Quais os impactos dos eventos envolvendo Roberto Jefferson sobre a última semana de campanha eleitoral?

Para analistas, episódio pode marcar mudança no momento das campanhas e colocar Bolsonaro na defensiva após onda favorável no primeiro turno

Marcos Mortari Anderson Figo

O presidente Nacional do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Roberto Jefferson, em entrevista a jornalistas (Foto: Valter Campanato/Agência Brasil)

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A sucessão de episódios envolvendo o ex-deputado federal Roberto Jefferson (PTB), que desacatou decisão judicial ao ir às redes sociais e insultar a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), depois recebeu a tiros de fuzil e granadas agentes da Polícia Federal, e retornou à prisão no último domingo (25), afeta a dinâmica da disputa pelo Palácio do Planalto.

A menos de uma semana do segundo turno daquilo que se desenha como a eleição presidencial mais apertada desde a redemocratização do país, analistas políticos consultados pelo InfoMoney avaliam impacto negativo dos eventos sobre os esforços da campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL) em reverter a vantagem de 6 milhões de votos construída pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no primeiro turno.

Para os especialistas, os episódios podem não tirar votos de Bolsonaro, aliado de primeira hora de Roberto Jefferson até pouco tempo atrás. Mas podem impactar as ações do atual presidente. Se semanas atrás sua campanha vinha embalada pelos resultados nas urnas melhores do que os esperados, o presente caso colocou a campanha bolsonarista na defensiva na semana mais importante da disputa pelo comando do Poder Executivo.

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“Bolsonaro vinha numa trajetória ascendente com relação aos votos que precisava conquistar. Lula está na frente, de fato, as pesquisas continuam mostrando isso, mas o presidente mostrava uma leve recuperação que poderia culminar numa onda final de segundo turno, como vimos uma onda positiva para ele no final do primeiro turno”, observa o cientista político Leandro Consentino.

Ele acredita que o caso de Roberto Jefferson, somado às declarações do ministro Paulo Guedes (Economia) de que o governo poderia desindexar o salário mínimo e as aposentadorias da inflação – ou seja, retirar a necessidade de reajustar os valores pagos ao resultado dos indicadores oficiais de preços ao consumidor –, gerou um momento negativo para a campanha de Bolsonaro e que pode gerar impactos sobre o desfecho do processo.

“O presidente, nesse episódio do Roberto Jefferson, acaba numa situação bastante complicada. De um lado, se ele reprovasse esse comportamento, como de fato fez, acaba perdendo apoios importantes daqueles que de alguma forma tinham comprado o discurso contra Alexandre de Moraes, tratando Roberto Jefferson como se fosse um ‘mártir’ da liberdade de expressão. Do outro lado, se ele deixasse de condenar, também perderia apoio importante em setores expressivos ligados às polícias, ou mesmo às Forças Armadas, por conta de anuir com um ataque às forças policiais”, avalia.

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Consentino também viu como ineficazes os primeiros esforços de Bolsonaro em se afastar da imagem de Roberto Jefferson. O mandatário chegou a afirmar que não havia fotos suas com o político – o que foi desmentido por diversas postagens com imagens dos dois nas redes sociais.

“Isso pesa negativamente para Bolsonaro num momento de reta final do segundo turno em que ele precisava conquistar votos de um eleitorado que já não era dele, um eleitorado que no primeiro turno se absteve ou que votou em candidatos de centro, e que estava cogitando votar no presidente agora, mas pode deixar de cogitar diante desses episódios”, concluiu.

Visão similar tem o cientista político Carlos Eduardo Borenstein, da consultoria Arko Advice. Para ele, os episódios recentes representam uma mudança na dinâmica das campanhas, que vinha em uma tendência favorável a Bolsonaro desde a virada do primeiro turno.

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“A campanha passa a viver um novo período a partir de agora. Desde o debate da Globo [no primeiro turno], a presença do Padre Kelmon (PTB) enredou a campanha petista na pauta dos costumes e colocou Lula na defensiva”, lembra.

“Mas, desde o domingo retrasado, com a fala de Bolsonaro sobre ‘pintar um clima’ com garotas venezuelanas, depois com as explicações de Guedes sobre um suposto projeto de desindexação do salário mínimo e agora, com o caso de Roberto Jefferson, quem está na defensiva é a campanha de Bolsonaro”, observa.

Para o especialista, os episódios garantem nova munição à campanha de Lula para estancar o avanço adversário na reta final da disputa. Já Bolsonaro precisará escapar do rótulo de radicalismo que a situação envolvendo o outrora aliado traz, para continuar buscando o eleitorado indeciso e, ainda, tentar virar votos depositados na candidatura adversária no primeiro turno – tarefa considerada complexa, sobretudo em um pleito tão polarizado.

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A Arko Advice considera 7 eventos, além da prisão de Roberto Jefferson, que podem não ter tido sua dimensão totalmente aferida pelas pesquisas, interferir no humor da opinião pública, e, consequentemente, afetar o resultado da eleição. São eles:

1) Agenda de costumes, sobretudo o engajamento de igrejas evangélicas pentecostais na campanha de Bolsonaro;

2) A polêmica decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de proibir a emissora Jovem Pan de se referir a Lula como “ex-presidiário”;

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3) Denúncias feitas por trabalhadores sobre pressões sofridas para votar em um determinado candidato;

4) A concessão de direito de resposta, por parte do TSE, a Lula contra campanha de Bolsonaro;

5) Maior punição para quem propagar fake news;

6) Explicações do ministro Paulo Guedes sobre o reajuste do salário mínimo e da aposentadoria;

7) Suspensão do consignado para beneficiários do Auxílio Brasil.

Recuperação prejudicada

O cientista político Antonio Lavareda, presidente do conselho científico do Ipespe, afirmou, nesta terça-feira (25), que o episódio envolvendo Roberto Jefferson pode ter prejudicado o movimento de recuperação de Bolsonaro observado nas pesquisas de intenção de voto desde o início da campanha em segundo turno.

Levantamento Ipespe/Abrapel divulgado mais cedo mostrou que Lula manteve vantagem numérica de 6 pontos percentuais sobre Bolsonaro na disputa, com 50% das intenções de voto totais, contra 44% do atual presidente. Apesar de o quadro indicar empate técnico, a repetição dos resultados pela terceira semana seguida indica favoritismo do petista neste momento.

“Um empate no limite da margem de erro, mas pouco plausível considerada a série de três levantamentos”, afirmou Lavareda.

“A evolução do incumbente registrada na semana anterior foi interrompida. Isso pode ter sido resultado do início da repercussão do episódio Roberto Jefferson com forte repercussão a partir do fim da noite do domingo. Lembrando que as entrevistas dessa pesquisa foram iniciadas no último sábado e concluídas com uma menor quantidade ontem”, observou.

“O que se pode esperar sobre a evolução dos competidores nos próximos dias? É verdade que nessa reta final, com os ânimos acirrados, deve-se esperar novas denúncias dos dois lados. Além do campo oficial lançar mão a cada momento de um arsenal inesgotável de recursos para tentar reduzir a liderança do adversário. E também teremos um último Debate na Globo, na sexta feira, com audiência certamente recorde. Tudo isso combinado certamente terá alguma influência, mas a cinco dias da votação uma reviravolta é muito difícil. Nunca houve na última semana numa eleição presidencial no Brasil. Só um fato extraordinário poderia inverter a posição dos concorrentes”, concluiu.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.