagem que ainda poderá ser obtido nas operações que vier a realizar em futuro próximo.