Reforma tributária prevê fusão de 5 impostos em IVA dual e 3 alíquotas; veja parecer do relator

Calendário do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), prevê votação do texto na primeira semana de julho, antes do recesso parlamentar

Marcos Mortari

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O relator da Proposta de Emenda à Constituição que trata da reforma tributária dos impostos sobre o consumo (PEC 45/2019), deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), protocolou, nesta quinta-feira (22), parecer preliminar para a matéria que será discutida no plenário da Câmara dos Deputados.

Clique aqui para acessar o documento na íntegra.

O texto, conforme anteriormente sinalizado pelo relator, prevê a substituição de cinco tributos por um Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) de caráter dual. Os impostos que deixariam de existir são o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), a contribuição para o PIS/Pasep (Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público) e a Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), em nível federal.

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No nível subnacional, seriam substituídos o estadual ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e o municipal Imposto sobre Serviços (ISS). Os dois novos impostos ‒ IVA federal e IVA subnacional ‒ seriam similares, mas geridos separadamente, de modo a assegurar maior autonomia federativa.

O substitutivo cria um Conselho Federativo para a gestão do novo imposto de forma compartilhada entre Estados, Distrito Federal e municípios. O grupo seria dotado de independência técnica, administrativa, orçamentária e financeira, com decisões tomadas a partir de votos distribuídos de forma paritária entre os entes.

O novo modelo prevê uma base ampla tributária, não cumulatividade plena, com a incidência “por fora” da cadeia. Isso significa que deixaria de existir o chamado “efeito bola de neve” na cobrança de impostos, em que um tributo recolhido entra na base tributável na etapa seguinte da cadeia produtiva.

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O desenho é viabilizado por um sistema de créditos em que o imposto é efetivamente pago apenas pelo consumidor final e no destino ‒ não mais sobre a origem, como ocorre em muitos casos. Além disso, o modelo promete a efetiva desoneração completa sobre exportações e investimentos, o que deve aumentar a competitividade de produtos brasileiros no mercado.

O projeto em discussão pelos deputados também prevê a criação de um Imposto Seletivo (IS), que poderá incidir sobre a produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente a serem regulamentados por lei complementar.

Conforme anunciado pelo relator Aguinaldo Ribeiro em entrevista coletiva, o parecer protocolado prevê apenas três alíquotas para produtos e serviços: uma padrão, outra diferenciada (com redução de 50% em relação à primeira) e uma terceira zerada. Mas ele não indicou qual tende a ser o patamar necessário de cobrança para manutenção do atual nível de carga tributária.

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A maioria dos bens e serviços enquadrados no segundo grupo já haviam sido antecipados no documento com diretrizes para a reforma tributária, elaborado pelo Grupo de Trabalho que se debruçou sobre o assunto na Câmara dos Deputados. São eles:

1) serviços de educação;

2) serviços de saúde;

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3) dispositivos médicos;

4) medicamentos;

5) serviços de transporte público coletivo urbano, semiurbano ou metropolitano;

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6) produtos agropecuários, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura;

7) insumos agropecuários, alimentos destinados ao consumo humano e produtos de higiene pessoal definidos pela legislação (que seriam os produtos da cesta básica);

8) atividades artísticas e culturais nacionais.

Já na faixa de isenção estariam alguns medicamentos (como aqueles destinados ao tratamento de doenças como câncer) e serviços de educação de Ensino Superior ‒ caso do Prouni (Programa Universidade Para Todos).

Também estão enquadradas hipóteses em que as pessoas físicas que desempenhem atividades agropecuárias, pesqueiras, florestais e extrativistas vegetais in natura não sejam submetidas à Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS).

Neste caso, há um limite de receita anual de R$ 2 milhões, permitindo que seja repassado crédito presumido aos adquirentes de seus produtos. Segundo o relator, a medida contemplaria mais de 98% de todos os produtores rurais do Brasil.

No desenho apresentado pelo relator Aguinaldo Ribeiro, portanto, produtos da cesta básica deixariam de ser isentos de imposto, mas teriam alíquota diferenciada. E o agronegócio, um dos principais críticos à oneração desta categoria de bens, também seria enquadrado no regime especial de tributação.

Respeitando o princípio federativo, cada ente poderia estabelecer suas próprias alíquotas, desde que respeitando as diretrizes estabelecidas pela PEC, sem a concessão de excepcionalidades não previstas a setores específicos.

O substitutivo apresentado também institui o chamado “cashback” para impostos, com a possibilidade de devolução do IBS e da CBS recolhidos por pessoas físicas de forma ampla. Os critérios, contudo, deverão ser definidos posteriormente por lei complementar. “É um tema que ainda vamos precisar continuar discutindo”, pontuou o relator.

A ideia sugerida por integrantes do GT é que o mecanismo seja usado para conferir maior progressividade ao sistema tributário brasileiro, permitindo que grupos menos favorecidos da sociedade paguem menos impostos e que não sejam concedidos benefícios indesejáveis a setores de maior renda (como atualmente ocorre com a desoneração linear de produtos da cesta básica).

O parecer protocolado nesta quinta-feira (22) também manteve dois regimes tributários favorecidos estabelecidos na Constituição Federal. São eles: a Zona Franca de Manaus (ZFM) e o Simples Nacional. A manutenção do segundo regime, segundo o relator, preserva 90% das empresas do setor de serviços.

Também como indicado no documento preparado pelo GT da Reforma Tributária, o substitutivo prevê regimes tributários específicos para três categorias:

1) Combustíveis e lubrificantes: monofasia, com alíquotas uniformes e possibilidade de concessão de crédito para o contribuinte do imposto;

2) Serviços financeiros, operações com bens imóveis, planos de assistência à saúde e concursos de prognósticos: alterações nas alíquotas, nas regras de creditamento e na base de cálculo; e tributação com base na receita ou no faturamento.

“Esses são aqueles sistemas em que, pela natureza dessas atividades, há impossibilidade de ter um IVA aplicado direto no sistema de débito e crédito, como ele funciona. É por isso que elencamos esses regimes tributários específicos”, explicou o relator.

3) Compras governamentais: não incidência de IBS e CBS, admitida a manutenção dos créditos relativos às operações anteriores; e destinação integral do produto da arrecadação do IBS e da CBS recolhida ao ente federativo contratante, mediante redução a zero das alíquotas dos demais entes e elevação em idêntico montante da alíquota do ente contratante.

Um dos pontos mais sensíveis do debate sobre a reforma tributária, a criação de um Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional destinado a reduzir desigualdades regionais e sociais também está previsto no texto apresentado, com aportes feitos exclusivamente pela União ‒ requisito aceito pela equipe econômica do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Durante sua exposição, o próprio relator exaltou que este havia sido um dos principais entraves para o avanço da reforma tributária no passado. “Queremos consignar como um fato muito relevante termos a demonstração concreta, em que estamos incluindo na Constituição o aporte de recursos da União para o suporte ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional”, disse.

Mas o parlamentar reconheceu que ainda há arestas a serem aparadas do ponto de vista federativo para a construção de um desenho que atenda às demandas da maior parte dos governadores e prefeitos. Durante a apresentação do substitutivo, ele disse que, ao longo das próximas semanas, manterá diálogo com os principais atores envolvidos.

“É importante dizer que foi muito firme a posição dos governadores [a favor da reforma]. Isso foi muito positivo no compromisso com a reforma tributária. Foi um momento que eu nunca tinha vista”, ponderou o relator.

Pelo texto, está prevista entrega de recursos aos Estados e ao Distrito Federal para a aplicação na realização de estudos, projetos e obras de infraestrutura, no fomento a atividades produtivas com elevado potencial de geração de emprego e renda (incluindo a concessão de subvenções econômicas e financiamentos) e a promoção de ações com vistas ao desenvolvimento científico e tecnológico e à inovação.

Mais cedo, antes de protocolar o substitutivo, o relator esteve, acompanhado do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), em reunião com governadores e secretários estaduais de fazenda para buscar um entendimento sobre este e outros pontos em discussão na reforma tributária. Até o momento não foi possível construir consenso sobre o modelo a ser adotado para a distribuição dos recursos.

O substitutivo prevê que os recursos corresponderão aos valores, atualizados, de 2023 até o ano anterior ao da entrega, pela variação acumulada pela inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), da seguinte forma:

1) R$ 8 bilhões em 2029;

2) R$ 16 bilhões em 2030;

3) R$ 24 bilhões em 2031;

4) R$ 32 bilhões em 2032;

5) R$ 40 bilhões em 2033.

O texto também institui um fundo de compensação de perdas (chamado de Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais ou Financeiros-fiscais), para compensar eventuais perdas de entes subnacionais com a mudança de regime e o fim da possibilidade de benefícios fiscais a setores específicos da economia, garantindo o cumprimento de incentivos convalidados.

Pelo substitutivo, de 2025 a 2032, a União aportará ao Fundo recursos que corresponderão aos seguintes valores (também atualizados pela variação acumulada pelo IPCA):

1) R$ 8 bilhões em 2025;

2) R$ 16 bilhões em 2026;

3) R$ 24 bilhões em 2027;

4) R$ 32 bilhões em 2028;

5) R$ 32 bilhões em 2029;

6) R$ 24 bilhões em 2030;

7) R$ 16 bilhões em 2031;

8) R$ 8 bilhões em 2032.

O escalonamento corresponde à evolução do período de transição para a substituição do ICMS pelo novo modelo previsto na PEC.

Ainda há pontos em aberto sobre a regra de transição entre os modelos tributários, inclusive com sugestões de mudanças por parte dos governadores. Mas o substitutivo apresentado estabelece que a migração dos tributos atuais para os novos se dê em 8 anos.

Pela regra, em 2026 seria aplicada alíquota de 1% compensável com o PIS/Cofins. No ano seguinte, haveria o ingresso da CBS e a consequente extinção do tributo anterior e do IPI. De 2029 a 2032, seria introduzido de forma gradual e proporcional o IBS, com o “fase out” no mesmo ritmo dos tributos subnacionais (ICMS e ISS). Em 2033, entraria em vigência integral o novo modelo com a extinção do anterior.

Do ponto de vista federativo, o texto estabelece que a transição para o princípio do destino se dará em 50 anos, entre 2029 e 2078. Durante esta transição, a arrecadação proporcional dos entes seria garantida.

O texto apresentado nesta quinta-feira também avançou sobre matérias que vão além dos chamados impostos indiretos e trouxe determinação de que a segunda etapa da reforma, que tratará dos impostos sobre a renda, seja encaminhada ao Congresso Nacional em até 180 dias da promulgação da Emenda Constitucional e que o aumento de arrecadação obtida com ela seja utilizado para reduzir a tributação incidente sobre a folha de pagamentos e sobre o consumo de bens e serviços.

Por fim, o substitutivo prevê a cobrança de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) sobre veículos aquáticos e aéreos e a possibilidade de o tributo ser progressivo de acordo com o impacto ambiental. No caso do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), estabelece regra de progressividade em razão do valor de transmissão, incluiu a possibilidade de cobrança sobre heranças no exterior e transferiu a competência do imposto sobre bens móveis, títulos e créditos ao Estado onde tiver domicílio o de cujus.

Atendendo a uma demanda de prefeitos, o texto incluiu dispositivo que autoriza que o Poder Executivo local atualize a base de cálculo do imposto por meio de decreto a partir de critérios gerais previstos em lei municipal, sem necessidade de deliberação por Câmara de Vereadores.

Muitos dos pontos apresentados foram antecipados pelo deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), que coordenou o GT da Reforma Tributária na Câmara, em entrevista exclusiva concedida ao InfoMoney há duas semanas. Assista a íntegra pelo vídeo abaixo:

Tramitação

A ideia é que o texto seja votado, com possíveis ajustes, na primeira semana de julho (antes do recesso parlamentar), conforme calendário apresentado pelo presidente da casa legislativa, o deputado Arthur Lira (PP-AL).

Por se tratar de PEC, o texto depende do apoio de 3/5 dos deputados (ou seja, pelo menos 308 dos 513) em dois turnos de votação para prosperar. Depois, ele ainda precisa passar pelo Senado Federal com exigência do mesmo quórum proporcional (o que significa apoio mínimo de 49 dos 81 integrantes daquela casa).

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.