Quais são os caminhos da esquerda e do PT com Lula preso?

Antes de se entregar, ex-presidente atrelou os caminhos da esquerda, a curto e médio prazos, aos seus

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Com a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o PT caminha para enfrentar o momento mais rigoroso de um inverno que já dura anos. O ato no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, além de uma manifestação contrária à condenação do líder da esquerda, marcou uma busca de Lula por reorganizar e preparar a base para uma nova situação, que não se sabe ao certo quanto tempo poderá durar. Tudo para evitar um abatimento que será difícil de não se confirmar com o passar do tempo.

O evento do último sábado evidenciou a resiliente liderança do ex-presidente na esquerda, independentemente do atual momento delicado. A força eleitoral de Lula, embora não seja a mesma de anos atrás, sobretudo no que diz respeito à sua capacidade de transferência de votos, continua sendo estratégica para este espectro político. Em seu último discurso antes de se entregar à Polícia Federal, o ex-presidente protagonizou uma espécie de “propaganda eleitoral gratuita”, apresentando alguns dos principais candidatos aliados.

Se não houver alteração no quadro atual, o petista pode ter encerrado sua participação na política formal, o que ainda é difícil crer. Embora as chances de Lula poder disputar a corrida eleitoral em outubro sejam remotas, faz parte da estratégia do PT manter o discurso de levar sua candidatura às últimas consequências. Afinal, hoje o ex-presidente lidera as pesquisas em todos os cenários em que seu nome é avaliado. Caso desde já anunciasse um substituto, o partido provavelmente deixaria a faixa dos 37% das intenções de voto com Lula para um patamar na casa de 3%, o que imediatamente altera a posição ocupada pelo partido no processo eleitoral, seja para uma disputa presidencial, seja para a costura de alianças estratégicas.

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“Eleitoralmente, o partido se depara com questões importantes: 1) o que fazer com o tamanho eleitoral de Lula, maior que o do PT e; 2) qual o limite Lula dará ao partido e aos seus dirigentes”, observaram os analistas políticos da XP Investimentos. Para eles, foi estratégica a postura do ex-presidente de manter perto de si os pré-candidatos Guilherme Boulos (PSOL) e Manuela D’Ávila (PCdoB). Da mesma forma, as referências não tão calorosas a Fernando Haddad (PT) mostram que o “plano B” do partido ainda não está em vias de ser posto em prática. “Lula deixa claro que, enquanto estiver vivo, o destino da centro-esquerda nacional pertence a ele”, complementaram os analistas. A aproximação pode sinalizar, ainda, uma tentativa de evitar o crescente risco de fragmentação, também presente na esquerda, sobretudo na ausência do ex-presidente da disputa.

A ausência mais comentada no ato de sábado foi de Ciro Gomes, pré-candidato à presidência pelo PDT. O ex-ministro do governo Lula estava nos Estados Unidos e rebateu às críticas sobre não ter participado daquele evento político: “Não sou puxadinho do PT e não serei jamais. Nos últimos 16 anos, apoiei Lula sem faltar um dia. Eles que façam dessa história o que eles quiserem fazer”. O movimento foi visto como um esfriamento nas relações, que tem acontecido nos últimos meses. Para Ciro, seria importante contar com o apoio do PT, mas ele sabe que isso é improvável. Por isso, também busca manter distância.

Do lado petista, parece que será difícil o partido abrir mão de uma candidatura própria. Além disso, apoiar o ex-governador cearense poderia ser um desafio de costura ainda mais complexo. De um lado, a militância não identifica Ciro como exatamente uma figura de esquerda. Do outro, a força do pré-candidato do PDT no Nordeste representa risco à hegemonia do PT na região em que é mais forte.

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Na avaliação dos analistas da XP Investimentos, os episódios recentes tornam ainda mais improvável uma aliança. “Todo mundo notou Ciro não ter aparecido em São Bernardo do Campo e tampouco ter sido solidário com Lula publicamente. Na caravana de Lula pelo nordeste ele também não se fez presente. O curioso é que Ciro Gomes teria sido tão importante quanto Lula, caso tivesse aparecido. Foi um erro tático bastante grande, e que cobrará um preço. Por ora, a conta vem em forma de distanciamento e desconfiança, e Ciro só ganha o apoio do PT como última, da última, da última, opção”, observaram.

Se em suas últimas movimentações antes da entrega à Polícia Federal Lula buscou atrelar os rumos da esquerda nacional ao seu próprio futuro, no PT a situação é ainda mais complexa. Conforme pontuou a equipe de análise política da XP, o partido tem um desafio interno e outro externo. “O interno será manter alguma coesão, o que será difícil. Externamente, carregar uma mensagem de resistência e vitimização deve ser a tônica para resistir aos próximos meses com Lula na cadeia, bem como manter uma fachada de diálogo com partidos aliados”, observaram os especialistas.

Quanto mais distante estiver a soltura de Lula e sua candidatura e mais próxima estiver a corrida eleitoral, mais difícil será evitar disputas internas em torno de maior protagonismo. O risco de “acefalia” já é temido por muitos integrantes da cúpula do PT.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.