Por que as pessoas confundem deficiência de vitamina B12 e demência?

Sintomas semelhantes, diagnóstico difícil e impactos neurológicos fazem com que a falta da vitamina B12 seja confundida com doenças como Alzheimer (especialmente entre idosos)

Victória Anhesini

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Esquecimento, lentidão para raciocinar e desatenção são alguns dos sintomas que tendem a deixar qualquer pessoa alerta em relação à demência. Porém, o que muitos não sabem é que a deficiência de vitamina B12 também pode causar declínio cognitivo.

A semelhança entre os sintomas faz com que muitos quadros tratáveis sejam confundidos com doenças neurodegenerativas, segundo especialistas ouvidos pelo InfoMoney.

O neurologista Felipe Barros, do Hospital Sírio-Libanês e da clínica DFV Neuro, explica que a vitamina B12 serve para uma série de funções no corpo humano, mas uma das mais importantes é o seu funcionamento no sistema nervoso e na formação das células sanguíneas.

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“A confusão entre sintomas de deficiência de vitamina B12 e demência ocorre porque ambos podem causar comprometimento cognitivo, desatenção, lentificação mental”, diz o especialista. “Na deficiência de B12, sintomas neurológicos incluem formigamentos, descoordenação e desequilíbrio. Já na demência, predominam déficits progressivos de memória, linguagem, desorientação e até alucinações”.

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Já Diogo Haddad, chefe do Centro Especializado em Neurologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, acrescenta que a deficiência de B12 pode causar manifestações mentais e físicas semelhantes às da doença de Alzheimer.

De acordo com ele, pessoas com deficiência dessa vitamina podem ter cansaço extremo, perda de memória recente, dificuldade de concentração e alterações de humor. Já as demências, como o Alzheimer, tendem a evoluir de forma progressiva, com perda de autonomia e desorientação crescente.

“Os dois quadros podem se parecer no início, especialmente na parte cognitiva”, afirma Haddad.

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Entre idosos, a confusão é ainda mais comum. Rita de Cássia Salhani Ferrari, médica geriatra e head de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação da Marjan Farma, explica que a deficiência de B12 pode permanecer silenciosa por longos períodos, tornando o diagnóstico mais desafiador. Ela lembra que até 40% dos idosos podem ter deficiência da vitamina, muitas vezes sem sintomas evidentes.

“Muitas vezes, o diagnóstico da B12 sérica pode estar normal, mas há uma deficiência de B12 intracelular”, alerta a médica. Ela explica que existem marcadores no sangue que podem ser usados na hora de fazer o diagnóstico final, como o ácido metilmalônico e a homocisteína, que costumam estar elevados em casos de deficiência.

Segundo Rita, fatores como a má absorção intestinal e o uso prolongado de medicamentos (entre eles omeprazol, pantoprazol e metformina) também dificultam a absorção da vitamina. “A deficiência de vitamina B12 parece ser particularmente comum em idosos, principalmente devido à má absorção”, ressalta.

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O Omeprazol causa demência?

Nos últimos anos, surgiram suspeitas de que o uso prolongado de omeprazol pudesse estar associado a casos de demência. Em uma pesquisa alemã publicada na revista científica JAMA Neurology em 2014, os cientistas observaram que talvez houvesse uma conexão entre o uso prolongado de inibidores de bomba de prótons (IBPs) e demência em idosos. Essa classe inclui o omeprazol, pantoprazol e esomeprazol.

A partir de então, muito foi debatido na literatura científica. Estudos publicados posteriormente, como na revista Neurology em 2017, mostravam que não havia uma causalidade entre as duas coisas. O trabalho finlandês que chegou a essa conclusão incluiu análises de mais de 250 mil pacientes.

Os especialistas explicam que não há comprovação científica dessa relação direta. O que ocorre é que o Omeprazol pode reduzir a absorção da vitamina B12 no organismo, o que indiretamente afeta a saúde cognitiva.

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“A suspeita surgiu porque ele pode reduzir a absorção da vitamina B12 ao longo do uso prolongado, já que diminui a acidez do estômago”, diz Haddad. “Estudos observacionais mostraram associação, mas não provaram que o remédio é a causa direta”.

Os médicos alertam que o uso do medicamento deve sempre ser orientado por um profissional de saúde, especialmente em idosos ou pacientes que fazem uso contínuo.

Outro ponto de atenção é conseguir o diagnóstico precoce, já que ele pode ser decisivo para o sucesso do tratamento. Barros ressalta que, em caso de deficiência, a reposição pode reverter os sintomas neurológicos e cognitivos se for iniciada a tempo.

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“A reposição corrige a deficiência e pode melhorar sintomas cognitivos e neurológicos em casos leves a moderados”, diz o neurologista. Haddad concorda e reforça a importância de não negligenciar os sinais.

“Se o quadro for negligenciado por muito tempo, parte das sequelas pode se tornar definitiva, por isso o diagnóstico precoce é fundamental.”

Mais do que uma questão nutricional, a deficiência de vitamina B12 é um alerta para a saúde neurológica. Diagnosticar e tratar precocemente pode evitar que uma causa tratável seja confundida com uma demência progressiva.