Silvio Santos e Lula se reuniram para “salvar o Banco Panamericano”, diz Procuradoria

O encontro, ocorrido em 2010, não estava previsto na agenda presidencial e, na época, o motivo oficial da reunião foi um convite para que o petista fizesse um depoimento  para a abertura do Teleton

Lara Rizério

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SÃO PAULO – A Procuradoria da República destacou em pedido encaminhado à Justiça Federal para deflagração da Operação Conclave na última quarta-feira um encontro ocorrido no dia 22 de setembro de 2010 entre o apresentador de TV Silvio Santos e o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A Operação Conclave investiga a compra de ações do banco Panamericano pela Caixa e foi deflagrada na última quarta com 46 mandados de busca e apreensão. 

A reunião entre Lula e Senor Abravanel (nome de Silvio Santos) ocorreu após a descoberta das inconsistências contábeis (no Panamericano) pelo Banco Central’. “A pauta teria consistido na busca de meios a fim de salvar o Banco Panamericano”, afirma a petição encaminhada à Justiça. O encontro não estava previsto na agenda presidencial e, na época, o motivo oficial da reunião foi um convite para que o petista fizesse um depoimento  para a abertura do Teleton. Na época, Silvio Santos  disse ainda que pediu a Lula que ampliasse para R$ 12 mil a doação, o que corresponderia a R$ 1 mil por cada ano em que o Teleton foi realizado. 

A petição foi subscrita pelo procurador da República Anselmo Lopes e pela delegada da Polícia Federal Rúbia Pinheiro. “Em virtude de terem sido constatadas inconsistências contábeis que não permitiam que as demonstrações contábeis refletissem a real situação patrimonial da entidade, o Grupo Silvio Santos, em 5 de novembro de 2010, na qualidade de principal acionista controlador do Banco Panamericano, decidiu aportar, na conta ‘Depósito de Acionista’, o valor de R$ 2,5 bilhões, obtidos mediante operação financeira contratada com o Fundo Garantidor de Créditos (FGC), integralmente garantida por bens do patrimônio empresarial do Grupo, tais como o SBT, a Jequiti Cosméticos e o Baú da Felicidade”, afirmam. Após o aprofundamento das investigações, no dia 30 de novembro de 2010, foi revelado um rombo adicional de R$ 1,5 bilhão nos balanços do Panamericano. 

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Em janeiro de 2011, o Grupo Silvio Santos realizou aporte adicional no valor de R$ 1,3 bilhão. “Com as mesmas características do aporte anterior e utilizando os mesmos instrumentos legais (leia-se, FGC), o aporte adicional foi creditado em conta de ‘Depósito de Acionista’, destinado a reforçar o equilíbrio patrimonial e a liquidez operacional do Panamericano”, observam a delegada e o procurador. Os ajustes adicionais permitiram apurar o valor total das inconsistências contábeis sendo um no montante de R$ 3,8 bilhões e outro de R$ 500 milhões, todos integralmente ajustados no balanço patrimonial em 30 de novembro de 2010, conforme Notas Explicativas do balanço patrimonial publicadas no dia 31 de dezembro de 2010. 

“Apesar de ter autorizado preliminarmente o negócio em julho de 2010, o Banco Central somente constatou oficialmente indícios de inconsistências contáveis dois meses depois, oportunidade em que solicitou esclarecimentos ao Banco Panamericano, no dia 8 de setembro de 2010”, aponta a petição. No final de setembro, o Panamericano apresentou informações formais ao Banco Central, apontando inconsistências e definindo o compromisso de elaborar um relatório mais preciso pelo Conselho Interno de Auditoria.  “Assim, o Banco Panamericano apresentou documentações e planilhas ao Banco Central, apontando o total das inconsistências, incluindo passivos ocultos e duplicidades de repasses de ativo, o que permitiu ao Banco Central a contabilização oficial do rombo. O Bacen, dessa forma, encerrou o trabalho de fiscalização em 29 de outubro de 2010, identificando, de forma concreta, as inconsistências contábeis.”

A Operação e as irregularidades

A Conclave citou irregularidades encontradas pelo TCU.  “A diretoria da CAIXAPAR, em vez de adotar o procedimento normal, regular, previsto em norma, preferiu, à revelia do regramento jurídico então vigente e do bom senso, pactuar outras formas de garantia que apenas suposta e retoricamente poderiam substituir a forma normativa de cautela prevista.” 

Em meio a essas suspeitas, foi deflagrada a Operação na última quarta, envolvendo o cumprimento de mandados de busca e apreensão contra uma ex-presidente e um ex-vice-presidente da Caixa Econômica Federal.

Entre 41 mandados em endereços ligados a pessoas e empresas envolvidas na compra de ações do Banco Pan pela CaixaPar, no fim de 2009, estão Maria Fernanda Ramos Coelho, presidente da Caixa Econômica Federal entre 2006 e 2011, e Márcio Percival, vice-presidente de finanças do banco de 2007 a outubro passado. Maria Fernanda é investigada porque na época era presidente do conselho de administração da Caixapar, braço de participações da Caixa, que na ocasião comprou 49 por cento do capital votante e 20,7 por cento das ações preferenciais do Pan por 739,2 milhões de reais. Em 2011, o BTG Pactual comprou por 450 milhões de reais, o controle do Pan que pertencia ao Grupo Silvio Santos.

O inquérito investiga, a responsabilidade de gestores da Caixa na suposta gestão fraudulenta, com possíveis prejuízos expressivos ao erário federal. Maria Fernanda e Percival também tiveram quebrados os sigilos fiscal e bancário. Também são investigados Henrique Abravanel, irmão de Silvio Santos, que era diretor conselheiro do Banco Pan e as empresas de consultoria, Deloitte, KPMG, Boccater, Camarfo, Costa e Silva Advogados, Banco e BDO.

A Procuradoria da República no Distrito Federal explicou que o objetivo é entender porque as avaliações foram feitas tão rapidamente e por que não foram capazes de identificar inconsistências contábeis do banco Pan. As inconsistências citadas resultaram do fato de o banco manter no balanço um grande volume de carteiras de crédito que tinham sido vendidas a outros bancos, uma maquiagem financeira, que fez o banco precisar de aportes, um de 2,5 bilhões, em novembro de 2010, e outro de 1,3 bilhão de reais, dois meses depois.

Em comunicado conjunto, MPF e PF também colocaram sob suspeição a atuação do Banco Central no episódio. Segundo os investigadores, o BC “jamais deveria ter autorizado o negócio a toque de caixa”. O BC era presidido na época por Henrique Meirelles, hoje ministro da Fazenda. “Questionado sobre o fato, o Banco Central afirma ter tomado conhecimento da situação financeira do banco apenas dois meses após a aprovação prévia da compra. Para o MPF, no entanto, esta não é a realidade. Técnicos da instituição teriam começado a desconfiar das inconsistências contábeis em maio de 2010, ou seja, antes da primeira análise da diretoria do BC”, diz trecho do documento.

A PF mobilizou ontem cerca de 200 agentes para cumprir 46 mandados de busca e apreensão expedidos pela 10ª Vara Federal de Brasília, sendo 30 em São Paulo, seis no Rio de Janeiro e seis em Brasília. As investigações policiais identificaram três núcleos do esquema criminoso, um formado por agentes públicos, outro por consultorias e um núcleo de empresários.

Os agentes públicos eram responsáveis pela assinatura de documentos, como pareceres e contratos, enquanto as consultorias eram contratadas para emitir pareceres para legitimar os negócios, e os empresários contribuíam para os crimes mediante a situação de suas empresas e a necessidade de dar aparência de legitimidade aos negócios, segundo a PF. 

O Banco Pan informou ontem em comunicado que a PF cumpriu mandado de busca e apreensão em sua sede, mas ressaltou que a ação não tem relação com a gestão atual do banco. “A companhia esclarece que está colaborando com as investigações e que tal fato não tem nenhuma relação com a gestão atual ou com suas operações”, afirmou o banco.

Em nota, a Caixa disse que está em contato com as autoridades e prestando “irrestrita colaboração” com os trabalhos de investigação. O banco também foi alvo de ação da Polícia Federal nesta quarta. O BTG Pactual afirmou que não foi parte ou teve envolvimento na compra de participação do Banco Pan pela CaixaPar.  Os investigados responderão por suspeita de gestão temerária ou fraudulenta, além de outros crimes que possam vir a ser descobertos, disse a PF. As penas para esses crimes podem chegar a 12 anos de reclusão.

A operação foi intitulada Conclave devido à forma sigilosa com que foram tratadas as negociações para a transação ocorrida entre o Banco Pan e a CaixaPar, em referência ao ritual a portas fechadas no Vaticano para escolha do papa, informou a PF.

(Com Reuters e Agência Estado)

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.