Reforma Tributária: economistas alertam para ‘complexidade adicional’ com aumento das exceções

Braga incluiu saneamento, rodovias, telecomunicações e até agências de viagem e turismo nas exceções

Luís Filipe Pereira

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A ampliação dos setores que terão tributação reduzida e a criação de uma alíquota diferenciada para profissionais liberais, no parecer da Reforma Tributária do senador Eduardo Braga (MDB-AM), deixaram economistas com a sensação de que a proposta poderia ter ido em uma direção diferente.

Entre as mudanças propostas pelo relator no Senado, em relação ao texto aprovado pela Câmara, estão a inclusão de novos setores no regime específico, que terá tributação reduzida (saneamento, rodovias, telecomunicações e viagem e turismo), além de uma nova tributação sobre a extração de minério e petróleo (que terá alíquota de 1% sobre a extração de recursos naturais não renováveis).

O relator também sugeriu a criação de uma alíquota intermediária, com desconto de 30%, para profissionais liberais como advogados e médicos. Braga disse que a alíquota diferenciada atende a profissionais que não se enquadram no Simples e teriam um forte aumento de carga tributária com a PEC 45/2019.

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Mas especialistas alertam que o aumento no número de exceções poderá pesar na alíquota final do Imposto de Valor Agregado (IVA), aumentando-a. “Você abre a possibilidade de que essa alíquota no futuro seja utilizada por outros setores para conseguir uma diferenciação de alíquota que não seja tão baixa quanto a outra. E aí você começa a criar uma complexidade adicional no sistema. Começa a ter uma chance maior de judicialização, de competição, para ver quem pode ser contemplado”, pondera Adriano Laureno, gerente de macropolítica da Prospectiva Consultoria.

Para arrefecer os debates em torno da gestão do Conselho Federativo, Braga trocou o nome do colegiado para Comitê Gestor e reiterou que o órgão não será uma instância política, mas sim técnica. O presidente do comitê deverá ter “notórios conhecimentos sobre administração tributária” e ter seu nome aprovado pelo Senado Federal. Ele também poderá ser convocado pelo Congresso para prestar esclarecimentos, como ocorre com ministros atualmente, e as deliberações do comitê precisarão da aprovação de: maioria absoluta do colegiado; votos de estados que correspondam a 50% da população; e maioria absoluta dos municípios.

“Por um lado, você resolveu várias discussões ali federativas, mas por outro tem ainda questões setoriais. Essas discussões setoriais podem acabar levando a várias concessões, alíquotas diversas. Então acho que o ponto de atenção seria o número de exceções e, portanto, a alíquota final”, pontua o economista-chefe do BV, Roberto Padovani. “O que a gente está imaginando é que a reforma deve politicamente ser aprovada, mas vai ter muita negociação, vai ter muito ruído. Talvez a reforma não saia de uma maneira tão boa quanto se imaginava. Acho que a mensagem principal é essa”.

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‘Adicionando dificuldades’

Relatório assinado pelos economistas Felipe Salto e Josué Pellegrini e divulgado pela Warren Rena afirma que “o novo texto apresentado para a Reforma Tributária propõe mudanças que não corrigem os problemas do texto aprovado pela Câmara, mas acabam adicionando outras dificuldades”.

“No que se refere à transição, nada foi feito para trazê-la a um horizonte de curto prazo, bem como atenuar o problema da redução de alíquotas do ICMS e do ISS concentrada entre 2029 e 2032. Também não se avançou na redução das exceções. Ao contrário, introduziu-se a possibilidade de redução de alíquota de 30% para categorias profissionais eleitas. A gestão do IBS continuará centralizada em um único órgão e sua regulamentação virá por lei complementar”, destaca a análise.

O parecer da Reforma Tributária feito por Braga também prevê isenção de impostos para a cesta básica e redução de 60% para a chamada cesta estendida, cujo detalhamento também será definido por meio de lei complementar. Também foi incluído um mecanismo de devolução de impostos (“cashback”) na conta de energia das famílias mais pobres, que também será regulamentado em legislação após a promulgação da PEC.

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“Existiu a preocupação de criar duas cestas básicas porque o Eduardo Braga começou a prever que, provavelmente, se existisse somente uma cesta básica nacional, ia ter uma quantidade excessiva de produtos nessa cesta básica”, pontua Laureno. “Acho que é uma preocupação justa, mas, por outro lado, foi criada a ideia de que a cesta básica vai ter um caráter regional. Essa regionalização da cesta básica também cria uma complexidade adicional no sistema, com produtos iguais tendo uma tributação diferenciada em diferentes partes do país”.

Para garantir tratamento diferenciado à Zona Franca de Manaus, o relatório institui uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre importação, produção ou comercialização de bens que tenham a industrialização incentivada no polo industrial. A arrecadação será destinada à subvenção da industrialização incentivada na Zona Franca e também ao Fundo de Sustentabilidade para a região, que terá a gestão compartilhada entre a União e o estado do Amazonas.

Quanto aos benefícios ao setor automotivo no Centro-Oeste e no Nordeste, Braga decidiu retomar a tributação diferenciada que havia sido retirada do texto na votação na Câmara. O relator disse que os incentivos serão exclusivos para projetos de transição energética e inovação tecnológica e que haverá uma redução no benefícios a partir de 2029.