PEC dos Precatórios: Alcolumbre marca para 30 de novembro votação na CCJ do Senado; veja as mudanças na proposta

Novo texto torna Auxílio Brasil permanente, carimba recursos abertos com a PEC e cria comissão para monitoramento de precatórios

Marcos Mortari

O senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) durante sessão na CCJ (Foto: Pedro França/Agência Senado)

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SÃO PAULO – O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal, Davi Alcolumbre (DEM-AP), concedeu, nesta quarta-feira (24), vistas aos parlamentares após o senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), líder do governo na casa legislativa e relator da PEC dos Precatórios, concluir a leitura do parecer à proposta.

A matéria voltará à pauta do colegiado na próxima terça-feira (30), quando é esperada a votação. Para o texto avançar, é necessário apoio de maioria simples na comissão. Superada esta etapa, a tramitação segue para o plenário, onde precisa haver votação em dois turnos, com apoio mínimo de 3/5 dos senadores (ou seja, 49 dos 81) em cada votação.

O objetivo do governo é que a tramitação seja concluída no Senado Federal na próxima semana ‒ de “esforço concentrado”, quando a casa legislativa também deverá se debruçar sobre uma série de indicações de autoridades feitas pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), incluindo a de André Mendonça para o Supremo Tribunal Federal (STF).

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“A ideia inicial era de dar vista coletiva de 24h para deliberarmos amanhã aqui na CCJ. Mas os líderes se reuniram, conversaram com vários senadores, e chegou ao meu conhecimento que não faríamos desta maneira, pois queriam mais prazo para debater a matéria. Respeitando o acordo, vou determinar que a gente siga o que o presidente Pacheco determinou, que é a votação da proposta no dia 30 [de novembro]”, disse Alcolumbre.

O pedido de vista coletiva foi concedido com apoio de MDB, Podemos, PSDB, PSD, Progressistas e a liderança da maioria.

O que está em jogo

A PEC dos Precatórios libera espaço de R$ 106,1 bilhões no Orçamento de 2022, conforme cálculos atualizados do Ministério da Economia. O texto cria um subteto para a expedição de precatórios (que são dívidas judiciais do poder público sem possibilidade de novos recursos) pelo Poder Judiciário, limitando a evolução dessas despesas à regra geral do teto de gastos retroativa a 2016, ano de sua criação.

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Durante a tramitação na Câmara dos Deputados, também foi alterada a metodologia de cálculo do teto de gastos. Hoje, a regra fiscal permite a atualização dos gastos públicos pela inflação, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), acumulada em 12 meses até junho do ano anterior ao exercício. Pelo novo texto, o período de aferição passaria para janeiro a dezembro.

A matéria é tida pelo governo como fundamental para viabilizar o pagamento do Auxílio Brasil – novo programa de transferência de renda criado para substituir o Bolsa Família – em versão mais robusta. O benefício começou a ser pago em novembro, em valor médio de R$ 217,18 (aumento de 17,84% em relação ao tíquete médio de R$ 189 pago no programa anterior) a 14,5 milhões de famílias.

O objetivo de Bolsonaro é ampliar o valor do benefício a pelo menos R$ 400,00 para todas as famílias até dezembro de 2022. O número de contemplados também deverá crescer para 17 milhões. No Senado, há pedidos para elevar para até 21 milhões.

Para arcar com os novos recursos, o Palácio do Planalto conta com a aprovação da PEC dos Precatórios, mas tem enfrentado resistências durante a tramitação no texto no Senado Federal. O governo também corre contra o tempo para implementar o Auxílio Brasil “turbinado” ainda em dezembro de 2021, para já colher os frutos políticos da medida e evitar riscos jurídicos de fazer o movimento em ano eleitoral.

Do lado dos precatórios, o substitutivo limita as expedições de novas dívidas pelo Poder Judiciário em determinado exercício a uma correção anual pela inflação do valor pago em 2016. Na prática, é a mesma lógica do teto de gastos, desta vez usada para restringir o pagamento de dívidas que a própria Justiça determina que o poder público deve pagar.

O limite corresponderá, em cada exercício, ao limite estabelecido pela atualização da regra fiscal, reduzido da despesa com o pagamento de requisições de pequeno valor (RPVs), que terão prioridade no pagamento. Integram o grupo peças que não ultrapassem 60 salários mínimos (ou seja, R$ 66 mil).

O texto determina que precatórios que não forem expedidos, em razão da restrição de despesas aplicada, tenham prioridade nos exercícios seguintes – o que críticos apontam como risco de “efeito bola de neve”, quando a dívida cresce mais rápido do que a capacidade de pagamento do governo. O cálculo do limite não considera um possível “encontro de contas” entre os entes e atualização monetária ou a quitação por acordo de renúncia de 40% dos valores por parte do detentor dos direitos ao precatório.

A atual versão do texto permite que os credores não contemplados pela quitação em um ano possam optar pelo recebimento dos recursos em parcela única, até o final do exercício seguinte, mediante acordos diretos perante Juízos Auxiliares de Conciliação de Pagamento de Condenações Judiciais contra a Fazenda Pública Federal, desde que com renúncia de 40% dos valores.

A norma seria regulamentada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mas é vista por críticos com elevado risco de judicialização no futuro, já que os precatórios são compromissos financeiros reconhecidos pelo Poder Judiciário e que devem ser honrados pelo governo federal.

Os precatórios pagos com desconto não serão incluídos no limite anual dessa despesa no orçamento e ficarão de fora do teto de gastos. Essas exclusões se aplicam ainda àqueles precatórios para os quais a Constituição determina o parcelamento automático se seu valor for maior que 15% do total previsto para essa despesa no orçamento.

De igual forma, o texto introduz a possibilidade de o ente devedor utilizar empréstimos como instrumento específico de liquidação de precatórios, mediante acordo direto com os credores.

O novo substitutivo também torna possível a utilização dos precatórios para:

I) Quitação de débitos parcelados ou débitos inscritos em dívida ativa do ente devedor, inclusive em transação resolutiva de litígio, e, subsidiariamente, débitos com a administração autárquica e fundacional do mesmo ente;

II) Compra de imóveis públicos de propriedade do mesmo ente;

III) Pagamento de outorga de delegações de serviços públicos e demais espécies de concessão negocial promovidas pelo mesmo ente;

IV) Aquisição, inclusive minoritária, de participação societária do respectivo ente federado;

V) Compra de direitos do respectivo ente federado, inclusive, no caso da União, da antecipação de valores a serem recebidos a título do excedente em óleo em contratos de partilha de petróleo.

Nestes casos, as despesas também ficarão de fora do teto e do limite os precatórios. A versão original encaminhada pela equipe econômica do governo federal apenas previa as situações de compra de imóveis públicos ou aquisição de participação societária, mas os demais pontos foram incluídos durante a tramitação da matéria na Câmara dos Deputados.

A atual versão do texto mantém a possibilidade do chamado “encontro de contas” entre a União e os entes federativos, inclusive com a possibilidade de dedução dos valores eventualmente devidos por estados de recursos estipulados para repasse pelos fundos de participação, tal qual previa a proposta original.

Estão previstos quatro tipos de compensação, fora do limite anual da regra fiscal, de despesas com precatórios usados pela União e demais entes federativos:

I) Contratos de refinanciamento;

II) Quitação de garantia executada se concedida a outro ente federativo;

III) Parcelamentos de tributos ou contribuições sociais;

IV) Obrigações decorrentes do descumprimento de prestação de contas ou de desvio de recursos.

Essas compensações são direcionadas principalmente a estados e municípios que têm dívidas refinanciadas perante a União e participam de programas de recuperação fiscal cujos contratos exigem a observância do teto de gastos. No entanto, somente podem ocorrer se for aceito por ambas as partes.

Quando incidirem sobre parcelas a vencer, haverá redução uniforme no valor de cada parcela, mantida a duração original do respectivo contrato ou parcelamento.

Adicionalmente, o texto especifica que os contratos de parcelamentos ou renegociações de débitos firmados pela União com os entes federativos deverão conter cláusulas para autorizar que os valores devidos serão deduzidos dos repasses aos fundos de participação (FPM ou FPE) ou dos precatórios federais a pagar.

Entre as contrapartidas exigidas, o substitutivo lista medidas de ajuste fiscal, como a adoção de regras de elegibilidade, cálculo e reajustamento dos benefícios que contemplem regras assemelhadas às aplicáveis aos servidores públicos do RPPS da União, a adequação da alíquota de contribuição devida pelos servidores e a instituição do regime de previdência complementar.

O texto que veio da Câmara dos Deputados também estabelece que os precatórios para o pagamento de dívidas da União relativas ao antigo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) deverão ser quitados com prioridade em três anos: 40% no primeiro ano e 30% em cada um dos dois anos seguintes. Essa prioridade não valerá apenas contra os pagamentos para idosos, pessoas com deficiência e portadores de doença grave.

De acordo com a Consultoria de Orçamento da Câmara, do total de precatórios previstos para pagamento em 2022, 26% (R$ 16,2 bilhões) se referem a causas ganhas por quatro estados (Bahia, Ceará, Pernambuco e Amazonas) contra a União relativas a cálculos do antigo Fundef. Parte dos recursos deve custear abonos a professores, conforme disciplina o PL 10.880/21, aprovado também nesta terça-feira pela Câmara.

Quanto ao credor privado, a proposta tenta resolver um ponto considerado inconstitucional nas versões anteriores de compensação dos precatórios com dívidas tributárias perante o Fisco. Decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) deu sobrevida até 2020 à norma considerada inconstitucional que previa a compensação de ofício pela Fazenda Pública.

O substitutivo propõe que o governo deverá depositar o valor equivalente aos débitos inscritos em dívida ativa na conta do juízo em que está a ação de cobrança do Fisco contra o credor do precatório. Dessa forma, não haveria compensação automática e o juiz decidiria sobre isso conforme procedimento definido em lei própria.

Outra mudança na regra geral de pagamento de precatórios é o uso da taxa básica de juros, a Selic (atualmente em 7,75% ao ano em tendência de alta), para atualizar os valores de qualquer tipo de precatório a título de atualização monetária, remuneração do capital e compensação de mora.

Quando do julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em 2015, que a Selic poderia ser usada apenas em precatórios tributários. Os demais deveriam ser corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), que repõe a inflação.

À época, a Corte considerou que o índice da poupança imposto pela Emenda Constitucional 62/09 não mantinha o poder de compra do dinheiro ganho na causa. Como juros de mora, impôs 0,5% ao mês calculados até o momento da expedição do precatório e incidentes também a partir do momento em que houver atraso na quitação. Em 2021, por exemplo, o IPCA-E acumulado está em 7% (até setembro).

Alterações no Senado

Diante das resistências de senadores ao texto vindo da Câmara dos Deputados, o relator Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) abriu uma frente de negociações para modificar o texto em busca do apoio necessário. Por se tratar de PEC, é necessário apoio de 3/5 em cada casa legislativa (ou seja, pelo menos 308 dos 513 deputados e 49 dos 81 senadores) nos dois turnos de votação em cada plenário.

Pela regra, as casas também precisam aprovar a mesma versão do texto para que ele seja promulgado e passe a valer. A PEC vai de uma casa para a outra (o chamado pingue-pongue) até que seja votada sem diferenças de mérito.

No parecer protocolado, Bezerra acolheu 13 emendas propostas pelos parlamentares. Leia a íntegra do relatório clicando aqui.

Veja os 7 principais pontos incluídos:

1) Segurança no Pagamento das Parcelas do Fundeb
Determinação clara de prazos para o pagamento de precatórios relativos ao antigo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef). Desta forma, 40% seriam pagos até 30 de abril, 30% até 31 de agosto e o restante até 31 de dezembro. Assim, fica assegurado repasse regular dos recursos ao longo do ano, eliminando preocupação de governadores de que o governo deixasse para pagar apenas no fim do exercício.

2) Pagamento de Bônus com Recursos dos Precatórios do Fundeb
Inclusão de exigência de que estados e municípios que receberão os precatórios não transformem os recursos em despesas permanentes, que poderiam desequilibrar as contas dos entes a longo prazo. O substitutivo prevê o repasse de, no mínimo, 60% dos recursos aos profissionais do magistério, inclusive aposentados e pensionistas, na forma de abono, vedada a incorporação na remuneração, aposentadoria ou pensão.

3) Formação dos precatórios
Previsão de maior participação do Poder Legislativo na constituição dos precatórios. O texto prevê que, no prazo de um ano a contar da promulgação da emenda constitucional, o Congresso Nacional promoverá, através de Comissão Mista, exame analítico e pericial dos atos, fatos e procedimentos geradores dos precatórios e sentenças judiciais contrárias à Fazenda Pública.

O colegiado atuará em cooperação com o Conselho Nacional de Justiça podendo requisitar informações e documentos de órgãos e entidades da administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Ao final, o parlamento encaminhará suas conclusões aos presidentes do Supremo Tribunal Federal, dos Tribunais Superiores, dos Tribunais Regionais e dos Tribunais de Justiça dos Estados, bem como ao Procurador-Geral da República, para a prática de atos de sua competência.

4) Alocação do Espaço Aberto no Teto
Vinculação explícita de parte do espaço fiscal aberto no Orçamento com a proposta para a ampliação de programas sociais de combate à pobreza e extrema pobreza, bem como a outras despesas obrigatórias ou atreladas à saúde, previdência e assistência social.

5) Auxílio Brasil permanente
Inclusão de dispositivo nos Atos das Disposições Transitórias da Constituição Federal que dispensa a legislação que trata de programa permanente de transferência de renda da observância das limitações legais quanto à criação, à expansão ou ao aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento de despesa.

6) Mudança do prazo para inclusão dos precatórios no PLOA
Previsão que o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) preveja, em seu anexo de riscos fiscais, o volume de decisões judiciais que pode vir a ser pago no exercício seguinte. O texto estipula a data de 2 de abril para a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, da verba necessária ao pagamento dos débitos oriundos de sentenças transitadas em julgado.

7) Direitos adquiridos por terceiros
Inclusão de trecho que explicita que a faculdade reservada ao credor para realizar o chamado “encontro de contas” abrange os créditos próprios, mas também os adquiridos de terceiros. Tal dispositivo coloca o adquirente na condição de credor, o que denota direito de utilização dos valores nas mesmas condições que os credores originais.

Perspectivas

Uma das ideias em discussão entre os parlamentares seria fatiar a PEC dos Precatórios. Na prática, isso garantiria que pontos em comum já aprovados pelos deputados pudessem ir à promulgação caso também aprovados pelos senadores. Neste caso, retornaria à Câmara dos Deputados apenas as novas modificações ao texto.

Mas a “PEC paralela” não agrada alguns parlamentares, que temem que as mudanças não sejam acatadas ou sequer apreciadas pelos deputados. Neste caso, a opção seria o envio completo da PEC dos Precatórios à Câmara, onde precisaria ser analisada mais uma vez.

Dessa forma, o grupo de senadores que pede que o programa se torne permanente, que se crie a comissão para auditar precatórios, além das mudanças sobre os precatórios do Fundef e da vinculação dos recursos ao programa de transferência de renda, teria mais segurança de que as sugestões não serão ignoradas.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.