Reforma da Previdência: Os fatores que explicam a derrota que custou R$ 76 bilhões ao governo

O governo precisava garantir 49 votos para derrubar destaque supressivo do Cidadania, mas só teve 42 apoiadores

Marcos Mortari

Plenário do Senado (Marcos Oliveira/Agência Senado)

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SÃO PAULO – A noite de terça-feira terminou com sabor amargo para o governo no Senado Federal. Embora tenha conseguido aprovar o texto-base da reforma da previdência em primeiro turno com folga de 7 votos, o Planalto não conseguiu evitar uma derrota impactante no plenário da casa legislativa.

Durante a votação dos destaques ao texto do relator Tasso Jereissati (PSDB-CE), os senadores decidiram aprovar uma modificação com potencial de desidratar a reforma em R$ 76,4 bilhões em dez anos.

O destaque derrubou as novas regras sobre o abono salarial, que restringiriam o limite de renda mensal para dar direito ao benefício, pago por meio dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) a quem recebe até R$ 1.364,43 por mês.

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A votação em separado desse dispositivo foi solicitada pela bancada do Cidadania. O governo precisava garantir 49 votos favoráveis ao trecho, mas só teve 42 apoiadores. Pela derrubada da alteração, foram 30 senadores. A PEC principal contou com 56 votos favoráveis e 19 contrários.

Dos que apoiaram o texto-base, viraram os votos no destaque os senadores Alessandro Vieira (CID-SE), Alvaro Dias (PODE-PR), Dário Berger (MDB-SC), Eduardo Braga(MDB-AM), Eduardo Girão (PODE-CE), Esperidião Amin (PP-SC), Flávio Arns (REDE-PR), Jorge Kajuru (CID-GO), Kátia Abreu (PDT-TO), Mara Gabrilli (PSDB-SP), Reguffe (PODE-DF), Rodrigo Cunha (PSDB-AL), Styvenson Valentim (PODE-RN).

Já Marcos Rogério (DEM-RO) e Telmário Mota (PROS-RR), haviam votado sim ao texto base e depois não votaram no destaque. O senador Otto Alencar (PSD-BA) havia votado não ao texto base e depois votou sim para o destaque.

Por se tratar de uma emenda supressiva, a mudança não obrigará a PEC a passar por nova votação na Câmara dos Deputados. Caso não haja nenhuma alteração efetiva, o texto passará a valer depois de passar pelo segundo turno de votação no Senado Federal.

Antes da nova desidratação, a estimativa era que a proposta produziria uma economia de R$ 876,7 bilhões — o que corresponde a um impacto fiscal R$ 56,8 bilhões menor em relação ao texto que foi aprovado pelos deputados.

Com a derrota, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), submeteu a votação um pedido do líder do governo, Fernando Bezerra (MDB-PE) para suspender a sessão a sessão, que foi aprovado. A sessão deverá ser retomada nesta quarta, às 11h (horário de Brasília). Ainda restam seis destaques em separado para serem apreciados, com potencial de drenar o texto em mais R$ 200 bilhões.

Mas o que explica a derrota do governo?

“A votação de ontem foi um sinal de alerta para o governo e equipe econômica de que a análise dos destaques não é algo trivial. Também para Davi Alcolumbre, que poderia ter apresentado melhor controle do quórum nas votações para não sofrer esta e novas derrotas que desidratem ainda mais o texto”, observa a equipe de análise política da XP Investimentos.

O fato de a tramitação da reforma previdenciária ser desde o início considerada mais simples no Senado do que na Câmara pode ter contribuído para um menor empenho de articulação por parte do governo.

Some-se a isso a crescente insatisfação dos senadores com a inércia do pacto federativo e com a sensação de perda de protagonismo recente. Foi o momento ideal para que recados fossem dados ao Planalto.

A inexistência de uma base aliada formal também traz ainda mais incertezas para votações complexas, o que ensejaria maior cautela por parte da presidência e de lideranças favoráveis à reforma.

Também há quem chame atenção para os efeitos da ação da Polícia Federal contra o senador Fernando Bezerra como um episódio que fragilizou momentaneamente a articulação política governista na casa legislativa.

Considerando o avançar da hora da votação e o quórum reduzido, o governo optou por uma estratégia arriscada e pagou o preço.

“Ontem, era evidente que seria difícil votar todos os destaques madrugada adentro. Ainda mais quando era o governo quem precisava colocar 49 votos para barrar alterações no texto. Hoje, o maior risco continuará sendo lidar com o quórum, além de melhor articulação com senadores para evitar mais mudanças”, complementam.

(com Agência Estado e Agência Senado)

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.