Para maior Bolsa do mundo, “seca em SP preocupa mais que política”

Economista-chefe da CME Group vê cenário melhor para economia brasileira em 2015 e prevê forte queda da Selic em meados do próximo ano

João Sandrini

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(SÃO PAULO) – Para Blu Putnam, economista-chefe do CME Group, a maior Bolsa de contratos futuros do mundo e também a maior Bolsa do planeta em valor de mercado, os investidores brasileiros erram ao tomar uma postura muito cautelosa neste momento. Para o executivo, com o término das eleições, há menos incertezas sobre o país. Se o cenário internacional continuar benigno, ele acredita que os investidores estrangeiros voltarão para o Brasil, o real irá a se valorizar ante o dólar e o Banco Central poderá promover uma forte queda na taxa Selic mais adiante – ao contrário do que aconteceu nesta quarta-feira, quando o BC elevou os juros para 11,25% ao ano. Putnam conversou com o InfoMoney no escritório do CME Group, que fica num dos prédios no Centro de São Paulo que abriga a BM&FBovespa, sua parceira estratégica. Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

InfoMoney – Em suas apresentações, o sr. costuma adotar um tom mais otimista do que a maioria dos analistas sobre o Brasil. Por quê?

Blu Putnam – É verdade. Acho que a maioria dos economistas vê o Brasil sofrendo um impacto muito grande da desaceleração da China, da ausência de crescimento na Europa, do ritmo de alta de 2% para o PIB dos EUA e da queda do preço das commodities. Há ventos contrários ao Brasil mesmo, e eles vão continuar a existir em 2015. O preço das commodities continuará baixo. Mas acho que há melhorias suficientes ao redor do mundo para favorecer o Brasil. A economia pode melhorar um pouco.

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IM – Quais são os sinais de que as coisas serão melhores?

BP – Nos dados econômicos, ainda não há sinais. Mas quem olha as causas da desaceleração percebe melhorias moderadas. Por exemplo, em junho de 2013 houve muitos protestos no Brasil que geraram um clima de instabilidade política. Isso não existe mais. A própria campanha eleitoral foi acirrada o suficiente para gerar incertezas e reduzir a atividade econômica. Apenas o fato de essas coisas começarem a desaparecer já ajuda. No cenário internacional, a China continua em desaceleração, mas o mundo já se acostumou com isso. E a China continua a crescer 6,5% ou 7%, o que é muito bom, ainda que não seja tão bom como costumava ser. A Europa aparentemente vai sair da recessão em 2015 e crescer um pouquinho, algo próximo a 1%. É melhor que um número negativo. São várias coisas que estão melhorando devagarinho.

IM – Mas os EUA devem começar a elevar os juros em breve, possivelmente já no primeiro semestre de 2015. Isso não é má notícia para o Brasil?

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BP – Há duas teorias sobre o assunto. Muita gente acha que a alta nos juros americanos é ruim para o crescimento econômico. O que penso é diferente. Se o Federal Reserve elevar os juros de curto prazo de 0 para 0,25%, isso é quase nada. Supondo que eles comecem a fazer pequenos aumentos, acho que será um sinal de que finalmente os EUA estão fora do hospital, que a economia está saudável o suficiente para crescer pelas próprias pernas. Será um sinal que o Fed de Bem Bernanke nunca deu porque preferiu continuar com as medidas emergenciais. Já o Fed e Janet Yellen pode dar esse sinal de saúde da economia.

IM – Mas se os mercados reagiram mal ao “tapering”, por que eles reagiriam bem a um aumento dos juros?

BP – Acho que foi um mal-entendido. As conversas sobre “tapering” começaram exatamente no mesmo mês em que as ruas dos Brasil foram tomadas por manifestações. A Bolsa caiu e o dólar subiu. Mas não vejo uma relação de causa e efeito. Havia o risco político causado pelas manifestações contra a Copa. Na época também houve manifestações na Turquia, a guerra civil na Síria e os problemas na Líbia. Parecia que o risco estava crescendo em vários países emergentes. Como as Bolsas dos EUA estavam indo muito bem, os investidores venderam posições em emergentes para ir para lá. Mas não acho que foi a expectativa do fim do “quantitative easing” que levou a Bovespa a cair. Se fosse só o “tapering”, as Bolsas dos EUA também deveriam ter sofrido ao invés de ter registrado forte alta. É por isso que acho que o aumento dos juros nos EUA não vai ser um problema. Os sinais de que o Fed está mais confiante vão permitir que os investidores tomem mais risco. Então a América Latina será beneficiada. Os investidores vão comprar Bovespa e real.

IM – Por que o sr. acredita que os juros vão subir tão pouco nos EUA?

BP – O Fed só se move em passos curtos. Se subirem os juros em julho, também haverá altas em setembro, outubro e dezembro. Acho que os juros vão estar em 1% no começo de 2016. Não conheço empresa no mundo que vai alterar sua estratégia de investimentos porque os juros de curto prazo nos EUA vão subir de 0 para 1%. O sinal de confiança vai ser mais positivo do que o impacto negativo de um pequeno aumento no custo de capital.

IM – Quão mais baixos podem ficar os preços das commodities?

BP – Acho que já caíram bastante e podem ficar apenas um pouco mais baixos. Esse é o caso do petróleo. Os preços agrícolas como soja e milho já estão baixos há algum tempo e não devem cair mais. Os metais estão vulneráveis, em particular o ouro. As pessoas compram ouro quando há inflação ou desastre financeiro e vendem quando acham que o Fed vai elevar os juros. Então o ouro vai se desvalorizar se os juros nos EUA subirem mesmo para 1%. O minério de ferro depende do crescimento da China e da Ásia. Como a região está desacelerando, os preços ficaram baixos e não vejo eles subindo com o atual cenário econômico mundial.

IM – O sr. prevê um crescimento médio da China de 6% ao ano nesta década. Então a desaceleração não acabou, certo?

BP – Sim. A China começou a década com um crescimento de 10% ao ano e deve terminá-la com 4% ao ano. Mas isso não é tão ruim assim. Primeiro porque agora a China é uma economia enorme. E segundo porque 6% é muito bom. Era natural que eles não conseguissem crescer 10% para sempre. A demografia já não ajuda tanto. A política de “uma criança por casal” conseguiu frear o crescimento da população, que agora está começando a se tornar mais velha. Cerca de 12% dos chineses têm mais de 65 anos. Em 2025, já vão ser 24%. Os aposentados não consomem tanto quanto os jovens. A China pode lidar com isso da mesma forma que os EUA, onde o crescimento anual caiu de 3,5% para 2,5% ao ano com o envelhecimento da população.

IM – O sr. acredita que a estagnação da economia brasileira se deve a fatores internos ou externos?

BP – As razões externas respondem por 50% a 60% da desaceleração. Na década passada, o Brasil se beneficiou do boom das commodities. Agora os preços caíram, e não há nada que o Brasil possa fazer a respeito disso. O PIB não vai crescer 5% ao ano com esses preços das commodities e com a desaceleração da China. Os outros problemas são o excesso de regulação para os investimentos externos, a incerteza política e a seca. A possibilidade de racionamento de água em São Paulo vai afetar o crescimento. Acho que a economia brasileira poderia crescer 3% em 2015, mas vai ser algo mais próximo a 2% por causa da seca. Estou mais preocupado com a seca do que com a política.

IM – O mercado ainda desconfia da Dilma. Por que o sr. acredita que a economia vai acelerar?

BP – Já vi muitas eleições em que os apoiadores de um candidato diziam que, se ele vencesse, a economia aqueceria, e, se ele perdesse, desaceleraria. É assim que as eleições funcionam. Mas a realidade é que os políticos não têm o poder que eles imaginam. As mudanças que virão não serão drásticas. Não vejo uma recessão em 2015.

IM – Se o governo tiver um novo ministro da Fazenda heterodoxo, os mercados não podem reagir mal?

BP – Os mercados sempre preferem mais liberdade na economia, mas nem sempre os mercados estão certos. Vários problemas do Brasil não são macroeconômicos. Se o Brasil conseguir lidar com a falta de água e com os problemas de segurança nas grandes cidades e fazer progressos na educação, isso fará mais diferença nos próximos cinco anos do que impostos caindo ou subindo ou orçamento mais generoso ou enxuto. Só que isso leva cinco anos para fazer efeito.

IM – Já no caso da adoção de políticas econômicas ruins, o efeito será muito mais imediato?

BP – O cenário não é tão ruim. Os juros já são muito altos e acho que a Selic pode cair para 7% em 2015. Os juros no México estão entre 3% e 4%. As taxas brasileiras estão entre as maiores da América Latina. As incertezas sobre eleições e manifestações fizeram muita gente ver um risco político no Brasil que não existe. Se o mundo crescer e as Bolsas estabilizarem, os investidores vão tomar mais risco. Vão comprar Bovespa e real. Então 7% no Brasil poderá ser melhor que 4% no México ou 0 no Japão. Se o real se valorizar, o Banco Central poderá aproveitar a chance para voltar a reduzir os juros. Os preços mais baixos do petróleo ajudam. Não há inflação ao redor do mundo. Pode ser que a Selic não chegue a 7%, mas o sentimento que tenho é que pode cair muito em 2015.

IM – Não vejo ninguém tão otimista assim no mercado…

BP – Para montar cenários, as pessoas usam premissas. Minhas premissas são que o mercado acionário americano não vai cair, que os EUA vão crescer ao menos 2% ao ano e que a China vai se estabilizar. Essas são as condições para que o dinheiro venha ao Brasil e considero que há 65% de chance de acontecer.

IM – Qual é o principal erro dos investidores brasileiros?

BP – Os investidores estão muito receosos porque a Bolsa caiu nos últimos anos, mas não deviam. Eles estão tomando tão pouco risco. Quando as Bolsas e as commodities caem e o país não cresce, as pessoas ficam um pouco deprimidas com seus investimentos. Mas essas coisas passam. O mundo está fazendo ajustes. As Bolsas devem apresentar melhores resultados em 2015. Sempre lembro a mim mesmo que não devo ficar deprimido porque a Bolsa caiu em um mês. É comum que as Bolsas caiam em outubro. Não há razão para isso, mas acontece em anos seguidos, da mesma forma que geralmente as Bolsas sobem em dezembro e janeiro. Passadas as eleições, as coisas começam a melhorar.

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