Luz no fim do túnel ou fogo de palha: Meirelles é o salvador da pátria?

Mercados se animam com possibilidade de Henrique Meirelles assumir o ministério da Fazenda, mas a euforia pode durar pouco

Lara Rizério

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SÃO PAULO – Poucos poderiam imaginar. Mas, sim, os rumores sobre a saída do ministro da Fazenda, Joaquim Levy estão trazendo bons ventos ao mercado.

Se, no fim da tarde de ontem, o Ibovespa zerou as perdas pelas indicações mais fortes de que Levy poderia sair – e também impulsionado pela melhora externa -, a quarta-feira é de euforia para os mercados. O Ibovespa chegou a registrar alta superior a 2% durante a manhã, o dólar cai forte e os juros futuros também têm baixa por conta dos rumores. 

Mas como a saída de um ministro pró-mercado e com doutorado pela Universidade de Chicago pode gerar tamanho efeito positivo no mercado? A resposta atende pelo nome de Henrique Meirelles.

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Mesmo contra todas as vontades da presidente Dilma Rousseff para colocá-lo no cargo, a ideia de que Meirelles possa assumir a Fazenda ganha forças e é bem vista pelo mercado. Presidente do Banco Central no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Meirelles é conhecido como parte importante do bom relacionamento do petista com o mercado após os temores no final de 2002 sobre a ida de Lula para o poder. 

Meirelles vem do mercado financeiro e, em 1984, tornou-se presidente do ramo brasileiro do Bank Boston. Porém, ele também está na política. Em 2002, candidatou-se pelo PSDB de Goiás para o cargo de deputado federal, sendo o mais votado, não assumindo o cargo justamente para gerenciar o BC. Hoje no PSD após passagem pelo PMDB, rumores não confirmados apontaram que ele poderia se candidatar ao governo de Goiás em 2010 e até para a prefeitura de São Paulo em 2016. 

Isso dá um pouco o parâmetro sobre o que Meirelles que tem que Levy não teria. Além do apoio do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-presidente do BC tem mais interlocução política, o que é um dos defeitos do governo para a aprovação do ajuste fiscal.

Além disso, conforme informa a Folha de S. Paulo de hoje, os próprios ministros estão “fritando” Levy, que já teve indisposições com Nelson Barbosa (Planejamento), Carlos Gabas (ex-ministro da Previdência) e Edinho Silva (Comunicação Social). A pressão, que já vinha do PT, soma-se ainda a uma maior indisposição dos empresários em relação ao ministro, que estão insatisfeitos com o corte de subsídios que garantia crédito do BNDES a custo baixo para os seus negócios.

Na outra mão, conforme informou o Valor, com o aval de Lula, Meirelles já estaria se reunindo com líderes políticos governistas para discutir cenários econômicos para o Brasil. Visto como ortodoxo, Meirelles seguiria com o ajuste fiscal, sendo até mais efetivo do que Levy para tanto neste assunto.

Porém, as dúvidas permanecem…
As análises de economistas e analistas políticos sobre o real “efeito Meirelles” na economia são bastante divergentes, ainda mais no referente ao possível destravamento das relações com o Congresso para a aprovação do ajuste. 

Boa parte da percepção é de que as dificuldades são de responsabilidade do próprio governo, que tem dificuldades de controlar sua base, enquanto o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) deixa as votações mais importantes em “banho-maria” enquanto busca salvar seu mandato. Neste sentido, quem “pagou o pato” foi Levy, mas há poucas indicações de que haveria uma mudança significativa com outro em seu lugar. 

Conforme destaca a consultoria de risco político Eurasia, qualquer substituto de Levy vai, provavelmente, fortalecer a aposta na agenda atual com reformas econômicas estruturais
ao invés de voltar atrás na disciplina fiscal, o que tranquiliza os mercados. Para a Eurasia, a saída de Levy é esperada para o primeiro semestre de 2016, após o aprofundamento da atual
crise política e econômica.

Ajuste ou não ajuste: eis a questão
Enquanto Meirelles é bem visto pelo mercado, os planos de Lula para o possível futuro ministro não indicam convergência com as propostas de intensificação do ajuste fiscal. Em busca de fatos positivos que possam fortalecer o governo Dilma e a possível candidatura em 2018, Lula vem defendendo aumento de crédito para aumentar o consumo.

Apesar do sentido contrário em busca do ajuste fiscal, para o Deutsche Bank, não há tanto motivo para achar que haverá um retrocesso no aperto. “Em nossa avaliação, tal estratégia seria um tiro pela culatra, pois prejudicaria os esforços para ajustar a política fiscal atual, que em nossa avaliação é uma condição indispensável para reforçar a confiança e pavimentar o caminho para a recuperação da economia no futuro. No entanto, é possível que Lula tenha levantando a questão de crédito a fim de tornar mais fácil para o PT aceitar a nomeação de Meirelles, que ganhou a reputação de ‘hawkish’ durante seu mandato no Banco Central durante o governo Lula”, afirma o banco alemão.

O Deutsche mostra ceticismo sobre uma possível entrada de Meirelles na Fazenda, mas afirma que essa chance aumenta com a economia aprofundando a recessão e sem horizonte positivo para o fim do impasse político. Mas, mesmo se Meirelles entrar, não haverá soluções fáceis. 

“Em nossa avaliação, a nomeação de Meirelles como ministro da Fazenda seria positivo para o mercado brasileiro no curto prazo, mas gostaríamos de manter uma visão cautelosa de médio prazo, pois acreditamos que o governo vai continuar enfrentando enormes dificuldades na implantação de um plano de austeridade fiscal e de reformas estruturais no Congresso”, destaca o Deutsche. 

“Meirelles poderá ser um fato positivo de curto prazo, mas não poderá fazer milagres. Ele depende da boa vontade de Brasília”, afirma José Faria Júnior, diretor técnico da Wagner Investimentos, corroborando a visão do Deutsche. Por outro lado, Júnior ressalta que o próprio Meirelles poderia adotar as medidas pró-consumo indicadas por Lula, conforme indicado pelo Valor. 

Assim, o fator central segue sendo o ajuste fiscal, conforme destaca a LCA Consultores: “avaliamos que sem o ajuste das contas públicas, a confiança não será restaurada e os prêmios de risco e a taxa cambial continuarão em elevados patamares, bem como as taxas de juros e portanto, o custo do crédito”.

Em entrevista a Bloomberg, o diretor da Mirae Asset Securities Brasil, Pablo Spyer, destacou que a boa memória do mercado sobre período em que Henrique Meirelles presidiu BC refere-se a um cenário diferente do existente hoje. “Não vejo muito o que o super conceituado Meirelles poderia fazer de diferente do Levy, que também é super competente”.

Assim, com Levy ou sem Levy, o cenário ainda deve ser de cautela. Os caminhos a serem trilhados pelo titular da Fazenda não são nada fáceis. Não há salvador da pátria. 

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.