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Valorização da Bolsa não implica simpatia por Bolsonaro

Pesquisas recentes, simpáticas ao candidato do PSL, acompanharam uma onda de otimismo no mercado financeiro. Ao contrário do que tem sido comum ler na imprensa, isso não significa necessariamente que Bolsonaro é um excelente candidato na visão dos investimentos. Para que o retorno esperado dos ativos cresça com junto com Bolsonaro, basta que ele seja visto como melhor do que o PT.
Por  Pedro Menezes
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Financistas são treinados para tomar decisões sob incerteza. Pensam sempre no retorno esperado de uma operação, no risco de dar errado e na chance de dar certo.

Quando a eleição presidencial influencia o preço de ativos – é um mau sinal que isso aconteça tanto no Brasil –, o candidato que joga os preços para cima costuma ser retratado pela imprensa como alguém que conta com a simpatia “do mercado”.

Poucas palavras são tão mal utilizadas pela imprensa quanto “mercado”, que geralmente tem a função de dar a credibilidade que o jornal não teria escrevendo “uns 2 ou 3 figurões da Faria Lima que foram fontes da reportagem”.

Noutros casos, a abreviação que os jogadores do mercado financeiro usam para referir a si mesmos vira linguagem jornalística.

Miriam Leitão, uma das principais jornalistas de “O Globo”, escreveu o seguinte:

“Parte do mercado diz que Bolsonaro fará as reformas econômicas necessárias e equilibrará as contas públicas. Mas é uma convicção recente. Até pouco tempo atrás, tinha apenas dúvidas em relação a ele.”

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E segue por todo o texto explicando que não faz sentido a recente euforia refletida nos preços de ações, taxa de câmbio, curva de juros e outros ativos financeiros. As ações da Petrobras tem simbolizado esse fenômeno, subindo muito quando Bolsonaro aparece bem nas pesquisas.

Ao contrário da conclusão de Leitão e muitos jornalistas, não é necessariamente verdadeiro que “o mercado [financeiro, Miriam! Não é qualquer mercado, é o financeiro!] escalou Bolsonaro” como representante do reformismo e bom senso econômico.

Primeiramente, essa resposta vai além do que a evidência nos informa. Uma maior probabilidade de vitória de Bolsonaro leva os agentes a esperarem um retorno maior dos ativos denominados em real, na comparação com os outros candidatos. É só isso que a valorização nos diz – e mais nada. A interpretação deve ser sempre relativa, e não absoluta.

É possível que esse movimento se deva à expectativa de que Bolsonaro seja excepcional para a economia e vá nos colocar em rota de crescimento, aumento da produtividade, redução da desigualdade e insegurança jurídica?

Seria uma explicação teoricamente possível para o fenômeno, mas não necessariamente a verdadeira. Afinal, um time ser melhor do que o Vasco não implica que seu ataque é formado por Neymar, Messi e Cristiano Ronaldo.

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Bolsonaro não tem um programa crível para o ajuste fiscal. O que ele já falou sobre reforma da previdência (mudança para regime de capitalização) levaria a aumento do déficit público.

As contas apresentadas por sua campanha para arrecadar um trilhão de reais com vendas de ativos estatais não fecham e merecem definitivamente o carimbo de lorota quando acompanhada da promessa de não incluir Petrobras, Caixa ou Banco do Brasil nesse pacote. A proposta de zerar o déficit em um ano é completamente irreal.

As seguidas declarações prometendo redução de impostos são fiscalmente irresponsáveis, com ares de economia freestyle quando Bolsonaro promete que a medida aumentará a arrecadação, porque a curva de Laffer não tem sempre inclinação negativa.

Como justiça, vale ressaltar que o Brasil tem se mostrado avesso a discussões eleitorais sérias e os planos de campanha dizem muito pouco sobre o governo de fato. O próprio Alckmin, tido por alguns como o mais responsável fiscalmente, não tem um plano de ajuste fiscal que mereça esse nome.

Além disso, como a própria Miriam Leitão escreve, o histórico de Bolsonaro é desastroso. Como deputado, votou seguidamente contra reformas liberalizantes. Seus discursos sempre foram anti-austeridade e bastante intervencionistas ao longo da carreira.

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O mercado financeiro paga bem a ótimos economistas para informar as decisões de seus operadores. Podem existir irracionalidades nas compras e vendas, mas eu também estou exposto a esse mal enquanto escrevo esse texto e você, leitor, pode ser irracional numa leitura, inclusive vale a pena pensar nisso antes de xingar um jornalista na internet.

Por isso, não gosto de argumentos que envolvem irracionalidade coletiva ou incompetência dos nossos financistas.

Em geral, os economistas mais influentes do mercado financeiro são bastante céticos com relação ao programa de Bolsonaro quando vão à imprensa. Nos relatórios que circulam com frequência entre os mais respeitados bancos e fundos de investimentos, sobram ressalvas ao capitão.

Existe uma outra explicação: o mercado financeiro não necessariamente acha que Bolsonaro é um cracaço, mas vê o PT como um desastre. Observando o que dizem os economistas e financistas, me parece a explicação mais adequada.

Bolsonaro pelo menos já disse que o início do seu governo será de sacrifícios, se comprometeu com reformas e adotou um discurso econômico liberal durante toda a campanha.

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Se será capaz de entregar isso, é outra discussão, mas – ao contrário de Haddad – ao menos o candidato do PSL se compromete com uma ou outra medida de austeridade e não depende do apoio político dos sindicatos de servidores, como o PT.

Acima de tudo, é esperado que o valor da Petrobras caia conforme aumenta a probabilidade do PT passar longe da empresa. Até mais do que por corrupção, a Petrobras foi destruída por intervenções microeconômicas do governo Dilma, que usou a estatal para controlar preços de petróleo.

Haddad não foi sequer capaz de fornecer uma mínima autocrítica sobre Dilma. É surpreendente, dado que ele o fazia antes de ser candidato, como num famoso artigo para a revista piauí. O PT culpa Cunha, tucanos e pautas-bombas de 2015 pela crise, ignorando que o país só viveu um colapso nas contas públicas após anos de irresponsabilidade e pedaladas que remetem ao fim do governo Lula.

A imprensa tem visto os movimentos recentes do mercado financeiro sem discutir o que é realmente importante. O assunto não deveria ser Bolsonaro e o otimismo dos investidores. Acredito que não há tanto otimismo (quando há, é relativo à ruindade dos adversários) com o plano do candidato, até porque não há plano.

Leia mais: 
Por que a bolsa disparou e o dólar despencou com chance maior de Bolsonaro ser presidente?

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O mais relevante seria discutir como o PT, que já assumiu o país noutro cenário de incerteza e desajuste fiscal, conseguiu perder tanta credibilidade a ponto de ser preterido por um outsider cujos votos sobre reformas estavam alinhados com o Paulo Paim até outro dia.

Haddad, ex-prefeito elogiado pela responsabilidade fiscal, passa menos confiança do que um sujeito que nem tem um plano de ajuste. Nada mais que o esperado, dado o desdém com que trata o descontrole fiscal e o respeito incompreensível pelo governo Dilma, como demonstrado na bancada do JN.

Essa mudança de perspectiva é importante. Agora, não considero que seja jornalisticamente relevante discutir eventuais irracionalidades do mercado financeiro em seu otimismo com Bolsonaro, porque as evidências de otimismo são muito escassas ou relativas, e identificar irracionalidades é basicamente o que faz esses caras serem tão bem pagos. Quem discordar, que discorde com o bolso. Dá pra ganhar dinheiro grosso assim, mas muita gente quebra achando que é fácil.

Seria muito mais útil, para a eleição e o debate público, se a gente perdesse mais tempo discutindo como é que o PT virou sinônimo de desastre econômico na comparação com qualquer um. Depois disso, caberia discutir por que Ciro Gomes também é visto com pouca simpatia, o que seria assunto para outro texto – dois outros desse blog, sobre BNDES e reforma trabalhista, talvez ajudem na conversa.

Acima de tudo, se a sociedade, os jornalistas e Miriam Leitão insistirem mais em discutir como é que o PT ficou com ainda menos credibilidade do que Bolsonaro, ao invés de apenas cantar irracionalidades do mercado, talvez os petistas reconheçam os erros de Dilma antes de 2022.

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Pedro Menezes Pedro Menezes é fundador e editor do Instituto Mercado Popular, um grupo de pesquisadores focado em políticas públicas e desigualdade social.

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