Ações da Vale caem mais de 4% com apresentação do relatório final da CPI de Brumadinho

O documento prevê a apresentação de três projetos que tratam de crimes ambientais, da segurança de barragens de rejeitos e da tributação da exploração de minérios no país

Lara Rizério

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SÃO PAULO – As ações da Vale (VALE3) aceleraram as perdas na tarde desta terça-feira (2) e chegaram a ter desvalorização de 6,67% na mínima do dia, fechando com baixa de 4,21%, a R$ 51,39. As perdas mais fortes coincidiram com a apresentação do relatório final da CPI de Brumadinho pelo senador Carlos Viana (PSD-MG), que pediu o indiciamento de 14 pessoas, entre elas, executivos da Vale. 

O documento também prevê a apresentação de três projetos que tratam de crimes ambientais, da segurança de barragens de rejeitos e da tributação da exploração de minérios no país, sendo este último ponto o principal para azedar os papéis da mineradora, assim como os das CSN (CSNA3), que vê seus papéis caírem cerca de 4%.

O projeto prevê a criação de dois tipos complementares de tributação: royalties e participação especial. A primeira cobrança incide sobre o valor bruto da produção, enquanto o segundo se refere à receita líquida obtida em cada mina. De acordo com esse sistema, todos os empreendimentos pagam royalties, mas a participação especial recai apenas sobre aqueles com grande produção. A alíquota máxima será de 40%.

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Atualmente, os royalties de minério representam 3,5% da receita bruta no Brasil. Os analistas do Bradesco BBI destacaram que, em viagem a Brasília, tiveram a percepção de que de fato estão aumentando as discussões sobre royalties de mineração mais altos, embora o número mais alto que tenham ouvido foi de 10%, mas o valor entre 4% e 8% foi o mais frequente. A maioria dos congressistas consultados pela equipe de análise acredita em royalties abaixo de 10%. 

“Para cada aumento de 1% nos royalties, o Ebitda [lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações) da Vale seria impacto negativamente em 1,5%, enquanto o Ebitda da CSN sofreria um impacto de 0,5%”, destaca o Bradesco BBI, ressaltando ser improvável que ocorra o imposto especial de participação de 40%. Se os royalties ficarem em cerca de 7%, com termos parecidos ao da Austrália, o impacto no Ebitda para 2020 seria de 5% para a Vale e de 2% para a CSN. 

Procurada pela Bloomberg, a assessoria de imprensa da Vale informou que “respeitosamente discorda” da sugestão de indiciamento de funcionários e executivos da empresa. “A Vale considera fundamental que haja uma conclusão pericial, técnica e científica sobre as causas do rompimento da barragem B1 antes que sejam apontadas responsabilidades”, destacou a mineradora. 

Mais detalhes

A CPI de Brumadinho aprovou o indiciamento de 14 pessoas envolvidas no rompimento da barragem da mineradora, na cidade de Brumadinho (MG), pelo crime de homicídio com dolo eventual — quando o agente assume o risco de cometer o crime. O desastre ocorrido em janeiro deixou 246 mortos e 24 desaparecidos. 

O relatório original do senador Carlos Viana (PSD-MG) previa o indiciamento por homicídio culposo — sem intenção de matar. Mas o relator decidiu acatar a sugestão do senador Jorge Kajuru (PSB-GO), que apresentou voto em separado para recomendar a tese de dolo eventual.

O engenheiro Fábio Schvartsman, presidente da Vale na época da tragédia, encabeça a lista de indiciados. Além de homicídio, ele pode responder por lesão corporal culposa; destruição culposa de flora de preservação permanente e de Mata Atlântica; e poluição culposa que provoca a morte de fauna e flora. Somadas, as penas podem chegar a sete anos de prisão.

O senador Carlos Viana recomenda os mesmos indiciamentos para outros 11 funcionários da Vale e dois engenheiros da empresa TÜV SÜD, Makoto Namba e André Jum Yassuda. A empresa terceirizada foi responsável por um laudo que atestou a segurança da barragem de Brumadinho. O atual CFO da mineradora, Luciano Siani, também teve o indiciamento sugerido pelo parlamentar. 

“Várias ações poderiam e deveriam ter sido tomadas para evitar o resultado, mas não foram. A construção da berma de reforço, a construção dos poços de rebaixamento, o acionamento do plano de emergência e a evacuação da empresa do local. Esta CPI considerou todos coautores numa cadeia causal normativa de imperícia, imprudência e negligência”, afirmou Carlos Viana.

Além das pessoas físicas, o relator sugere o indiciamento das empresas Vale e TÜV SÜD. Elas podem responder por destruição culposa de flora de preservação permanente e de Mata Atlântica; e poluição culposa que provoca mortandade de fauna e flora, com inviabilização de área para ocupação humana.

Projetos de lei

Sobre os outros projetos de lei, a primeira proposição tem como objetivo conferir mais segurança às barragens de rejeitos de mineração. O texto proíbe o licenciamento ambiental de novos equipamentos e estabelece prazo de dez anos para a desativação dos já existentes ou em fase de construção.

O projeto prevê ainda a criação da Taxa de Fiscalização de Segurança de Barragens de Rejeitos (TFSBR), que deve ser paga pelo empreendedor à Agência Nacional de Mineração (ANM). O valor depende do volume de barragens de rejeitos e pode variar de R$ 5 mil a R$ 120 mil.

A segunda proposição altera as regras de tributação para a mineração. De acordo com o relator, “há muitos indícios de que determinadas atividades são tributadas muito aquém do que deveriam ser”. Segundo a ANM, a arrecadação da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais referente à produção de ferro somou R$ 2,1 bilhões em 2018 — menos de US$ 1 para cada tonelada extraída.

O projeto prevê a criação de dois tipos complementares de tributação: royalties e participação especial. A primeira cobrança incide sobre o valor bruto da produção, enquanto o segundo se refere à receita líquida obtida em cada mina. De acordo com esse sistema, todos os empreendimentos pagam royalties, mas a participação especial recai apenas sobre aqueles com grande produção. A alíquota máxima será de 40%.

A terceira e última proposição endurece as penas e tipifica novos crimes ambientais. A legislação em vigor prevê punição de um a quatro anos de reclusão para casos de poluição. O projeto sugerido pelo relator eleva a pena para oito anos se o crime provocar “desastre ecológico de grande proporção ou que produza estado de calamidade pública”. Se provocar morte humana, a punição pode ser aplicada em dobro.

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O texto considera crime “dar causa a rompimento de barragem”. A pena é de dois a cinco anos mais multa, mas pode chegar a oito anos se o crime tornar a área imprópria para a ocupação humana; provocar mortandade de animais ou destruição significativa da flora; causar poluição que impeça o abastecimento de água; causar prejuízos ao patrimônio histórico-cultural; ou afetar o modo de vida de populações indígenas e comunidades tradicionais.

O projeto também eleva o valor de multas aplicadas a quem violar as leis de uso, proteção e recuperação do meio ambiente. Na legislação em vigor, elas vão de R$ 50 a R$ 50 milhões. O senador Carlos Viana recomenda valores que variam de R$ 2 mil a R$ 1 bilhão.

(Com Agência Senado) 

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.