Relação de Lula com militares melhora após silêncio sobre golpe de 64, veem analistas

Especialistas consultados pelo Barômetro do Poder veem melhor momento para interação do presidente com a cúpula das Forças Armadas após acenos mútuos

Marcos Mortari

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), durante cerimônia do Dia do Exército em 2023 (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

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Depois de um início de relações turbulento nos primeiros meses do novo governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e comandantes das Forças Armadas parecem ter chegado a um denominador comum.

É o que avaliam analistas políticos consultados pela 54ª edição do Barômetro do Poder, levantamento mensal feito com consultorias e analistas independentes sobre alguns dos principais temas em discussão na política nacional.

Segundo o levantamento, realizado entre 26 e 28 de março, 57% dos analistas políticos consultados consideram “boa” a relação entre Lula e os militares. Em janeiro, o mesmo grupo somava 9% dos respondentes. É o melhor momento na atual administração.

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Aqueles que consideram a interação “ruim” entre as partes minguaram de 18% para 7% do começo do ano para cá, ao passo que os que a classificam a relação como “regular” caíram pela metade − de 73% para 36% − no mesmo período.

Considerando uma escala de 1 (péssima) a 5 (ótima), a média das respostas para as relações entre Lula e os militares ficou em 3,50. Um ano atrás, o mesmo indicador estava em 2,60. Ele chegou a marcar 2,15 no primeiro mês do novo governo e poucos dias depois dos ataques golpistas do 8 de Janeiro.

A aproximação de integrantes das Forças Armadas com o governo de Jair Bolsonaro (PL) – inclusive com a participação de diversos militares em posições estratégicas do Poder Executivo, seja na burocracia ou mesmo no comando de ministérios, além do apoio na campanha eleitoral de 2022 – acirrou um clima de animosidade dos quartéis com Lula, que já podia ser verificado desde a gestão de Dilma Rousseff (PT) e que seguiu depois no impeachment e na prisão do petista.

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Logo após a posse de Lula para seu terceiro mandato presidencial, as invasões de apoiadores de Bolsonaro às sedes dos Três Poderes uma semana após a tradicional subida da rampa do Palácio do Planalto tensionaram ainda mais as relações. Integrantes do núcleo duro do governo e o próprio presidente externaram uma percepção de certa condescendência dos fardados com defensores de uma intervenção militar no país.

Com o tempo, a tensão foi dando lugar a acenos mútuos, que, na percepção de observadores da política nacional, contribuíram para acalmar os ânimos. Do lado de Lula, o gesto mais eloquente foi a ordem explícita para que ministros de sua gestão não fizessem nenhum movimento ou evento em memória aos 60 anos do Golpe Militar de 1964, em 31 de março deste ano.

Já pelos militares, chamaram atenção declarações como as do presidente do Superior Tribunal Militar (STM), o tenente-brigadeiro Joseli Camelo, contra a anistia aos condenados pelos crimes do 8 de Janeiro e em apoio à decisão de Lula não ter lançado mão de Operação da Garantia de Lei e Ordem (GLO) naquele episódio.

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“A decisão de Lula para que não houvesse atos oficiais do Poder Executivo relacionados ao golpe militar de 1964 representou um gesto bastante generoso em relação às Forças Armadas. Isso melhora relações que já vêm apresentando progressos desde o início de seu terceiro mandato”, disse um especialista.

“Declarações recentes de alguns militares, como o atual presidente do STM, demonstram esse estado de ânimo. O pequeno desgaste de Lula junto aos setores que lhe são mais próximos na sociedade é compensado por esse ganho de tranquilidade na frente militar”, prosseguiu o analista político consultado pelo levantamento.

“Lula trocou o silencio oficial sobre o 31 de março de 1964 pela eloquência dos ex-comandantes das Forças Armadas sobre o 8 de Janeiro de 2023. É o maior acordo político do ano”, analisou outro especialista.

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Em novo aceno aos militares, Lula participa, nesta sexta-feira (19), de cerimônia do Dia do Exército, no quartel-general da instituição, em Brasília. É o segundo ano consecutivo em que o presidente esteve presente na solenidade.

No mês passado, em visita de Estado do presidente da França, Emmanuel Macron, ao Brasil, Lula defendeu maior cooperação e investimentos em defesa. Durante o lançamento de um novo submarino em parceria com o país europeu, o petista alertou para o aumento dos conflitos e “animosidades no processo democrático” mundo afora e disse que o Brasil precisava se preocupar mais com sua soberania e segurança nacional.

Metodologia

Esta edição do Barômetro do Poder ouviu 9 consultorias políticas – Ágora Assuntos Políticos; BMJ Consultores Associados; Control Risks; MCM Consultores; Medley Global Advisors; Patri Políticas Públicas; Prospectiva Consultoria; Vector Relações Goveramentais; e Warren Rena – e 5 analistas independentes – Antonio Lavareda (Ipespe); Carlos Melo (Insper); Cláudio Couto (EAESP/FGV); Rogério Schmitt (Espaço Democrático) e Thomas Traumann (Traumann Consultoria).

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Os questionários são aplicados de forma eletrônica. Conforme combinado previamente com os participantes, os resultados são divulgados apenas de forma agregada, sendo mantido o anonimato das respostas.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.