Lobby das mineradoras doou R$ 2,5 milhões a deputados engajados no caso Samarco

Situação de constrangimento moral coloca à tona questões de doações para campanhas eleitorais e os limites do lobby legítimo no campo da política brasileira

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Na quinta-feira (12) da semana passada, foi instalada oficialmente na Câmara dos Deputados a Comissão Externa destinada a acompanhar e monitorar os desdobramentos do desastre ambiental ocorrido em Mariana (MG) e região, após o rompimento de duas barragens da empresa Samarco – uma joint venture das mineradoras Vale (VALE3; VALE5) e BHP Billiton. Para ela, foram designados 19 deputados majoritariamente mineiros e capixabas, de dez partidos, que irão acompanhar as providências tomadas pelos atores envolvidos na catástrofe.

O fato curioso, no entanto, provém do questionamento sobre a capacidade de tais parlamentares tomarem decisões sobre as companhias, que, em boa parte dos casos, contribuíram para seu sucesso nas urnas durante a disputa eleitoral do ano passado. De acordo com levantamento feito pelo portal UOL, treze deputados que compõem a comissão externa foram beneficiados por doações de empresas ligadas à Vale, em valores que variam de R$ 465 a R$ 500 mil. Ao todo, revela o jornal O Estado de S. Paulo, eles receberam cerca de R$ 2,5 milhões para bancarem seus custos de campanha em 2014. É fato que a cifra não é tão expressiva se for levada em consideração a média por parlamentar e observando-se os gastos que normalmente cada candidato a um assento na Câmara tem.

No entanto, em sua totalidade, o valor está longe de ser desprezível e supera inclusive o total de recursos arrecadados pelo coordenador desta comissão, o deputado Sarney Filho (PV-MA) – único membro que não representa os estados de Minas Gerais e Espírito Santo no grupo de parlamentares. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral, o maranhense declarou ter recebido R$ 1,86 milhões entre doações de pessoas e empresas – mas, a princípio, nenhuma relacionada com o setor de mineração. Somente a Vale doou R$ 4,2 milhões a deputados, de acordo com informações do Estadão Dados.

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Os temores de quem entende do assunto são de que o lobby das mineradoras exerça influência relevante na atuação dos parlamentares na situação. A tragédia que afetou municípios dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo contabiliza sete mortos identificados, 18 desaparecidos e centenas de desabrigados – sem contar nos incalculáveis danos ambientais. Apuração do UOL mostra que, entre os 53 deputados federais mineiros, 33 foram beneficiados com contribuições de empresas ligadas à Vale, por meio de doações diretas ou indiretas. Ao passo que, no Espírito Santo, dos dez representantes do estado, oito foram patrocinados pela companhia, que gastou R$ 80 milhões nas últimas eleições, para bancar três candidaturas presidenciáveis, 18 a governador, 19 a senador, 261 a deputado federal e 599 a deputado estadual. Das 35 legendas em atividade no Brasil, 27 receberam algum benefício da Vale, conta o jornalista Felipe Amorim.

Para se ter uma ideia do tamanho da influência política dessas companhias, basta lembrar da criação da comissão especial para discutir o Código de Mineração. O grupo foi mantido em funcionamento na Câmara por sete meses, mas foi encerrado sem votar o relatório produzido por Leonardo Quintão (PMDB-MG) – outro parlamentar cuja campanha foi patrocinada por empresas do setor, mas que alega que o apoio não interfere em seu trabalho. O código da mineração é uma discussão que ganhou força na casa, mas que não encontra bases para avanços suficientes que se convertam em resultados concretos.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.