Qual é o recado da primeira grande manifestação pós-impeachment para Temer? Analistas respondem

Surpreendente pela quantidade de manifestantes e pelo perfil dos presentes, o ato do último domingo trouxe uma agenda difusa e chegou a ser comparada com as jornadas de junho de 2013

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – A manifestação do último domingo (4) superou com folgas as expectativas quanto ao público presente, mesmo com o horário considerado desfavorável. Segundo os organizadores, quase 100 mil paulistanos foram às ruas e ocuparam quatro quarteirões da Avenida Paulista para manifestar repúdio ao governo Michel Temer, recém-efetivado com o término do processo de impeachment que tirou do poder Dilma Rousseff em seu segundo mandato. Depois de subestimar o potencial dos protestos, o governo adotou tom mais cauteloso para lidar com a situação. Da China, questionado sobre o tamanho do movimento, o ministro Henrique Meirelles reconheceu “número bastante substancial de pessoas”, em tom mais equilibrado que o anteriormente adotado pelo peemedebista e o chanceler José Serra.

Para a cientista social e professora da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) Esther Solano, o número surpreendeu e mostrou muitos manifestantes nas ruas motivados por um impeachment já realizado, pela concretização do governo Temer e o que isso pode representar para a sociedade brasileira. “O perfil não me pareceu muito diferente das outras manifestações anti-impeachment ou ‘fora, Temer’, mas a agenda agora está se formando em torno a luta contra o retrocesso de direitos que se pode supor”, afirmou a professora, que tem se dedicado a acompanhar de perto a maioria das manifestações populares de todas as agendas e cores ideológicas realizadas na capital paulista desde as jornadas de junho de 2013.

Já Marco Antônio Teixeira, cientista político e professor da FGV (Fundação Getulio Vargas), chamou atenção para um público diverso nas ruas, composto por famílias, crianças e idosos. “Apesar de ter sindicatos, as pessoas não foram por isso. O grosso das pessoas não compareceu em função da esquerda, mas das agendas levantadas”, observou. Para o especialista, o caráter difuso das demandas dos presentes trouxe à memória o passado recente. “As pessoas foram motivadas por uma série de fatores da conjuntura. [a manifestação de domingo] Lembrou 2013 por ter agendas diversas”, complementou.

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Teixeira acredita que contribuíram para o êxito da mobilização “erros fatais” cometidos pelo governo e as intervenções excessivamente violentas da Polícia Militar para coibir atos isolados de vandalismo nos protestos anteriores — o que acabou se repetindo ao final do ato deste domingo. Para ele, a tentativa do presidente Michel Temer e do ministro das Relações Exteriores, José Serra, minimizarem o alcance e a demanda dos manifestantes pode ter tido papel relevante na forte presença no último domingo, assim como a sensação de cerceamento de direitos provocada pelas ações das forças de segurança do Estado e a proibição inicial empreendida sob a justificativa do evento do revezamento da tocha paralímpica. “O ‘Fora, Temer’ parecia em fadiga [após o impeachment de Dilma Rousseff], mas, ao que parece, começa a ganhar gás em uma nova etapa. Temos que dar tempo para ver o que deve ocorrer. Foi uma manifestação contra o cerceamento de direitos de protestos, a favor das Diretas Já”.

Analista político da XP Investimentos, Richard Back também procurou contextualizar os últimos protestos no histórico dos últimos protestos. Para ele, não foi como em 2013, quando era mais difícil identificar o perfil dos manifestantes, como tampouco foi uma repetição das mais recentes, durante o impeachment, quando era mais fácil enquadrar os presentes em estereótipos como “coxinhas” ou “mortadelas”. Além da forte presença nos protestos, o especialista chama atenção para a nova postura desse grupo que procura se organizar melhor politicamente. “O que se percebeu é que a esquerda está muito mais confortável na oposição. Está feliz em ser oposição outra vez. Se encaixar bem a oposição na rua e no parlamento, o caldo pode entornar”, concluiu.

Para Esther, trata-se de uma boa oportunidade de a esquerda se reorganizar, aproveitando a repulsa às medidas de ajuste fiscal. “Como oposição ao governo Temer, com o qual inclusive o mercado não está satisfeito, os grupos de esquerda, como movimentos coletivos, podem se reorganizar agora. A preocupação deve ser como sair da órbita petista para garantir autonomia, porque o PT, por enquanto, continua ancorado nas mesmas alianças que o comprometem”, argumentou. Ela ainda enxerga uma liderança sobre os protestos de grupos tradicionais como MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e CUT (Central Única dos Trabalhadores) e que ainda não consegue ampliar o perfil do público também para as periferias. “Tem gente envolvida nos protestos pensando em fórmulas que poderiam atrair outros grupos e dar mais heterogeneidade, como a pauta das ‘Direitas Já’. Ainda são protestos muito restritos a certos movimentos sociais, à academia, etc., que não conseguem agregar uma enorme parte da população que não se sente identificada com a pauta do impeachment”, concluiu.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.