Turbulência na Vale pode fazer minério de ferro disparar, mas não há motivo para alvoroço agora

Tragédia em Brumadinho fez a commodity subir forte nas duas últimas sessões, mas analistas acreditam que Vale será capaz de contornar os problemas e evitar um problema de oferta

Rodrigo Tolotti

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SÃO PAULO – Na última segunda-feira (28), o desastre ocorrido em Brumadinho, Minas Gerais, não afetou apenas a Vale (VALE3), mas a cadeia global do minério de ferro, fazendo os preços da commodity dispararem no mercado internacional. 

O contrato do minério de ferro mais negociado na Bolsa de Dalian, na China, chegou a disparar mais de 6% na segunda-feira, cotado a 567 yuans por tonelada, atingindo seu maior patamar desde setembro de 2017. Em seguida, porém, os preços devolveram parte dos ganhos e tiveram alta de 2,8%, a 550 yuans. A alta segue nesta terça, com a commodity em alta de 3,33%, a 574,5 iuanes. 

Enquanto os papéis da Vale desabaram mais de 24%, os ativos de seus pares internacionais, como Rio Tinto, BHP e Anglo American subiram diante das indicações de que o incidente possa reduzir a oferta global de minério de ferro, impulsionando um aumento de preços da commodity.

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Ocorrida na sexta-feira (25), a queda da barragem em Brumadinho levou à suspensão das operações da mina da Vale no Córrego do Feijão. Apesar de representar apenas 1,5% da produção da mineradora, a incerteza agora é sobre o impacto em outras operações da companhia. O governo já reforçou que fará uma reavaliação de outras barragens.

Ao InfoMoney, Cicero Prado Machado, analista de minério e ferro da Wood Mackenzie, afirma que ainda há uma grande interrogação no mercado sobre o que irá acontecer a partir de agora. Mas, por enquanto, não vale criar tanto rebuliço no mercado de minério.

Ele explica que o complexo de Paraopeba (o único suspenso por enquanto) é o de maior custo de produção da Vale, tendo produzido cerca de 28 milhões de toneladas de minério em 2018. Com a Vale passando a priorizar seus ativos mais eficientes e rentáveis, a Wood Mackenzie já projetava antes do desastre que a produção nesta área deveria cair para cerca de 13 milhões de toneladas.

“A Vale planeja produzir 400 milhões de toneladas em 2019. Com a suspensão desta licença, parte desta produção será redirecionada para outros complexos no quadrilátero ferrífero”, afirma o analista, ressaltando que a mineradora tem capacidade ociosa em outras unidades para poder compensar esta suspensão e manter seu guidance para o ano.

Há porém, um risco de que outros complexos sejam paralisados, o que levaria a um forte impacto na oferta de minério de ferro, refletindo diretamente nos preços da commodity. Para os analistas do Bradesco BBI será esta questão que determinará o impacto final no mercado.

Em relatório, eles ressaltam que o sistema do sul produziu uma estimativa de 80 milhões de toneladas em 2018, contra as 100 milhões de toneladas do sistema do sudeste. Combinados, esses dois sistemas representam cerca de 13% do mercado transoceânico. Neste momento, considerando apenas a mina de Feijão, o impacto é de apenas 0,6% do mercado transoceânico.

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Machado reforça que, se a Vale conseguir entregar sua meta de produção em 2019, sua projeção de US$ 66 por tonelada este ano está mantida. “A gente espera volatilidade neste curtíssimo prazo até termos um entendimento se a Vale vai conseguir cumprir sua meta de produção. Vale a pena esperar um pouco mais para ver o que irá acontecer”, afirma.

Helen Lau, analista da Argonaut Securities, também acredita que o impacto não deverá ser tão grande na oferta, mas aponta um outro fator para justificar sua análise. “Em geral, nós não esperamos ver uma grande alta nos preços do minério de ferro em função desse acidente fatal, uma vez que a demanda da China por minério de ferro no curto prazo deve ser leve devido à fraca sazonalidade”, disse em relatório.

Enquanto isso, o analista da Clarksons Platou, Jeremy Sussman, avalia que o preço do minério de ferro negociado em Qingdao pode subir para mais de US$ 80 por tonelada. Nas duas últimas sessões, a commodity chegou próximo a esse patamar, com alta acumulada de 6% nos últimos dois dias, a US$ 79,95 a tonelada. 

Sussman rebaixou a recomendação para a Vale de compra para neutro e ainda ressaltou que, dada a probabilidade de aumento das inspeções em todas as plataformas de operação da Vale, há sérias dúvidas sobre reinício das operações da Samarco, paralisada desde o desastre de Mariana em 2015.

Enquanto a Vale não mostrar que cumprirá seu guidance de produção e o governo não garantir o funcionamento de outras unidades da companhia, o mercado terá de lidar com as incertezas sobre o futuro dos preços do minério de ferro. Isso pode levar a um aumento dos preços no curto prazo – e, enquanto isso, as rivais da mineradora brasileira podem comemorar na bolsa. 

Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.