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Consultoria e assessoria: quando o alinhamento com o cliente vale mais que a comissão

Especialistas mostram como a ética e o longo prazo se tornaram diferenciais competitivos no mercado financeiro

Daniel Navas

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No mercado financeiro, o avanço da regulação e a busca por transparência estão forçando consultores e assessores a repensar a forma como se relacionam com seus clientes. E aí, a questão que paira é: como garantir que a recomendação de investimento seja realmente feita no melhor interesse do investidor e não do profissional que a oferece?

Esse foi o ponto de partida da palestra “Conflitos de Interesses em atividades reguladas: a fronteira entre a consultoria de valores mobiliários e a assessoria de investimentos”, realizada no Congresso Planejar 2025, nesta terça-feira (4).

O debate reuniu representantes da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), além de especialistas da área jurídica e de certificação, para discutir como a ética e o alinhamento de incentivos se tornaram temas centrais na atuação dos profissionais do mercado financeiro.

Remuneração e independência

Para André Pássaro, superintendente de relações com o mercado e intermediários da CVM, a evolução recente da regulação transformou a dinâmica entre assessores e intermediários. “Tivemos várias mudanças que alteraram o cenário de exclusividade do assessor. Hoje, ele pode trabalhar com mais de um intermediário, por exemplo”, conta.

E essa flexibilização ampliou a competição, mas também trouxe novos dilemas. Segundo Pássaro, a forma de remuneração ainda é o principal foco de conflito.

“Um conflito que ainda é muito relevante está na forma de remuneração entre o assessor e o consultor. Já vemos escritórios deixando de receber comissões por produto distribuído e migrando para modelos de remuneração fixa”, afirma.

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A mudança, diz ele, busca reduzir incentivos de curto prazo e alinhar o interesse do profissional ao do cliente. E o diferencial competitivo está em entender o cliente e construir um relacionamento de longo prazo, e não apenas vender produtos que gerem maior retorno imediato.

Ética e boa-fé: o dever de denunciar e educar

Durante o encontro, a procuradora federal da CVM e professora da GVLaw, Ilene Najjarian, reforçou que a ética não é apenas uma recomendação moral, é uma obrigação legal. “A Lei 179 deixa claro, e complementa a 178, ao determinar que o profissional deve agir com ética e boa-fé”, explica.

Para Ilene, o planejador financeiro precisa desenvolver uma visão holística do cliente para evitar conflitos de interesse na prática. Isso inclui entender o perfil de risco, o conhecimento do investidor e sua tolerância emocional às oscilações do mercado. “Você [como assessor, planejador ou consultor] precisa saber se o investidor tem estômago para aguentar as oscilações de investimentos mais arriscados”, esclarece.

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Ela destaca também a importância dos controles internos, especialmente em estruturas grandes, com produtos “in-house” ou fundos de fundos.

“É preciso muito cuidado com produtos sofisticados e estruturas de blindagem. O planejador deve rastrear a origem dos papéis e denunciar a CVM qualquer indício de conflito.”

Segundo a procuradora, essa postura ativa de denúncia e vigilância ajuda a educar o mercado e fortalecer a confiança dos investidores.

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O papel da Anbima e o desafio da comunicação

Na ponta da autorregulação, Tatiana Itikawa, superintendente de Representação de Mercado da Anbima, destacou que um dos principais esforços da entidade tem sido padronizar a forma como as informações chegam ao investidor. “Discutimos com a CVM modelos de padronização da informação. Sabemos que ainda há uma jornada pela frente, mas precisamos tornar as comunicações mais claras e acessíveis”, diz.

De acordo com Tatiana, o foco da Anbima é a centralidade do investidor, tema que tem pautado diversas pesquisas e ações de educação financeira nos últimos anos.

“O consultor pode recomendar um produto da casa, desde que deixe claro que essa é a melhor opção entre todas”.

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Ela lembra ainda que a educação financeira não deve ser apenas voltada ao público final. Mas também aos profissionais de mercado, que precisam estar preparados para traduzir a complexidade dos produtos em linguagem simples e transparente.

Da regulação à prática: a confiança como ativo principal

A palestra deixou uma mensagem clara: os conflitos de interesse são inevitáveis, mas podem (e devem) ser geridos com transparência, ética e foco no cliente.

O futuro da consultoria e da assessoria passa menos por regras formais e mais pela credibilidade que cada profissional constrói em sua relação com o investidor. Como sintetizou André Pássaro, “é preciso deixar de pensar no resultado imediato e olhar para o longo prazo”.

E nesse novo cenário, ética e confiança não são apenas valores. São vantagens competitivas.