Não seja irracional como Darwin

Por muito pouco que hoje não falamos em wallacismo em vez de darwimismo

Josué Guedes

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Texto originalmente enviado aos assinantes da newsletter Stock Pickers no sábado, 02 de outubro de 2021. Para recebê-la, clique aqui.

“É sempre recomendável perceber com clareza a nossa ignorância”
— Charles Darwin em 
A expressão das emoções no homem e nos animais

Nenhuma pessoa no planeta pode dizer que desafiou a religião de forma tão assertiva, acintosa e inquestionável quanto o naturalista britânico Charles Darwin. Lançado em 1859, seu “Origem das Espécies”, fundava a teoria da evolução dos seres vivos e se colocava em posição diametralmente oposta aos ensinamentos da Bíblia.

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Darwin provou que somos fruto da evolução de outro animal, não criações divinas.

Hoje ele é um ícone tão relevante da ciência que seu nome virou substantivo e adjetivo. Mas Darwin mesmo quase foi vítima de um processo darwiniano e é por muito pouco que hoje não falamos em wallacismo em vez de darwimismo.

Desafiar a religião não foi fácil para Charles Darwin pelo simples motivo de que ele mesmo era um homem religioso. Criado no anglicanismo, não demorou para perceber que as conclusões às quais ele estava chegando já em 1844 eram uma afronta a sua própria fé, e que isso traria problemas para sua própria igreja.

Assim ele foi adiando a exposição de suas ideias, até que, em 1858, descobriu que Alfred Wallace, outro naturalista, estava chegando às mesmas conclusões sobre evolução. Foi só com esse impulso final que, em 1859, “Origem das Espécies“ foi finalmente publicado. É  graças a Wallace que Darwin virou um dos maiores nomes da ciência.

Como se a teoria da evolução fosse pouca coisa, a história de Darwin e sua hesitação na publicação de sua obra traz outra lição: a de que o ser humano se apega a certas ideias de forma irracional, não importa quais sejam as evidências contrárias.

E é uma lição que talvez não tenha sido aprendida.

No episódio desta quinta do Stock Pickers, o Ruy Alves, da Kinea, explicou por que ele acredita que é esse apego que está nos colocando numa crise energética que pode ter consequências do nível Mad Max.

Resumindo o argumento do Ruy: as mais que legítimas preocupações com o ambiente fizeram os governos deixar de investir em combustíveis como carvão e derivados do petróleo em favor de fontes mais limpas, como gás natural, e fontes renováveis. Acontece que uma mudança de matriz energética global não acontece em meses nem anos. Portanto não é possível, nem aconselhável abandonar uma fonte sem ter outra.

Mas o apego a uma ideia errada, a de que podemos mudar tudo do dia para a noite, está nos levando a uma crise muito mais aguda do que precisava ser.

“Demozinou-se o investimento em petróleo nos EUA e outros países, assim, tudo ficou na mão da Opep. Então vamos ter que viver com o preço mais alto do barril, que agora custa US$ 75, e não os US$ 50 de antes dessa crise. A Europa decidiu abandonar a energia suja e se voltar ao gás natural. Mas adivinha? Eles só produzem um quinto do que precisam e agora dependem da Rússia e países do Oriente Médio. No Reino Unido instalaram fontes eólicas que não dão conta e na Alemanha demonizou-se a energia nuclear e agora estão… queimando carvão”, reflete Ruy.

E qual é a saída, então? Esperar o planeta derreter e viver embaixo d’água? Trocar Mad Max  por Waterworld? É claro que não. A solução está em sermos mais racionais que Darwin.

“Temos que repensar o ESG quando falamos da energia levando em consideração principalmente o S. Não podemos dissociar a energia disso por que o mundo sem energia é Mad Max. Precisamos fazer a transição do petróleo e vamos fazer, mas não pode ser tão rápido, precisamos de 50 anos”, afirma Ruy.

Renato Santiago
Apresentador do Stock Pickers

P.S.: O episódio desta quinta-feira, com o Ruy, foi o mais elogiado da história. Recomendamos que você ouça. É só clicar aqui.