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O plano de Décio Oddone na Brava Energia: “nunca se consumiu tanto petróleo”

CEO da empresa que resultou da combinação entre 3R e Enauta diz que mercado será dominado por quem produzir petróleo de forma mais barata e com melhor eficiência de carbono

Mitchel Diniz

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Décio Oddone carrega o nome do avô, geofísico pioneiro que descobriu o primeiro poço de petróleo perfurado no Brasil, mais de 80 anos atrás. “Eu sempre quis trabalhar nessa indústria por causa dele”, afirma o executivo, gaúcho de Lavras do Sul, radicado no Rio de Janeiro há quarenta anos, mas que não perde o sotaque do sul, o amor pelo Grêmio e por um bom churrasco – “nessa ordem de preferência”, frisa.

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A trajetória de Oddone guarda semelhanças com a do seu antepassado. Ambos foram crias da Petrobras (PETR4). O avô, diretor de exploração e produção da estatal no final dos anos 1950. O neto foi presidente da petrolífera na Bolívia, atuou em outras subsidiárias da empresa fora do Brasil e também teve seu pioneirismo na indústria do petróleo: estava na equipe da primeira perfuração de poços em águas profundas.

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Indústria em movimento

Da terra firme ao alto mar, Oddone acompanhou as transformações dessa indústria nas últimas décadas, inclusive como diretor da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). E agora, aos 64 anos, chega ao comando da Brava Energia, empresa independente de produção de petróleo e gás, fruto da combinação de duas junior oils: a 3R Petroleum e a Enauta, onde Décio atuava como CEO. 

“A gente vai buscar maximizar o valor para os nossos acionistas, com foco em uma operação segura, eficaz, eficiente e rentável”, disse o executivo, em toque simbólico de campainha na B3, pela chegada do novo ticker da empresa (BRAV3) à Bolsa, com estreia prevista para a próxima segunda-feira (9). 

Décio Oddone (ao centro) e a diretoria-executiva da Brava Energia em toque simbólico da campainha na B3 (Crédito: InfoMoney)

A Brava já começa sua jornada com capacidade de produção diária de 100 mil barris de petróleo equivalente (boe, na sigla em inglês) e potencial para chegar aos 120 mil no ano que vem. Assim, supera os números da PRIO (PRIO3) e se torna a segunda maior produtora independente após a Petrobras – ainda líder disparada, com média de 2,7 milhões de barris diários no segundo trimestre de 2024.

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Nome reflete atual fase

O nome da nova empresa, explica Oddone, remete à “brasilidade e bravura” e combina mais com o perfil diversificado do negócio. A Brava condensa a experiência das duas empresas na exploração de campos maduros – sendo os principais, o campo de Papa-Terra e o polo Potiguar, oriundos da 3R –  e a empreitada greenfield da Enauta com o Campo de Atlanta, na Bacia de Santos. 

Leia mais: Brava Energia interrompe produção em Papa Terra após pedido de informação da ANP

Desde o início de suas atividades, em 2018, Atlanta já produziu mais de 30 milhões de barris de petróleo e a produção diária, hoje, gira em torno de 20 mil barris. Um navio-plataforma (FPSO) com capacidade para processar mais 50 mil barris está em fase de instalação no campo.

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Em entrevista ao InfoMoney, Oddone afirmou que a sociedade não vai deixar de ser dependente de petróleo, mas a tendência de redução do consumo é inevitável. Reforçou que agora é hora de produzir. O executivo também voltou a falar do desejo de fazer da Brava uma consolidadora no segmento independente de óleo e gás. E revelou ser ainda favorável a acordos com a PetroReconcavo (RECV3), player que estava em tratativas com a 3R antes da proposta da Enauta dar origem à nova companhia. E, para quem vê uma queda no consumo do petróleo, ele ressalta: hoje se consume a commodity como jamais se consumiu.

Esta entrevista faz parte do Guideline, série de entrevistas do InfoMoney com executivos e especialistas de referência sobre visões estratégicas em diferentes setores. Confira as entrevistas já publicadas:

InfoMoney: Ao assumir a Enauta, em 2020, você chegou a dizer que era preciso ser rápido na exploração de petróleo, devido à transição energética. Ainda mantém essa visão?

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Décio Oddone: Sim, acredito que ainda temos muitas décadas de dependência do petróleo, mas o mundo não espera, e as oportunidades passam rápido. No Brasil, grandes projetos levam em média 10 anos para se concretizar. Mas, se a gente tiver, e vai ter, uma redução do consumo de petróleo, imagino que a partir da próxima década, essa necessidade de aproveitar as oportunidades é cada vez mais premente. No futuro, o mercado será dominado por quem conseguir produzir petróleo de forma mais barata e com melhor eficiência de carbono. É isso que a sociedade vai estar demandando. Eu não acredito que ela vai ficar independente do petróleo, mas ela vai ser mais seletiva.

IM: Como avalia a evolução desse segmento independente de empresas do setor de óleo e gás?

DO: A indústria brasileira teve alguns grandes momentos. O primeiro foi o fim do monopólio da Petrobras, no final dos anos 90, que permitiu que outras empresas explorassem petróleo e gás no Brasil, brasileiras e estrangeiras. Houve um crescimento muito grande no interesse por investir em petróleo no país, mas nem todas tiveram sucesso. Depois a Petrobras começou a vender ativos e criou um mercado. Esse é um negócio de escala, que é necessária para ter custo de capital, ser eficiente, atrair e manter talentos. Em 2020 já estava claro que iríamos passar por um processo de consolidação na indústria. Acho que a Brava está abrindo um caminho no setor.

IM: A era da exploração de campos maduros da Petrobras acabou?

DO: Eu acho que não.  Campos que foram operados por empresas grandes, como a Petrobras, às vezes mudam até quatro vezes de proprietário e empresas mais focadas vão entrando. A gente viveu apenas o primeiro ciclo de revitalização de campos maduros. A própria Brava tem ativos mais maduros que outros, que a gente mesmo pode pensar em fazer uma gestão mais ativa de portfólio. Estamos avaliando isso agora.

IM: Mas o foco da empresa vai ser produzir mais do que explorar, certo?

DO: Sem dúvida. O nosso foco agora é extrair valores dos nossos ativos. Estamos fazendo uma reavaliação de todo o portfólio da companhia, tanto dos ativos que eram da 3R quanto os da Enauta para desenhar um plano de cinco anos de atuação. Assim poderemos aplicar adequadamente o nosso capital nos ativos que vão dar maior retorno para a gente. O nosso jogo não é um jogo de volume, é um jogo de rentabilidade. Estamos iniciando o processo de captura das sinergias, que são parcela importante do valor que a gente vai gerar também nessa transação. Uma empresa independente tem uma agilidade, tem uma flexibilidade, tem uma maior capacidade de fazer coisas de maneira mais rápida que as grandes empresas.

IM: Você vem falando sobre o papel consolidador que a nova empresa deve ter. Disse, na época do memorando de entendimento entre Enauta e 3R, que a PetroReconcavo caberia no negócio…

DO: Eu falei que caberia e continua cabendo. A gente é favorável a fazer acordos operacionais com a PetroReconcavo. Consolidação é algo que acho que vai acontecer no setor, inexoravelmente. Mas para consolidador, primeiro é preciso entregar. A gente tem que pegar os ativos que temos agora, trazê-los para uma operação segura, eficiente, e com o resultado acontecendo, ganha capacidade de remunerar bem os nossos acionistas, seja através de dividendos, seja através de crescimento. Consolidação é uma forma de crescimento.

IM: Como era a relação da Enauta com a 3R antes da combinação de negócios? Como é estar em uma diretoria executiva com antigos concorrentes?

DO: Essa é uma indústria pequena, todo mundo já se conhecia, acho que isso ajuda no processo de integração. É, essencialmente, uma indústria associativa, não trabalhamos competindo por mercado. É mais comum a parceria, pois atuar em conjunto ajuda a diminuir riscos. A competição acontece na nossa indústria quando tem leilão.

IM: Qual sua visão atual sobre o mercado de óleo e gás, com a discussão das mudanças climáticas cada vez mais em voga?

DO: Havia uma expectativa de redução mais rápida da demanda por petróleo que não se concretizou. Tinha essa visão eurocêntrica de que seria mais fácil reduzir o hidrocarboneto e substituir o petróleo, que ganhou força a partir da assinatura do Acordo de Paris, em 2015. Se olhar para a história da energia, nunca uma fonte energética foi substituída por outra. Em 1800, na época da Revolução Industrial, a biomassa era a única fonte de energia disponível. Hoje a gente consome, em termos absolutos, mais biomassa do que consumia quando a biomassa era a única fonte disponível. Veio o carvão e hoje a gente está consumindo mais carvão do que jamais consumiu. Hoje a gente também está consumindo petróleo como jamais consumiu. Não se conhece sociedade desenvolvida que não seja intensiva no uso de energia. Então, pensar em restrição de oferta é criar problema. É gerar aumento de custos, inflação, que vai bater nos mais pobres. Então, não vejo um cenário de redução de oferta de energia, mas sim de agregação de novas ofertas, de forma gradual, com o apoio da tecnologia.

Mitchel Diniz

Repórter de Mercados