Cortando na própria carne

Hoje não existem muitos entes federativos em condições plenas de solvência

Equipe InfoMoney

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* Fernando Aurelio Zilveti, professor doutor livre-docente pela Faculdade de Direito da USP, advogado em São Paulo

A questão do gasto público tem gerado muita polêmica no país ultimamente, motivo, inclusive, do impeachment da ex-presidente da república. Sem entrar no mérito do impedimento de mandato da chefe do Poder Executivo, a falta de austeridade é um vício do administrador público nacional. Por mais que tenha sido um grande feito, a Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF, passados mais de quinze anos de vigência, tem pouca eficácia.

União, Estados e Municípios aumentaram suas despesas em níveis alarmantes, mesmo com todo o aparato de controle imposto pela LRF, principalmente no quesito “folha de salários”. Hoje não existem muitos entes federativos em condições plenas de solvência. Pior, a grande parte deles não consegue sequer pagar o funcionalismo, manter a estrutura de saúde, educação e segurança pública, demandando socorro emergencial da União.

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O atual presidente da república prometeu em seu programa de governo a reforma do Estado, cortando, como disse, na “própria carne”, para retomar o controle da economia sem recorrer ao indesejável aumento de carga tributária. Para tanto, propôs a reforma da previdência social e a implantação de um teto para os gastos públicos. A primeira medida foi adiada para após as eleições municipais, evitando desgastes nas bases parlamentares dos partidos com quadros na disputa.

A segunda medida, o teto de gastos públicos, a conhecida PEC 241, foi aprovada na Câmara dos Deputados em primeira votação, como se uma arma de fogo estivesse apontada para a cabeça dos parlamentares, num maniqueísmo do ‘sim’ ou ‘não’, como se a simples abstenção pudesse levar o país a uma crise ainda mais profunda. Enfim, praticamente sem debate, a emenda constitucional foi aprovada em primeira votação nas duas casas legislativas.

Até o IPEA pareceu não se entender em relação ao tema, ideologicamente confuso, divulgou estudos contraditórios, desmentidos pela direção do instituto, enfim, de pouca serventia para o debate acerca da votação da emenda constitucional. É preciso dizer, porém, que o corte efetivo de despesas ainda não virá, pois o que se tem na PEC 241 é apenas um limite no aumento de gastos.

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Sabe-se que austeridade em si não traz crescimento nem tampouco é capaz de evitar crise econômica. Existem outras políticas públicas capazes de estimular a economia de maneira eficiente e rápida, para restaurar a prosperidade com menos sofrimento. A PEC 241 traz consigo consequências para um país que ainda não se livrou completamente de grandes chagas históricas no campo da saúde e educação. Não há, porém, o que temer se a proposta de emenda constitucional fixar, como de fato fez, um limite mínimo de gastos com a saúde e educação. A medida, afinal, tem um significado de mudança de postura em relação à insolvência do Estado brasileiro. É preciso, porém, fazer mais e de modo mais profundo.

O verdadeiro corte de despesas públicas ainda está por ser proposto, o que significa muito trabalho para o atual governo, que flerta com o tema sem convicção. Ora, se mais de vinte estados da federação gastam acima de 65% de seus recursos com folha de salários, sem contar o serviço da dívida pública, a LRF é quase letra morta. O controle rígido de gastos pela PEC 241 resolverá pouco, caso não seja seguido da reforma da previdência, além da revisão nos gastos com folha de salários do funcionalismo.

Assim, ao invés de propor o aumento dos vencimentos do judiciário, como fez o STF, o mais sensato seria reduzir vencimentos de todo o funcionalismo público, nos três níveis da federação, por meio de emenda constitucional, para rever os chamados direitos adquiridos. O tamanho do Estado brasileiro, afinal, precisa rapidamente diminuir para demonstrar-se viável para as gerações futuras.