Túnel do tempo: o que Dilma pensava – e o que achavam dela – quando foi eleita em 2010?

Há quatro anos, o mercado já esperava uma desaceleração da atividade econômica, mas não viam tanto "temor" com a entrada da atual candidata à reeleição

Lara Rizério

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SÃO PAULO – Há um pouco menos de quatro anos, o Brasil passava por uma nova etapa com a eleição da primeira presidente mulher na história – ou presidenta, como Dilma Rousseff gosta de ser chamada. Hoje, boa parte do mercado contesta a sua atual gestão, apesar da passagem entre os governos Lula e Dilma não ter tido tanta turbulência.

Agora, o cenário é de turbulência na Bolsa. Se antes não avaliavam que Dilma seria ruim para os mercados, o cenário que se desenhou ao longo dos últimos quatro anos de maior intervenção estatal fizeram com que ela entrasse em descrédito entre os investidores. Assim, o desempenho do Ibovespa e principalmente das estatais passou a ser atrelado às indicações de se Dilma cairia ou subiria nas pesquisas. Mas o que achavam de Dilma quatro anos atrás? 

Como ressalta vídeo do Financial Times de 2010, houve na época um rali na bolsa brasileira, não tanto por conta da eleição da presidente, mas em um ambiente de maior tranquilidade, com a sinalização de que haveria uma continuidade das políticas que não eram vistas como nocivas ao mercado. Os temores com o governo Lula e, como conseguinte, com o governo Dilma, eram bem menores do que nas eleições de 2002, quando o petista foi eleito. 

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Wilber Colmerauer, conselheiro do Brazilian Funding, destacou que a economia estava tendo uma boa performance, principalmente no segundo semestre de 2010 – naquele ano, o PIB (Produto Interno Bruto) registrou uma alta forte. Havia desafios, principalmente em decorrência da situação de crise mundial, mas Colmerauer destacou o quanto notável era a tranquilidade do País em meio ao processo eleitoral.

O desempenho econômico era bom, mas uma das maiores questões era como Dilma iria enfrentar os grandes desafios. Uma das chaves para o crescimento brasileiro era de que havia uma grande entrada de capitais, o que era um dos grandes fatores de preocupação, também levando a cotação do real para baixo, com o dólar rondando cerca de R$ 1,70 em 2010.

Colmerauer destacava ser notáveis os desafios que as autoridades brasileiras tinham que enfrentar para reverter o excesso de capital. Para tanto, o governo brasileiro fez algumas taxações sobre o capital estrangeiro. O gestor também destacou que isso dava a impressão de que o mercado brasileiro começava a ficar caro e superaquecido, com os valuations esticados.

Dilma poderia reverter essa situação?
Colmerauer ressaltou que havia um problema estrutural no Brasil – e que continua nos dias de hoje. Isso porque, durante a crise de 2008, quando os desenvolvidos passaram a não ser tão atrativos, o Brasil passou a atrair capital, ainda mais levando em conta o alto diferencial de juros. E isso teria levado a atrair uma grande quantidade de capital errado para o País. 

Sobre a conta corrente nacional, naquela época, mostrava uma leve tendência de queda no IED (Investimento Estrangeiro Direto) como proporção do PIB e uma tendência de alta nos mercados de capitais locais. A maior parte dos investimentos era de curto prazo. 

Para Colmerauer, a grande questão para o Brasil é ter um plano estável, principalmente em relação à questão da infraestrutura, de forma assim a atrair o “tipo certo de capital”. Para os que queriam investir no Brasil, o gestor aconselhava que o País não estava barato e para ser seletivo, ressaltando o consumo nacional, a construção civil. E o FT ressaltou: “após a ‘Era de Ouro’ na época de Lula, a presidente Dilma enfrenta desafios”.

Conselhos para Dilma
Uma outra matéria da Reuters deu alguns conselhos em 2010 sobre como Dilma deveria agir no seu primeiro mandato como “presidenta”. Além disso, a matéria destacou alguns temores que pareciam ser exagerados sobre governar de forma significativa para a esquerda de Lula, expressa por alguns investidores e políticos de oposição. 

O principal risco com a Rousseff pareceria ser uma presidência que resultaria em uma estagnação econômica. Dada a sua falta de apetite por grandes reformas, alguns economistas temiam que os altos custos do Brasil de se fazer negócios em breve poderia arrastar o País, que não voltaria para o seu nível de crescimento do PIB que se compararia aos BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China).

Além disso, afirmava a reportagem, a relativa falta de carisma ou experiência executiva de Dilma também poderia deixar o seu governo vulnerável no caso de uma crise externa ou interna inesperada. Sua coalizão potencialmente volátil com outros partidos também seria um ponto de interrogação. Porém, ressaltava a matéria, havia pouca preocupação se a prosperidade do Brasil acabaria em breve. A reportagem também destaca a mudança de estilo de Dilma para a campanha em que ela foi eleita presidente, passando de um estilo hippie para um mais arrumado.

A matéria destacou ainda um relatório do Goldman Sachs, que disse que muitos investidores estavam esperando  até depois das eleições de 2010 para fazer movimentos definitivos no Brasil. Uma das preocupações era se o papel do Estado seria refreado ou expandido no próximo governo. Ela era vista como desenvolvimentista e a principal questão para ela, apontavam analistas, não era se era “o público versus o privado” e sim o “made in Brazil versus não”. 

E sobre o que ela faria em seu governo, a matéria destacava: “reforma tributária, talvez. Mudanças na área fiscal? Esqueça.” Alguns acreditavam que a política fiscal tivesse melhor chance de ser tratada por Dilma, mas bem aquém da grande reformulação que muitas empresas esperariam. 

Papel do Estado
As suas ideias tiveram destaque na mídia internacional com destaque mais uma vez para o seu papel no Estado que, para ela, era atuar onde existiam falhas de mercado, especialmente onde havia grandes concentrações de poder. Alguns dos casos apontados era no caso de energia elétrica ou de rodovias. Algum mais tarde, em setembro de 2012, Dilma Rousseff interviu no setor elétrico para baixar as contas de luz, o que mexeu bastante com o setor na época.

Já sobre funcionários públicos, ela defendeu a contratação de novos trabalhadores em atividades essenciais do Estado, além de defender a criação de um salário diferenciado para os funcionários públicos através de incentivo.

Sobre o papel do estado, ela ainda afirmava: “em certas áreas, é absolutamente imperativo que o Estado tenha planejamento ativo, regulação Acredito que o Estado brasileiro precisa ser ágil. Hoje não é ágil. O Estado é indutivo, mas o setor privado é importante. Sem ele, você não pode construir uma avenida ou uma represa”.

Em relação à economia, ela destacou em um evento em São Paulo, em maio de 2010, que acredita que o Brasil poderia crescer em torno de 5,5% ao ano, em média, até 2014. Porém, ela deve encerrar o mandato com um crescimento médio de 2%, o menor ritmo desde Fernando Collor. 

Em várias ocasiões, ela também havia destacado o seu compromisso com o “tripé econômico”, baseado em superávit primário, regime de metas de inflação e taxa de câmbio flutuante, destacando que trabalharia para reduzir a meta de inflação de 2011 a 2014. Mas isso deveria ser feito gradualmente e com cuidado.

Um dos destaques apresentados pelo site Affaires Strategiques era de que Dilma avaliava como extremamente importante a autonomia do Banco Central, mas sem detalhar se gostaria de uma autonomia formal. “Acho importante a autonomia operacional ao Banco Central que existiu no governo do presidente Lula. Nós sempre tivemos uma relação muito tranquila com o BC”, ressaltou.

Sobre financiamento da economia através de bancos públicos, ela destacava que era preciso encontrar novas formas de financiamento. “A crise mostrou que era muito importante que o Brasil possuiu bancos para financiamento. Mas chegamos, creio eu, o limite dos bancos públicos”.

Ela também destacou que o seu governo tem o compromisso de uma política que continua o processo de desenvolvimento com inclusão social e que teria a missão de erradicar a pobreza, destacando um estudo do IPEA que afirmava ser possível erradicar a pobreza extrema até 2016.

Dilma ainda se manifestava favoravelmente à reeleição. “No entanto, quando perguntei se ela poderia desistir de reeleição em 2014 se fosse eleita [em 2010] em outubro, ela disse: ‘Ele [Lula] já me disse para não responder a essa pergunta'”, afirmou.  

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.