Quanto você vai pagar de imposto com a reforma tributária?

Alíquota padrão ainda não foi definida, mas deve depender de conjunto de exceções à regra e eficiência do novo sistema

Marcos Mortari

Ilustração (Getty Images)

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A Câmara dos Deputados aprovou, no início de julho, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC 45/2019) que modifica a estrutura de cobrança de impostos incidentes sobre o consumo no Brasil ‒ tema discutido há décadas no setor produtivo e no mundo político.

O texto elimina 5 tributos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) e cria 2 impostos no modelo de um Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) dual: com a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) em nível federal, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) em nível subnacional. Além de um Imposto Seletivo (IS) incidente sobre atividades que causem danos à saúde ou ao meio ambiente.

A ideia é que os dois primeiros tributos tenham base ampla de cobrança, não sejam cumulativos, sejam cobrados “por fora” e no destino, com garantia de créditos ao longo da cadeia produtiva e sem diferenciação de tratamento entre produtos e serviços, tangíveis e intangíveis, e a um menor custo de conformidade.

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O novo modelo, que ainda depende de análise por parte do Senado Federal, promove mudanças significativas sobre o funcionamento das empresas e decisões operacionais e de investimentos a serem tomadas. Mas os efeitos nem sempre estão tão claros sob a perspectiva do consumidor.

Isso porque as possíveis alterações sobre a forma de a economia se organizar ainda são incertas, seja pelo fato de o texto estar em construção (e com necessidade de regulamentação posterior por lei complementar), seja pela complexidade do atual modelo e sua profusão de regimes diferenciados, que dificulta qualquer comparação. Economistas que estudam o assunto estimam que a reforma garanta um aumento no Produto Interno Bruto (PIB) potencial do Brasil de 12% em 15 anos.

Mas qual seria o valor do imposto pago pelo consumidor caso o novo modelo entre em vigor?

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A PEC aprovada pelos deputados não traz grandeza fixa para a alíquota padrão dos novos tributos, que deverá ser definida posteriormente através de lei complementar. O texto, no entanto, traz dispositivo que diz que “as alíquotas de referência serão revisadas anualmente (…) visando à manutenção da carga tributária” atual.

A ideia é que a alíquota seja calibrada durante o processo de transição do modelo atual para o novo, garantindo que não haja uma cobrança proporcionalmente maior ao consumidor em uma abordagem geral (já que variações entre setores poderão ocorrer em comparação com o que existe atualmente).

A versão da proposta votada pelos parlamentares traz 3 possíveis alíquotas para produtos e serviços:

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O texto também prevê regimes especiais para alguns setores da economia em que o modelo do IVA não seria facilmente aplicável, como instituições financeiras, combustíveis e lubrificantes, planos de saúde e cooperativas de créditos.

Para ver em detalhes os grupos sujeitos a alíquotas especiais ou regimes diferenciados, acesse o guia clicando aqui.

Como a proposta tem como objetivo ser neutra (ou seja, nem aumentar nem reduzir a carga tributária atual), especialistas não esperam grandes diferenças em valores a serem pagos pelo consumidor no curto prazo em termos gerais.

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Mas eles não descartam a possibilidade de mudanças, tendo em vista a esperada simplificação promovida pelo novo modelo, que pode trazer ganhos de eficiência e aumento da atividade econômica e uma reorganização dos setores produtivos.

Além disso, com menos exceções e regimes especiais, seria possível esperar uma base mais ampla tributada, redução da sonegação e da elisão fiscal, e, consequentemente, um imposto proporcionalmente menor para os contribuintes.

Mas tudo isso depende da versão final do texto votado pelo Congresso Nacional e as regras específicas a serem definidas por legislação própria.

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Nos cálculos de especialistas, a tendência é que o novo tributo tenha alíquota próxima de 25%. Ela pode crescer a depender do volume de exceções definidas pelos parlamentares.

Em entrevista concedida ao InfoMoney, o economista Bernard Appy, secretário extraordinário de Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, comemorou a aprovação do texto, mas disse gostaria de ver menos exceções na versão decidida pelos deputados.

Nos cálculos dele, se não houvesse nenhuma exceção, a alíquota do novo imposto seria “um pouco menor do que 25%” incidente sobre o preço sem imposto ‒ o que ele corresponde a 20% do preço com imposto. Ou seja, é possível que suba dependendo dos benefícios presentes na versão final.

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Appy explica que existem duas variáveis principais que definirão a alíquota do novo IVA ao final do processo: o volume de exceções e os ganhos de eficiência do novo modelo.

A primeira pressiona por uma elevação do percentual (já que, quanto mais segmentos pagando menos imposto, mais alta precisará ser a cobrança para os demais de modo a garantir a manutenção da carga). E a segunda gera oportunidades de redução do percentual (uma vez que, quanto menos sonegação for registrada, maior a base fiscal e mais baixa poderá ser a alíquota para gerar o mesmo efeito arrecadatório).

“Na hora em que se optou por colocar na própria emenda constitucional que só haveria uma alíquota e que não haveria benefícios fiscais, exceto os casos previstos na Constituição, trouxeram toda a discussão setorial para o texto. Isso tem um custo, que é o fato de trazer uma quantidade de exceções relativamente grande, mas há um benefício que diz que, depois de aprovada a emenda constitucional, isso está basicamente definido, não será possível por lei ficar incluindo benefícios fiscais ou criando alíquotas além daqueles já previstos”, disse Appy.

“Por outro lado, quanto menor o que chamamos de ‘gap’ de conformidade, menor tende a ser a alíquota. ‘Gap’ de conformidade é um indicador da relação entre quanto é arrecadado e o quanto seria arrecadado teoricamente, se fosse aplicada a legislação integralmente. Ele mede sonegação, elisão, o imposto declarado e não pago, e o que se deixa de arrecadar em função de judicialização”, ponderou.

“Nossa expectativa é que haja uma redução relevante no ‘gap’ de conformidade, em parte por conta da própria simplificação da legislação. Legislação mais simples reduz muito o risco da possibilidade de judicialização do pagamento do imposto. O próprio sistema de cobrança vai ser totalmente eletrônico e reduz o risco de sonegação. E há até discussão sobre um sistema de cobrança no momento do pagamento da operação, da liquidação financeira, estudado junto aos fiscos. Esse modelo reduz enormemente o risco de declarar o imposto e não pagar, porque o imposto é recolhido automaticamente”, explicou.

“O que é certo é que a alíquota vai ser fixada de forma a manter a carga tributária atual. Isso está no texto da [Proposta de Emenda à] Constituição. Então, não vai subir a carga tributária sobre o consumo, nem vai cair ‒ pelo menos em um primeiro momento. Quem sabe, no longo prazo, com a economia indo bem, a gente consiga reduzir a carga sobre o consumo, mas neste momento isso não é possível”, concluiu.

Em nota técnica divulgada no início do mês, João Maria de Oliveira, técnico de Planejamento e Pesquisa na Diretoria de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Dimac/Ipea), estimou a alíquota efetiva do novo tributo em 28,04%, considerando as exceções e regimes especiais aprovados pelos deputados. Caso confirmada, seria o maior IVA do mundo, superando a Hungria, que cobra 27% no tributo.

Conforme explicado em reportagem do jornal Folha de S.Paulo, o técnico estima que a manutenção de benefícios da Zona Franca de Manaus e do Simples Nacional sejam os elementos que mais pesarão para elevar a alíquota do novo imposto. Mas também pesam as exceções para setores muito demandados, como transporte.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), por sua vez, contestou os resultados e disse que o levantamento não considerou uma série de fatores, como o impacto sobre o combate à sonegação, evasão e corte de gastos tributários. Mas ainda assim afirmou que o trabalho serve como alerta aos parlamentares e à sociedade para os impactos de se aprovar um conjunto de exceções à regra.

O relator da matéria no Senado Federal, Eduardo Braga (MDB-AM), chegou a defender a definição de uma trava para a alíquota do novo tributo, de modo a evitar que ela escale a níveis exagerados. “Acho talvez prudente que se tenha um comando constitucional de mínimos e máximos no IBS [Imposto sobre Bens e Serviços] e para a CBS [Contribuição sobre Bens e Serviços]. Se não, vai deixar para uma lei complementar, que é uma matéria infraconstitucional, com quórum mais baixo”, afirmou.

Vale lembrar, por outro lado, que a PEC aprovada pelos deputados também determina que o Poder Executivo encaminhe ao Congresso Nacional, em até 180 dias após sua promulgação, projeto de lei que trate da reforma tributária dos impostos sobre a renda, acompanhado das correspondentes estimativas e estudos de impactos orçamentários e financeiros.

Conforme o texto, eventual arrecadação adicional da União decorrente desta segunda etapa da reforma tributária poderá ser considerada como fonte de compensação para redução da tributação incidente sobre a folha de pagamentos e sobre o consumo de bens e serviços ‒ o que poderia conferir maior progressividade ao sistema brasileiro.

Ou seja, a alíquota a ser paga no IVA dual poderá ser menor a depender do desenho da reforma sobre a renda definido pelo parlamento.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.