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Representantes legais de empresas estrangeiras que operam no Brasil acompanham com apreensão a ofensiva do Supremo Tribunal Federal (STF) contra o X, rede social de Elon Musk, conhecida como Twitter até pouco tempo atrás. Por desobedecer a ordem de bloquear perfis acusados de ilegalidades, a plataforma ficou inacessível para a grande maioria dos brasileiros no último fim de semana. A ordem partiu do ministro Alexandre de Moraes e, no centro dela, está justamente a ausência de um representante que respondesse legalmente pela empresa no país.
A necessidade de ter uma representação vale para toda empresa que “põe o pé” no Brasil. No caso do X, existe uma exigência regulatória, do Marco Civil da Internet, válida para redes sociais que começam a operar com usuários no país. De qualquer forma, a figura do representante é necessária para lidar com questões financeiras e tributárias, independentemente da indústria da qual a companhia faz parte.
A última pessoa que exerceu essa função no X foi a advogada Rachel de Oliveira Villa Nova Conceição. Na ficha cadastral da empresa na Junta Comercial de São Paulo, consta que ela foi nomeada administradora da empresa em abril deste ano. Quatro meses depois, ela renunciou à posição. O documento mostra que a carta de renúncia foi entregue no último dia 17 de agosto, mesmo dia em que a empresa anunciou que fecharia seu escritório no Brasil. Em postagens no perfil do X na própria plataforma, a companhia informou que Moraes havia ameaçado multar e até prender a administradora.
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Na noite da quarta-feira passada, Moraes estabeleceu um prazo de 24 horas para que um novo representante legal fosse indicado. Como a ordem não foi respeitada, veio a ordem de suspensão da rede social.
“Eu acredito que ninguém vai querer colocar esse chapéu por enquanto”, avalia Ramon Fernandez, sócio do Mourão Campos Group, escritório especializado em representação legal. O advogado ocupa a cadeira de administrador de dezenas de empresas estrangeiras que estão estruturando negócios no Brasil.
Segundo Fernandez, o profissional que assumir essa posição corre o risco de ter os bens pessoais bloqueados ou até mesmo de ser preso. A legislação, explica, responsabiliza criminalmente o administrador em casos comprovados de que o profissional agiu de má-fé para obter lucros a partir de práticas ilegais.
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Legalmente, segundo o advogado, o risco para um recém-chegado é zero. Mas diante dos últimos acontecimentos, com a alegação de multas e ordem de prisão contra a antiga administradora, não há garantias de que a legislação vai ser interpretada ao pé da letra. “Eu, pessoalmente, não teria coragem de ocupar essa cadeira”, afirma.
Marcus Valverde, sócio do Marcus Valverde Sociedade de Advogados, relembra que os maiores escritórios de advocacia do país deixaram de atuar com representação de sociedades estrangeiras que abriam filiais no Brasil depois que advogados foram responsabilizados por dívidas das empresas.
“A questão da multa e prisão do administrador é porque ele desobedeceu uma ordem judicial [de bloqueio de perfis e remoção de conteúdo]”, afirma Valverde, que diz ver excesso dos dois lados da história. “Normalmente, quando uma empresa não concorda com uma decisão judicial, ela contesta em foro apropriado e não simplesmente desobedece”. Por outro lado, observa, a falta de diretrizes para disciplinar e regular plataformas de informação deixa todo o poder sobre o tema no STF e nos juízes.
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Fernandez acredita que o episódio pode ser um freio à vinda de empresas estrangeiras para o Brasil. “Se a autoridade judicial máxima do Brasil permite que se atropelem os ritos e roteiros processuais, a gente fica um pouco preocupado”, afirma. “Sendo chancelada por uma decisão colegiada do Supremo, cria um precedente muito perigoso”.
Valverde, por sua vez, não acredita que o episódio vai extrapolar para outras empresas. “O X não teria sido tirado do ar se a empresa tivesse simplesmente contratado um advogado para entrar com um recurso extraordinário no STF e assim por diante”, afirma. Segundo o advogado, outras redes sociais que estão no Brasil têm como prática contestar determinações judiciais com as quais não concordam.