Reforma tributária prevê “imposto do pecado” sobre mineração, petróleo e veículos

Tributo deve incidir sobre "produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente"

Marcos Mortari

Mineração da Vale em Carajás (Pictures Ltd./Corbis/Getty Images)

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O projeto de lei complementar que trata da reforma tributária dos impostos sobre o consumo, entregue pessoalmente pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), ao Congresso Nacional, na última quarta-feira (24), entra em detalhes sobre o funcionamento do Imposto Seletivo − também conhecido como “imposto do pecado”.

A cobrança já estava prevista na Emenda Constitucional (EC 132/2023) que trata da reforma tributária, promulgada pelo Congresso Nacional no fim do ano passado. O texto trazia como diretriz a cobrança sobre a “produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente”.

Levando em consideração o comando constitucional, o projeto de lei complementar apresentado ontem determina incidência do Imposto Seletivo sobre 6 grupos de bens:

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1) veículos;

2) embarcações e aeronaves;

3) produtos fumígenos;

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4) bebidas alcoólicas;

5) bebidas açucaradas; e

6) bens minerais extraídos.

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No caso de veículos, embarcações e aeronaves, o governo alega que a cobrança se justifica por serem emissores de poluentes que causam danos ao meio ambiente e ao homem. A ideia é que o tributo incida sobre veículos automotores classificados como automóveis e veículos comerciais leves e variem a partir de uma alíquota base, de acordo com os atributos de cada veículo.

Para determinar a cobrança nesses casos, serão considerados 6 elementos: 1) potência do veículo; 2) eficiência energética; 3) desempenho estrutural e tecnologias assistivas à direção; 4) reciclabilidade de materiais; 5) pegada de carbono; e 6) densidade tecnológica.

Automóveis e comerciais leves considerados sustentáveis terão alíquota zero. Para o enquadramento na classificação, são considerados: 1) emissão de dióxido de carbono (eficiência energético-ambiental), considerado o ciclo do poço à roda; 2) reciclabilidade veicular; 3) realização de etapas fabris no País; e 4) categoria do veículo.

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O projeto de lei complementar prevê, ainda, a redução a zero da alíquota do Imposto Seletivo incidente sobre veículos vendidos a pessoas com deficiências ou a motoristas profissionais (taxistas), desde que benefício semelhante tenha sido reconhecido no âmbito do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), em nível subnacional, e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), em nível federal.

No caso de fumos, o governo também cita estudos que indicam resultado positivo da tributação no papel de desestimular o consumo, tendo em vista os danos provocados à saúde. O texto mantém a estratégia de combinação de alíquotas ad valorem e específicas incidentes sobre a produção de cigarros e propõe o mesmo tratamento tributário para charutos, cigarrilhas e cigarros artesanais.

O raciocínio é praticamente o mesmo adotado no caso das bebidas alcoólicas, em que o governo propõe um modelo de tributação que combina a aplicação de alíquota específica, variável de forma proporcional ao teor alcoólico, e uma alíquota ad valorem.

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Já para as bebidas açucaradas, a distribuição do mercado foi levada em consideração pela equipe econômica no desenho da tributação. Considerando que o setor possui estrutura concentrada nos fabricantes e fragmentada nas fases de distribuição e varejo, a ideia foi focalizar a cobrança sobre o fabricante na primeira venda e o importador.

O projeto de lei complementar estabelece que o IS também incida sobre a extração de minério de ferro, de petróleo e de gás natural. A ideia é que a cobrança aconteça na primeira comercialização pela empresa extrativista, ainda que o minério tenha como finalidade a exportação. Há também hipótese de incidência na transferência não onerosa de bem mineral extraído ou produzido.

O texto encaminhado ao Congresso Nacional prevê que o Imposto Seletivo incida uma única vez sobre o bem, eliminando o risco do “efeito cascata” da cobrança em mais de uma etapa da cadeia − preocupação de parte dos parlamentares e setores econômicos afetados pela tributação.

Pela norma, caberá à Receita Federal, órgão vinculado ao Ministério da Fazenda, administrar e fiscalizar o “imposto do pecado”. Em caso de contencioso administrativo, serão aplicadas as mesmas regras dos demais tributos federais, como a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) − que será criada no lugar do PIS e da Cofins.

Para passarem a valer, as novas regras previstas na reforma tributária precisam ser aprovadas nas duas casas legislativas. Por ser um projeto de lei complementar, o texto depende do apoio da maioria absoluta da Câmara dos Deputados (ou seja, 257 dos 513 votos) e do Senado Federal (ou seja, 41 dos 81 votos disponíveis).

A expectativa de integrantes do governo federal e dos presidentes das casas do Congresso Nacional é de que as discussões sejam concluídas ainda em 2024, apesar do calendário apertado por conta das eleições municipais.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.